O bambu, uma polêmica resposta ao
desmatamento na África.
por
Jeffrey Moyo, da IPS
Viveiro de bambu na África. Foto: EcoPlanet Bamboo.
Harare, Zimbábue, 9/3/2015 – O bambu apresenta-se
como uma possível solução comercial para o desmatamento na África, embora
destacados ativistas questionem seus benefícios ecológicos, na medida em que o
crescimento industrial do continente arrasa os terrenos públicos e põe cada vez
mais hectares em mãos privadas.
Segundo a rede de notícias ambientais Environmental
News Network, a cada ano a África perde, aproximadamente, 41 mil quilômetros
quadrados de cobertura florestal, equivalente ao tamanho da Suíça. O Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) também informa que o continente
perde mais de quatro milhões de hectares de florestas naturais ao ano, duas
vezes a taxa média mundial, e que o desmatamento representa pelo menos 20% de
todas as emissões de carbono no planeta.
Diante do perigoso avanço do desmatamento, o setor
privado propõe uma solução baseada no bambu, planta gramínea lenhosa de rápido
crescimento, autóctone principalmente nas regiões tropicais.
A EcoPlanet Bamboo, uma empresa transnacional
presente em Gana, África do Sul e Nicarágua, promove a industrialização do
bambu como fibra alternativa e ecologicamente atraente para a indústria
madeireira que depende das florestas naturais para sua matéria-prima. Para a
companhia e alguns ambientalistas africanos, o bambu cultivado comercialmente
ajudaria a reverter as consequências do desmatamento e da degradação da terra
no continente.
“Se for cultivado adequadamente em terras com
escasso valor para outros usos, e se for manejado com um sistema adequado de
gestão sustentável, o bambu pode ter um papel na restauração de ecossistemas
extremamente degradados e na conexão dos bosques remanescentes, já que reduz a
pressão sobre as florestas naturais restantes”, afirmou à IPS Troy Wiseman,
diretor-geral da EcoPlanet Bambu.
Happison Chikova, ecologista independente do
Zimbábue, formado em geografia e estudos ambientais na Universidade Estatal de
Midlands deste país, concorda com Wiseman. “O bambu ajuda a combater a mudança
climática devido à sua capacidade de absorção do dióxido de carbono e atua como
sumidouro de carbono, e também pode ser usado como fonte de energia, o que
reduz o corte de árvores autóctones”, explicou. “Também pode ser usado para a
construção de casas, reduzindo o desmatamento nas áreas de uso público, onde há
uma grande demanda de árvores autóctones para fins de construção”, acrescentou.
Mas outros defensores do direito à terra têm
dúvidas a respeito. “A ideia das plantações de bambu é boa, mas geram o temor
de que ocorra uma fome generalizada, já que os africanos pobres podem se sentir
atraídos por esse empreendimento pela promessa de dinheiro e abandonem os
cultivos de alimentos”, alertou Terry Mutsvanga, reconhecido ativista de
direitos humanos do Zimbábue.
O temor de que as pequenas propriedades
sustentáveis percam terreno diante das plantações de propriedade estrangeira
voltadas à exportação é compartilhado por Nnimmo Bassey, diretor da Fundação
Saúde da Mãe Terra, com sede na Nigéria. “Ninguém pode apresentar seriamente as
plantações de bambu como a cura para o desmatamento”, afirmou Bassey, ganhador
em 2010 do prêmio Right Livelihood, considerado o prêmio Nobel alternativo.
“Lamentavelmente, o sistema das Nações Unidas
considera que as plantações são florestas e esta premissa, fundamentalmente
errônea, oferece aos proprietários das plantações a liberdade para considerar
suas ações devoradoras de florestas como algo positivo”, apontou Bassey. “Se
estamos de acordo que as florestas são lugares com rica biodiversidade, fica
claro que uma plantação não pode ser o mesmo que uma floresta”, acrescentou à
IPS.
Atualmente, pequenos agricultores cultivam o bambu
na África com diversos propósitos. A Associação do Bambu de Mulheres do Monte
Selinda, uma organização ativista do Zimbábue, recebeu financiamento do Fundo
Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), por meio do seu programa
Meios de Subsistência e Desenvolvimento Econômico, para criar empresas rurais
sustentáveis mediante o uso dos recursos dessa planta. Para o Fida, o bambu é
“a madeira do pobre”.
Atualmente, a pegada ecológica da EcoPlanet Bamboo
na África inclui dois mil hectares em Gana, em uma associação público-privada
para o desenvolvimento comercial das plantações. Na sul-africana província
Oriental do Cabo, a certificação está em marcha para converter plantações de
abacaxi fora de produção em plantações de bambu para produção de carvão ativado
e carvão biológico e sua venda nos mercados locais e externos.
Mas Bassey questiona se esses hectares estavam
realmente sem utilização, como afirma a empresa. “Pode ser que o bambu
comercial, que substituirá as florestas de madeira natural e exigirá centenas
de hectares de terras, não seja tão bom para os camponeses da África”, afirmou.
Porém, a EcoPlanet Bamboo insiste que não converte
nem planta em terrenos que possam competir com a segurança alimentar.
“Convertemos terras degradadas em plantações de bambu certificado e em
ecossistemas diversos, prósperos, que pode proporcionar fibra anualmente, e, no
entanto, manter sua integridade ecológica”, disse Wiseman.
No entanto, essas palavras não convencem Bassey,
que questionou o fato de a propriedade estrangeira dos recursos da África ser
benéfica para a África. “As plantações não são propriedade dos fracos na
sociedade, mas das empresas ou pessoas físicas ricas com fortes contatos
econômicos e, às vezes, políticos. Isso poderia significar o deslocamento de
agricultores vulneráveis e a perda de territórios e meios de subsistência”,
ressaltou.
Fonte: ENVOLVERDE
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