A luta pelo meio ambiente é
política, não ideológica.
por Mario
Mantovani*
Foto: Shutterstock
Nos últimos anos, temos assistido a grandes
retrocessos na política socioambiental brasileira. Aprovado há mais de dois
anos com diversas concessões à bancada ruralista no Congresso Nacional, o novo
Código Florestal (Lei 12.651/12) é o exemplo mais claro desse movimento que
busca o enfraquecimento da legislação ambiental em prol de interesses de grupos
pontuais.
Os que apoiam os retrocessos argumentam que o
movimento ambientalista explora um debate ideológico dessas questões, e que
esse debate seria distante, por exemplo, da realidade dos produtores agrícolas
brasileiros e da necessidade mundial de produção de alimentos. Um argumento,
porém, ilusório, pois a ciência já comprovou que a conservação das áreas de
vegetação nativa é fundamental para a proteção da biodiversidade e para a
disponibilidade de serviços ambientais essenciais a todos, incluindo a produção
de alimentos. Apesar disso, o que se vê são decisões políticas que ignoram os
pareceres técnicos e o conhecimento de pesquisadores e especialistas.
Enquanto o Código Florestal tramitava no Congresso
Nacional, campanhas organizadas inicialmente pelo movimento ambientalista
levaram ao debate público a discussão sobre a Lei, antes árida e técnica. A
ideia era envolver a sociedade na discussão sobre os riscos que as alterações
propostas traziam à população e ao meio ambiente. O resultado: um debate rico,
com participação da academia, ONGs, políticos, personalidades de diversas áreas
e uma sociedade mobilizada que promoveu campanhas nas redes sociais e nas ruas
contra as mudanças da legislação, tudo com grande cobertura e repercussão na
imprensa. A mobilização não impediu o retrocesso de pontos importantes da Lei,
mas contribuiu para a garantia de algumas ferramentas, como o Cadastro
Ambiental Rural (CAR), e reforçou a importância do envolvimento da sociedade em
questões discutidas no Congresso, acompanhando de perto a atuação dos nossos
governantes e parlamentares em relação aos temas ambientais.
Nesse sentido, destaca-se a atuação da Frente
Parlamentar Ambientalista, que reúne deputados e senadores interessados em
discutir as pautas relativas ao meio ambiente, bem como acompanhar os processos
legislativos e outras atividades do Congresso Nacional que apresentam relação,
direta ou indireta, com a questão.
A Frente Parlamentar Ambientalista foi criada pela
primeira vez em 1987, com o objetivo de incluir a pauta ambiental nas
discussões que levaram à Constituição de 1988. Entre suas conquistas estão o
capítulo sobre o Meio Ambiente na Constituição e a inclusão de alguns biomas –
entre eles a Mata Atlântica – como Patrimônios Nacionais. Além disso, a
participação mais efetiva da sociedade civil organizada na Frente, a partir de
2007, já produziu resultados práticos, como a aprovação da Política Nacional de
Resíduos Sólidos, que passou quase vinte anos sendo discutida sem consenso.
Dentro da Frente está também o Observatório
Parlamentar Socioambiental, que monitora os projetos de lei em tramitação no
Congresso referentes à área. Seu objetivo é acompanhar a atividade legislativa
e ajudar a promover o desenvolvimento sustentável, oferecendo ao cidadão
brasileiro um roteiro sobre o funcionamento do Congresso e o trâmite das leis
de forma resumida e de fácil compreensão, além de alguns estudos apresentados
nos principais debates ambientais. Em suma, a ideia é aproximar o cidadão comum
da esfera em que as leis ambientais são discutidas e as decisões sobre elas são
tomadas.
Apesar desses esforços, o enfraquecimento da agenda
ambiental no país continua, o que fica visível na falta de incentivo do Estado
em efetivar o desenvolvimento sustentável, seja em investimentos em
conservação, fiscalização ou aplicação de políticas públicas já definidas. Os
Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica, previstos na
Lei da Mata Atlântica sancionada pelo governo federal em 2006, são exemplos de
políticas que merecem maior atenção e investimentos para sua criação.
Outro sintoma é a desaceleração nos processos de
criação de Unidades de Conservação (UCs), instrumentos mundialmente
reconhecidos para a conservação e uso sustentável de recursos naturais.
E o que
falar da crise hídrica, que em 2014, durante o processo eleitoral, ficou
praticamente de fora dos debates?
Neste início de 2015, a Frente Parlamentar
Ambientalista já selecionou as pautas que serão prioritárias nesta nova
legislatura, a exemplo da crise hídrica. Este foi inclusive o tema do primeiro
café da manhã do ano organizado pela Frente na Câmara dos Deputados e que
reuniu parlamentares, especialistas, secretários estaduais de Meio Ambiente e
representantes de organizações da sociedade civil para um debate. Na ocasião,
foi anunciada também a criação do “Comitê Gestor da Crise da Água no Brasil”,
que levará ao Plenário mais discussões sobre soluções e enfrentamento da crise.
Outro tema prioritário ao grupo será a Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) 504/10, que pretende elevar o Cerrado e a Caatinga
à condição de patrimônio nacional. Esses dois biomas representam juntos um
terço do território brasileiro, sendo que a Caatinga é o único exclusivamente
brasileiro. O texto encontra resistências na bancada ruralista no Congresso.
Ainda em relação ao Cerrado, o grupo quer
prioridade para o PL 7338/14, que trata da conservação e da utilização
sustentável da vegetação nativa deste bioma. Esse projeto ainda precisa ser
analisado pelas comissões temáticas antes de ser votado no Plenário.
Outro ponto de atenção da Frente Ambientalista é a
PEC 215/00, que transfere do Poder Executivo para o Congresso Nacional a
prerrogativa de criar e modificar limites de terras indígenas, de quilombolas e
áreas de proteção ambiental.
Para completar, a Frente Parlamentar Ambientalista
acompanhará com atenção a aplicação das regras do CAR. De acordo com dados do
Ministério do Meio Ambiente (MMA), até o momento foram registrados pouco mais
de 132,2 milhões de hectares, um terço (35,5%) do total estimado para cadastramento,
que é 371,8 milhões de hectares. O limite para o preenchimento do CAR vai até o
próximo 5 de maio e esse monitoramento é essencial para cobrar do MMA que não
haja alterações nesse prazo.
Já é de entendimento de todos o quanto é
imprescindível proteger a vegetação e, sobretudo, cobrar dos nossos governantes
políticas mais efetivas para a conservação e recuperação das nossas florestas e
ambientais naturais. Cabe agora ampliar a participação da sociedade nessa causa
e no debate sobre as principais questões ambientais do nosso país. A luta
continua!
* Mario Mantovani é diretor de Políticas
Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica.
Fonte: SOS Mata Atlântica
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