Fiocruz testa Aedes aegypti
infectado com a bactéria Wolbachia para reduzir a transmissão da dengue.
A Fiocruz deu início a uma importante etapa do
projeto Eliminar a Dengue: Desafio Brasil. Já realizada com sucesso na
Austrália, Vietnã e Indonésia, a fase de estudos de campo conta com a liberação
de mosquitos Aedes aegypti com a bactéria Wolbachia. O projeto conta com
o apoio do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Centro de Pesquisas René
Rachou (Fiocruz Minas) e do Programa de Computação Científica (Procc/Fiocruz).
O primeiro local a participar é o bairro de Tubiacanga, localizado na Ilha do
Governador, na cidade do Rio de Janeiro, e estudado pela equipe do projeto
desde 2012. Esta é a primeira vez em que um país nas Américas recebe o estudo.
A iniciativa
sem fins lucrativos integra o esforço internacional que estuda uma abordagem
inovadora para reduzir a transmissão do vírus da dengue pelo mosquito de forma
natural e autossustentável (foto: Peter Ilicciev).
O anúncio foi realizado nesta quarta-feira (24/9)
no campus da Fiocruz, em Manguinhos. Estiveram presentes o presidente da
Fundação, Paulo Gadelha; o pesquisador e líder do projeto no Brasil, Luciano
Moreira e o diretor do Departamento de Ciência e Tecnologia (Decit) do
Ministério da Saúde, Antonio Carlos Campos de Carvalho. Moradores de Tubiacanga
e parceiros científicos do projeto marcaram presença no encontro.
A iniciativa sem fins lucrativos integra o esforço
internacional do Programa Eliminate Dengue: Our Challenge (Eliminar a
Dengue: Nosso Desafio), que estuda uma abordagem inovadora para reduzir a
transmissão do vírus da dengue pelo mosquito Aedes aegypti de forma
natural e autossustentável. O projeto propõe o uso de uma bactéria naturalmente
encontrada no meio ambiente, chamada Wolbachia. Quando presente no Aedes, ela é
capaz de impedir a transmissão da dengue pelo mosquito.
Pesquisador da Fiocruz e líder do projeto no
Brasil, Luciano Moreira está otimista com os próximos passos do projeto.
“Estamos diante de uma estratégia científica inovadora e segura, que poderá
contribuir para o controle da dengue e para a melhoria da saúde da população”,
avalia. Ele foi responsável, com pesquisadores da Universidade de Monash, na
Austrália, pela descoberta científica da capacidade da Wolbachia de reduzir a transmissão
do vírus da dengue pelo mosquito.
“Após dois anos de estudos preparatórios, é
empolgante ver o projeto avançando para esta fase no Brasil, onde contamos com
a liderança científica da Fiocruz”, completou Scott O’Neill, coordenador
internacional do Programa.
Liberação dos mosquitos
Em Tubiacanga, cerca de dez mil mosquitos Aedes
aegypti com Wolbachia serão liberados semanalmente pelos pesquisadores. O
número de mosquitos é similar aos protocolos adotados com sucesso na Austrália,
onde este tipo de estudo já foi concluído em mais de quatro localidades. As
liberações acontecerão por aproximadamente três ou quatro meses, de acordo com
a avaliação dos cientistas sobre a capacidade dos mosquitos com Wolbachia de se
instalarem no local. Para reduzir o incômodo da população, antes do início da
liberação dos mosquitos com Wolbachia, os pesquisadores, em conjunto com a
Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, realizaram uma etapa chamada
de supressão dos criadouros. O objetivo foi reduzir a quantidade de Aedes
aegypti por meio da eliminação de criadouros confirmados do vetor – assim, ao
liberar no bairro os Aedes com Wolbachia, o número total de mosquitos não
sofrerá alteração. “Buscamos com esta medida diminuir o desconforto para os
moradores de Tubiacanga, que sempre apoiaram esta iniciativa científica”,
Luciano reforça.
Arte:
Ascom IOC
Inicialmente, os pesquisadores vão avaliar a
capacidade dos mosquitos com Wolbachia de se estabelecerem no meio ambiente e
se reproduzirem com os mosquitos que já existem no local. O projeto propõe uma
abordagem sustentável e de longo prazo, pois, após o estabelecimento de Aedes
aegypti com Wolbachia no ambiente, a bactéria é transmitida naturalmente
para as gerações seguintes de mosquitos. “Assim, o método se torna
autossustentável: os mosquitos com Wolbachia predominam sem que precisemos
soltar constantemente mais mosquitos com a bactéria”, explica Luciano. Estudos
de larga escala previstos para 2016 em outras localidades do Rio de Janeiro
poderão avaliar o efeito desta estratégia em reduzir a incidência de dengue.
Apoio da população
Como parte do projeto, desde 2012 a Fiocruz
trabalha nos bairros selecionados para o estudo, realizando um intenso trabalho
científico para mapear os mosquitos dos bairros estudados: em Tubiacanga, Urca
e Vila Valqueire, no Rio de Janeiro, e Jurujuba, em Niterói. Neste processo,
são realizados contatos regulares com moradores, lideranças e associações. “Os
dados coletados foram fundamentais para planejar os estudos de campo”, explica Luciano.
Durante o mapeamento, armadilhas para capturar e estudar os mosquitos da região
foram instaladas na casa de dezenas de moradores – são os chamados ‘anfitriões’
do projeto. “Somos extremamente gratos a essas pessoas que recebem toda semana
nossas equipes em suas casas, contribuindo para um projeto que busca o
benefício coletivo”, afirma Luciano.
“Ao nos aproximarmos do início dos estudos em
campo, as ações de relacionamento com os moradores de Tubiacanga foram
intensificadas para que fossem devidamente informados de todas as atividades”,
completa. As associações de moradores, além de outras instituições locais,
apoiam o projeto, que realiza visitas domiciliares regulares para apresentar a
iniciativa e dirimir dúvidas.
Encontros e palestras entre moradores e
pesquisadores também são promovidos. O atendimento à população é realizado por
telefone e email.
Método seguro e natural
Naturalmente presente em cerca de 60% dos insetos
no mundo (incluindo diversas espécies de mosquitos, como o pernilongo), não existem
evidências de qualquer risco da Wolbachia para a saúde humana ou para o
ambiente. Esses mosquitos comumente picam pessoas sem efeitos negativos.
Como é
uma bactéria intracelular, que não infecta seres humanos e animais domésticos,
a Wolbachia apenas pode ser transmitida de mãe para filho, no processo de
reprodução dos mosquitos, e não durante a picada do Aedes em um ser humano, por
exemplo. Além disso, durante cinco anos, membros da equipe do programa Eliminar
a Dengue, na Austrália, alimentaram uma colônia de mosquitos com Wolbachia
usando, voluntariamente, seus próprios braços. Isso resultou em centenas de
milhares de picadas de mosquitos sem que reações à bactéria fossem detectadas.
Aprovações oficiais
Os testes de campo no Brasil foram aprovados pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pelo Instituto Brasileiro de
Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), pelo Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e pela Comissão Nacional de Ética
em Pesquisa (Conep) após rigorosa avaliação sobre a segurança para a saúde e
para o meio ambiente.
Financiadores e
parceiros
O projeto Eliminar a Dengue: Desafio Brasil
integra o esforço internacional sem fins lucrativos do Programa Eliminate
Dengue: Our Challenge (Eliminar a Dengue: Nosso Desafio). No Brasil, o
projeto tem financiamento da Fiocruz, Ministério da Saúde (Secretaria de
Vigilância em Saúde (SVS) e Departamento de Ciência e Tecnologia da Secretaria
de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (DECIT/SCTIE)), Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação e CNPq. A Secretaria Municipal de Saúde de
Niterói e a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro atuam como
parceiros locais na implantação do projeto.
O financiamento internacional é oriundo de verba da
Universidade de Monash, obtida pela Foundation for the National Institutes of
Health (FNIH, dos Estados Unidos) por meio do programa Controle de Doenças
Transmitidas por Vetores: Pesquisa para Descoberta (Vector-Based Transmission
of Control: Discovery Research (VCTR)) da Iniciativa Grandes Desafios em Saúde
Global (Grand Challenges in Global Health Initiatives) da Fundação Bill &
Melinda Gates. O projeto conta, ainda, com recursos diretos da Fundação Bill
& Melinda Gates, e com contrapartida da Fiocruz em estrutura, recursos
humanos e equipamentos.
“A Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério
da Saúde vem apoiando o projeto Eliminar a Dengue: Desafio Brasil para
que possamos ter novas tecnologias e estratégias capazes de aperfeiçoar a
prevenção e o controle da dengue. A primeira liberação dos mosquitos com
Wolbachia é mais um passo importante que o projeto dá e acompanharemos de perto
todos os resultados”, destaca o secretário de Vigilância em Saúde do Ministério
da Saúde, Jarbas Barbosa. “A participação do Brasil mostra que a inovação
nacional pode trazer benefícios concretos para o controle da dengue no Brasil e
no mundo. Parcerias como esta, que aproximam as pesquisas das prioridades do
SUS, contam com apoio do Ministério da Saúde”, afirma Carlos Gadelha,
secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério.
Para o presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha, a
proposta coloca o país na fronteira do conhecimento sobre a doença. “A pesquisa
é relevante por associar a inovação tecnológica a um problema central na saúde
brasileira e à capacidade de envolver a população na execução do projeto,
agregando três dimensões que são muito importantes no trabalho da Fiocruz”,
opina.
O projeto no mundo
Desde 2011, o Programa Eliminate Dengue: Our Challenge
testa o método em diferentes países, atuando em diferentes fases em cada um
deles. Na Austrália, mosquitos que receberam a Wolbachia em laboratório têm
sido liberados de forma sistemática, em algumas localidades no nordeste do
país.
Nestes locais, a presença de mosquitos com a Wolbachia se tornou
predominante após dez semanas de liberação de mosquitos. Nos anos seguintes,
novas localidades australianas iniciaram testes em campo. Além da Austrália,
Vietnã e Indonésia também realizam estudos deste tipo. O programa Eliminar a
Dengue: Nosso Desafio é uma iniciativa sem fins lucrativos com o objetivo
de oferecer uma alternativa sustentável e de baixo custo às autoridades de
saúde das áreas afetadas pela dengue, sem qualquer ônus financeiro para a
população.
Clique aqui
para acessar o site oficial do projeto.
Fonte: Agencia
Fiocruz de Notícias
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