Garimpo de ouro no Pará, artigo
de Bruno Peron.
O Pará volta a receber atenção devido à sua
tradição extrativista. Desta vez, evidencia-se a divisão entre os índios da
etnia Kayapó com respeito à dúvida sobre se o território em que eles vivem deve
ser explorado para mineração ou preservado para subsistência.
Estima-se que entre 4 e 5 mil garimpeiros revirem
a terra em busca de ouro numa região denominada Terra Indígena Kayapó, no
sudeste do Pará. A ação tem efeitos desastrosos sobre a natureza, mas uma parte
dos índios desta etnia apoia a exploração aurífera desde que um percentual dos
ganhos dos exploradores fique na aldeia. O acordo soa estranho se levarmos em
consideração que índios não precisavam vincular-se à economia moderna para
preservar seu modo de vida. Eles notaram, porém, que o dinheiro lhes traria
alguns benefícios a despeito dos danos ambientais.
Por causa desta divergência de opiniões entre os
índios, as instituições que zelam pela integridade das florestas, da fauna e
dos povos nativos ficam sem saber se devem endurecer a fiscalização ou aceitar
os acordos entre as partes. É assim que companhias de mineração como a Vale
mantêm seus negócios em regiões longínquas do país onde se supõe que deveria
haver preservação ambiental e étnica.
Apesar dos riscos humanos e naturais que as
atividades extrativas oferecem ao Pará, o garimpo expande-se no sudeste
paraense com poucos empecilhos além da necessidade de negociação. O maior
destes é a reprodução da prática de intermediação que encarece e inviabiliza o
Brasil. Isto significa que, em vez de geração de riqueza por trabalhadores
brasileiros, estes não fazem mais que extrair e repassar várias vezes um
produto até o consumidor final sem que haja desenvolvimento tecnológico.
Quando me referi à tradição extrativista do país,
inspirei-me na lembrança de Serra Pelada. Durante os anos 1980, e com seu ápice
em 1983, aproximadamente 100 mil garimpeiros foram tentar a sorte no sudeste
paraense atrás de dinheiro fácil. Eles extraíram 42 toneladas de ouro neste período
através de mineração a céu aberto, enquanto uma cidade pequena se fundava no
meio da selva pelos familiares destes garimpeiros, já que mulheres e crianças
estavam proibidas de entrar nas áreas mineradoras.
O Pará teve o ciclo da borracha, mais tarde teve
o do ouro, e hoje continua sendo caracterizado como uma terra extrativista onde
há riquezas a desbravar pelo homem moderno. Esta aposta gerou controvérsia
quando se propôs a divisão do Pará em três estados para que supostamente se
aproveitasse melhor seu potencial econômico e se o administrasse com maior
eficiência. É possível desconfiar de tais medidas porque haveria gastos
públicos maiores com burocracia e individualização dos lucros.
Quando o negócio é grande no Brasil, o rabo que
se prende é longo. Por isso as punições de instituições fiscalizadoras a miúdo
incidem sobre pessoas comuns – penso nos milhares de garimpeiros – que precisam
de renda para sustentar suas famílias. No entanto, o chefe que controla todo o
negócio estará bem protegido, possivelmente sob o guarda-chuva da burocracia
que emperra o progresso do Brasil.
Na mesma tacada, reitero que nosso país é povoado
por intermediários que agregam custo, mas não fazem o mesmo com valor através
de pesquisa e desenvolvimento. Deste modo, o ouro que muitos garimpeiros tiram
com suas unhas traz poucos benefícios a estes trabalhadores carentes e ao
Brasil, mas faz a vida de uma casta de pessoas que mantêm o país na periferia
produtiva e na brutalidade educativa.
Portanto, o corolário deste modo de produção
extrativista é desastroso para o Brasil. Alivia a vida de poucos, mas condena a
de muitos que beiram o sacrifício para sobreviver. Até os índios caem nessa
armadilha, ludibriados pelo Estado brasileiro.
Aponte as feridas do Brasil se quiser dignificá-lo.
Não deixe que elas se transformem num câncer.
* Colaboração de Bruno Peron
Loureiro, mestre em Estudos Latino-americanos pela Universidade
Nacional Autónoma do México (UNAM).
Fonte: EcoDebate
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