Pesquisa da FE mostra como escola indígena intervém na sua comunidade.
Para os índios Kotiria a escola é um bem comunitário.
Os índios Kotiria, também conhecidos como Wanano,
compreendem a escola como um bem comunitário. Lá, as decisões sobre os
principais temas, como merenda, comportamento de professores, estudantes e
temática das aulas, entre outros, são tratados pelas mães, pais, avós,
estudantes, ex-alunos e docentes.
Entre 2011 e 2012, a pesquisadora Aline Abbonizio
pôde observar a relação deste povo com a escola local. Os relatos e análises
das visitas e permanências na comunidade resultaram na tese de doutorado Educação
escolar indígena como inovação educacional: a escola e as aspirações de futuro
das comunidades, defendida na Faculdade de Educação (FE) da USP.
Os Kotiria habitam a Terra Indígena Alto Rio Negro,
na cidade de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Foi lá que, em 2011, Aline
passou três meses na maior comunidade Kotiria, do lado brasileiro, em Caruru
Cachoeira, onde vivem 33 famílias, cerca de 160 pessoas. “Mais precisamente, as
comunidades Kotiria estão no alto rio Uaupés, na fronteira do Brasil com a
Colômbia”, conta a pesquisadora. “A maioria deles vive na Colômbia, no
Departamento de Vaupés”. A escola do povo Kotiria é pública, municipal e
indígena. À época das visitas de Aline, contava com cerca de 110 estudantes no
ensino fundamental e 17 no ensino médio. Em São Gabriel quase 90% da população
é indígena. Aline conta que a construção da primeira escola de Caruru Cachoeira
ocorreu na década de 1960 e, como toda escolarização disponível naquela região,
era gerida por religiosos católicos da ordem dos salesianos.
Contrapartida
A permanência de Aline na comunidade, onde fez a
coleta de informações para a pesquisa, teve como contrapartida a solicitação
para que apoiasse as ações da escola, de docentes e estudantes, que foram
chamadas de assessoria pedagógica. “A convivência e o trabalho junto àquela
população me permitiu perceber a escola como centro de reflexão e intervenção
sobre as condições de vida comunitária”, descreve. “Pensar sobre o que deve ser
feito para melhorar a escola está estreitamente relacionado com o que deve ser
feito para melhorar a comunidade. Neste caso, os Kotiria têm uma escola que
intervém diretamente sobre suas condições de vida”.
Outro aspecto importante é a alimentação escolar. A
escola mantém uma roça de mandioca e, com sua produção, prepara alimentos como
farinha, beiju e caxiri, uma bebida fermentada. Para tanto, conta com o apoio e
os ensinamentos das mães, pais e avós. Além disso, os Kotiria estão muito
interessados em conhecer outras e novas técnicas de cultivo, tanto para
resolver o problema da escassez sazonal de alimentos como para obterem algum
excedente de sua produção e gerar renda.
Inquietação
Graduada em História, Aline trabalhou por um bom período com educação popular, de jovens e adultos pouco escolarizados. No mestrado em Educação, pesquisou um programa municipal voltado à educação popular, o Movimento de alfabetização de jovens e adultos de São Paulo (MOVA-SP).
“Nesta trajetória, inquietava-me a
costumeira desconexão entre escolarização e intervenção direta sobre condições
de vida, sobre a melhoria da situação das pessoas envolvidas no processo de
escolarização.”
Em 2007, passou a trabalhar com o professor Elie
Ghanem, da FE, seu orientador no doutorado. “Ele vinha pesquisando iniciativas
que atrelavam educação não-escolar a desenvolvimento local. Me identifiquei com
a temática e fui percebendo que no âmbito propriamente escolar, das escolas
públicas, eram raras as iniciativas que atrelavam ao fazer educacional a
intervenção direta sobre a economia local”, conta. Foi quando Aline, já no
doutorado, soube de algumas escolas de São Gabriel da Cachoeira apontando,
justamente, para a proximidade entre objetivos escolares, ou seja, a definição
de temas de estudo, de rotinas e de práticas, com as necessidades e demandas
comunitárias.
Imagens: Divulgação.
Fonte: Agência
USP de Notícias
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