sábado, 14 de março de 2015

Governo brasileiro precisa atacar mudanças climáticas de frente.
por Observatório do Clima*
A propósito do pronunciamento da presidente Dilma Rousseff no último domingo, 8 de março, o Observatório do Clima divulga nota pública na qual afirma que o governo reconheceu que a “grave crise climática” que o Brasil atravessa é uma componente do quadro de deterioração econômica e ebulição social que emerge no país. Porém, a presidente chama a seca de “coincidência” e de “situação passageira”.

Intitulada Seca não é “coincidência”, presidente, a nota à imprensa do Observatório, rede de organizações da sociedade civil que atua em mudanças climáticas e busca estimular políticas públicas efetivas no Brasil, diz que o governo brasileiro precisa parar de fingir que o clima do país não mudou enquanto fica torcendo pela chuva e pedindo “paciência e compreensão” dos brasileiros que estão pagando mais pela energia e pela comida. Leia abaixo a nota na íntegra.

OBSERVATÓRIO DO CLIMA
NOTA À IMPRENSA
São Paulo – Curitiba – Brasília – Manaus 09/03/2015

Em seu pronunciamento à nação na noite do dia 8 de março, por ocasião do Dia da Mulher, a presidente Dilma Rousseff deu um passo importante: reconheceu que a “grave crise climática” que o Brasil atravessa é uma componente do quadro de deterioração econômica e ebulição social que emerge no país. Dilma, porém, chama a seca de “coincidência” e de “situação passageira”. Ao fazê-lo, não apenas ignora dados produzidos por seu próprio governo, como também perde mais uma oportunidade de atacar um problema de frente, deixando fermentar crises futuras.

O país vem desde 2011 enfrentando períodos de secas anormais, que atingiram o Nordeste e também o Centro-Sul, onde se concentra a população brasileira, onde é gerada a maior parte da nossa energia hidrelétrica e onde é produzida a maior parte dos alimentos que chegam à nossa mesa.

Diferentemente do que sugeriu a presidente, porém, a seca e seu impacto sobre a população não são obra do acaso: verões mais secos e quentes no Centro-Sul e no Nordeste do país são esperados num cenário de mudanças climáticas causadas por emissões de gases de efeito estufa. Modelos regionais de clima produzidos pelo Inpe, um órgão do governo federal, sob encomenda da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, indicam que a tendência do clima para a região neste século é de mais calor e menos chuva. O desmatamento acumulado na Amazônia pode estar contribuindo para agravar esse quadro. Relatório após relatório, o IPCC, o painel do clima da ONU, vem apontando que a frequência de eventos climáticos extremos está aumentando.

O novo clima do país veio para ficar, e novos recordes de estiagem ou de enchente são imprevisíveis – mas sabemos que eles virão. São dados que estão, para usar uma frase da própria Dilma, “ao alcance de todos e de todas”.

Em vez de prestar atenção aos alertas dos cientistas, a primeira administração de Dilma Rousseff dobrou a aposta na causa do problema climático: o governo subsidiou os combustíveis fósseis e deu incentivos à compra de carros. Quando as hidrelétricas começaram a secar, expandiu a geração por termelétricas fósseis. O então ministro de Minas e Energia, numa atitude irresponsável, exortou a população a consumir mais, quando deveria ter adotado um amplo programa de eficiência energética e redução de consumo – que talvez nos poupasse de estar agora à beira do racionamento. 

Essas atitudes, aliadas à confusão regulatória da renovação das concessões de energia, transformaram um evento climático extremo numa crise nacional. O novo Código Florestal, que reduz a proteção de matas ciliares, expõe os habitantes dos biomas Mata Atlântica e Cerrado a mais efeitos da seca no futuro.

O governo brasileiro precisa parar de fingir que o clima do país não mudou enquanto fica torcendo pela chuva e pedindo “paciência e compreensão” dos brasileiros que estão pagando mais pela energia e pela comida. Se quiser construir uma saída duradoura para a crise atual, a presidente Dilma Rousseff precisa levar as mudanças climáticas e as energias renováveis a sério. Quem sabe aqui esteja o verdadeiro “pacto nacional” capaz de dar um novo rumo a seu segundo mandato.


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