‘Para evitar conflitos, é preciso
enfrentar mudanças climáticas em tempo hábil’, entrevista com Christiana
Figueres.
Em entrevista à DW, Christiana
Figueres, chefe da Convenção do Clima da ONU, fala das expectativas para cúpula
em Nova York e da importância de um acordo climático global. “Estamos correndo
contra o tempo”, diz.
A convite do secretário-geral da ONU, Ban
Ki-moon, cerca de 120 chefes de Estado e de governo participam da Cúpula do
Clima das Nações Unidas nesta terça-feira (23/09), em Nova York. O encontro
acontece sob o impacto das manifestações
pela proteção climática que mobilizaram centenas de milhares de pessoas em
diversos países no último fim de semana.
Em entrevista à Deutsche Welle, Christiana
Figueres, chefe da Convenção do Clima da ONU, fala sobre a importância da
reunião em Nova York. Ela afirma que é necessária ação política em todos os
níveis – internacional, nacional e local. As mudanças climáticas já estão
relacionadas a vários conflitos no mundo e se tornaram “o maior desafio da
humanidade”, diz.
Deutsche Welle: Qual a
finalidade de uma cúpula do clima extraordinária e como ela se encaixa nas
conferências climáticas anuais?
Christiana Figueres: As
conferências anuais se destinam a um acordo climático vinculativo, que deverá
ser fechado no próximo ano, em Paris. Na cúpula em Nova York, não haverá
negociações. Trata-se de uma tentativa de impulsionar o processo formal, de
fortalecer a vontade política e a consciência pública. É uma boa oportunidade
para chefes de Estado e líderes empresariais apresentarem seus planos.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu
aos participantes que preparassem para o encontro anúncios corajosos e
compromissos de ação. O que você espera disso?
Muitos governos vão relatar sobre projetos já
iniciados, sobre suas pretensões para reduzir as emissões de gases tóxicos,
sobre como querem preparar sua infraestrutura para os efeitos das mudanças
climáticas.
Do setor privado, esperamos o mesmo: queremos
saber qual será a sua contribuição para reduzir as emissões. Estamos
particularmente interessados em como esse setor pretende transferir o seu
capital em prol de produtos e serviços de baixa emissão de CO2, para que
possamos acelerar a mudança global com vista a uma economia de baixas emissões
de gases tóxicos.
Esperam-se anúncios significativos do país
anfitrião EUA ou da China, país-chave para o clima?
Sim. Acreditamos que todos os países vão mostrar
as suas propostas formais para as negociações no próximo ano. No entanto, eles
ainda têm até março de 2015 para isso. Eles deverão dar apenas uma ideia de
quais serão suas contribuições. Eles já estão calculando em âmbito nacional o
que é possível fazer em termos financeiros, políticos, econômicos e técnicos.
O fato de a cúpula acontecer nos EUA pode ter
alguma influência sobre a posição dos americanos e sobre a política climática?
No segundo mandato de [Barack] Obama, viu-se um
maior engajamento com relação à questão do clima. O pedido do presidente à
agência ambiental americana EPA por uma maior regulação das usinas elétricas é
provavelmente o projeto mais ambicioso que o governo americano já empreendeu em
relação ao clima.
Esperamos que Obama anuncie como pretende seguir
adiante com esses esforços. É muito interessante que uma grande marcha pelo
clima tenha acontecido em solo americano apenas dois dias antes da cúpula. Isso
mostra que, mesmo nos EUA, há um grande apoio da opinião pública à política
climática global.
Esse tipo de movimento é o que precisamos
para avançar com a proteção climática?
Ele é um fator muito importante. Sou muito grata
aos organizadores da manifestação. É extremamente importante transmitir um
forte sinal de que a responsabilidade não é somente de governos e empresas, mas
também da sociedade civil. Ela precisa manifestar a sua consciência ambiental e
suas preocupações, incentivando países e firmas a mudar o mais rápido possível
para uma economia de baixas emissões.
Diante da dificuldade nas negociações,
cidades e regiões devem exercer um papel mais importante nessa mudança?
Cidades em todo o mundo já avançaram de forma
impressionante. Isso também se aplica a grupos regionais. A proteção climática
é mais eficiente quando os políticos em todos os níveis –, internacional,
nacional e local – trabalham em conjunto.
Em tempos de conflitos, como agora no Oriente
Médio e na Ucrânia, não é difícil despertar o interesse público para uma cúpula
climática extraordinária?
Pelo contrário. Acredito que esta semana em Nova
York vá atrair a atenção da mídia. Não só porque milhares de pessoas foram às
ruas. Não só porque teremos centenas de chefes de Estado e governo e empresários
influentes. Mas porque eles estarão ali por uma razão de extrema importância.
As mudanças climáticas se tornaram o maior
desafio da humanidade, ao menos neste século. E a consciência sobre isso está
aumentando. Já existem muitos conflitos no mundo que têm a ver com a escassez
de água, com a migração, com a segurança alimentar. As mudanças climáticas
acirram ainda mais tudo isso. Em outras palavras: se quisermos evitar conflitos
incontroláveis, precisamos enfrentar as mudanças climáticas em tempo hábil.
Os números mais recentes mostram que as
emissões de CO2 continuam a aumentar. Cientistas veem a meta de dois graus
Celsius já quase fora de alcance. O que precisa acontecer para que sejamos
poupados de uma mudança climática catastrófica?
A ciência tem mostrado claramente que só há um
caminho para limitar o aumento da temperatura a dois graus Celsius. Esta
cúpula, bem como as negociações formais no Peru, no final deste ano, e em
Paris, no ano que vem, emitem uma mensagem clara aos governos mundiais e às
principais empresas do setor econômico de que estamos correndo contra o tempo.
Ainda podemos conseguir. Mas, para evitar os piores impactos das mudanças
climáticas, precisamos chegar a um acordo climático global até o final de 2015.
Fonte: Deutsche Welle
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