Licenciamento ambiental: as
exigências como garantia de futuro, por Cristiano Lange dos Santos e Marcelo
Sgarbossa.
Para o mercado liderado por grandes grupos
econômicos transnacionais e também parte da mídia conservadora, o processo de
licenciamento ambiental é um mecanismo desnecessário que atrasa o crescimento
econômico do País. Há uma forte pressão política e econômica para a
flexibilização das licenças, com a clara finalidade de implementar
empreendimentos industriais sem as devidas cautelas e exigências de preservação
dos bens naturais.
As principais reclamações apontadas sobre o
processo de licenciamento são a “demora injustificada” e a “burocracia
excessiva”, ambas fundamentadas na problemática de restrição da competitividade
das empresas. Vale ressaltar que há clareza quanto ao nível de exigências
da legislação brasileira sobre o assunto, mas é preciso garantir os primados
essenciais em termos de Direito Ambiental. Cabe registrar, no entanto, que a
exigência do licenciamento surgiu nos Estados Unidos, ainda na década de 1970.
Hoje, na União Europeia, é muito mais restritiva, se comparada à legislação
brasileira.
O que acontece é que o licenciamento precisa
respeitar o devido processo legal. Essa é a função dentro um processo
administrativo para verificar quais os impactos a serem causados ao meio
ambiente, bem como mensurá-los, permitindo ou não a proposta de instalação e
operação de determinado empreendimento.
Por outro lado, os grandes grupos exercem uma
forte pressão para aceitarmos qualquer empreendimento, independentemente dos
custos sociais e ambientais produzidos por ele. Essa é a regra geral. Ou seja,
parece que temos que recebê-los a qualquer preço, sob pena de ficarmos
estagnados economicamente. Há um forte apelo econômico, com a suposta garantia
de emprego e renda. Tudo é visto como ganho. Quando, na verdade, não é bem
assim.
Na realidade, a apropriação do lucro é privada,
individualizada e imediata, enquanto que os impactos sociais e ambientais são
distribuídos à coletividade, no longo prazo. Empresas internacionais esgotam os
bens naturais e exploram a natureza, e não podemos nem ao menos exigir as
devidas compensações necessárias? Qual o receio de reprovar empreendimentos que
causem danos irreversíveis ao patrimônio ecológico?
Pode ser um caldo do nosso complexo de
vira-latas, como bem destacava o escritor Nelson Rodrigues, na medida em que
não recusamos absolutamente nenhum investimento, seja ele qual for.
Investimentos são bem-vindos, mas não a qualquer
custo social e ambiental. Nesse sentido, é importante destacar que
desenvolvimento é diferente de crescimento econômico. Não são sinônimos!
Precisamos romper com essa cultura
desenvolvimentista que apenas prejudica os nossos bens naturais sem as menores
contrapartidas. Assim, o significado da palavra ‘desenvolvimento’ foi
modificado, do sentido estrito e puramente econômico, para uma concepção
ampliada. Dessa forma, o ‘crescimento’ é uma categoria contábil composta de
purismos científicos. Vale lembrar que se pode perfeitamente ter crescimento
econômico produzindo prisões e tanques de guerra, ou construindo escolas e
investigando curas para o câncer.
Recorrentemente, a imprensa noticia que não
atingimos os índices de crescimento econômico de países como a China, por
exemplo. Mas será que é isso mesmo o que queremos? Devemos exigir um tipo de
desenvolvimento que atenda às necessidades humanas, e não somente o acúmulo de
capital, estagnando a melhoria da qualidade de vida.
E não estamos pregando o ecologismo radical, ou
até mesmo a estagnação econômica (proposta considerada elitista por alguns).
Queremos apenas que se garanta o devido respeito
às nossas riquezas naturais. Esse debate precisa ser feito, e de forma urgente.
Antes que seja tarde demais.
* Cristiano Lange dos Santos é advogado. Especialista
e Mestre em Direito, foi Professor de Direito Constitucional. Atua como
Procurador Jurídico do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS.
** Marcelo Sgarbossa é advogado. Mestre em
Análise de Políticas Públicas pela Universidade de Turim (Itália) e Doutorando
em Direito pela UFRGS. Vereador em Porto Alegre (PT).
Fonte: EcoDebate
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