São Paulo no século 21.
São Paulo concentrou capacidades de comando sem perder
completamente a produção industrial. Foto: Leo Ramos.
Por José Tadeu Arantes, da Agência Fapesp –
A região metropolitana de São Paulo tinha 4,8
milhões de habitantes em 1960. Cinquenta anos depois, eram 19,7 milhões. No
período transcorrido entre as duas datas, a metrópole incorporou um acréscimo
populacional equivalente a 1,3 vez a população da região metropolitana de
Paris, 1,5 vez a do Rio de Janeiro e duas vezes a de Londres. No mesmo
intervalo, as atividades produtivas agregadas alcançaram escala comparável à da
economia do Chile.
Um grupo de pesquisadores do Centro de Estudos da
Metrópole (CEM) – um dos 17 Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs)
apoiados pela FAPESP – se propôs a decifrar, na medida do possível, essa
esfinge urbana. O resultado é o livro A metrópole de São Paulo no século XXI:
espaços, heterogeneidades e desigualdades, que está sendo lançado agora.
A obra reúne 13 capítulos, agrupados em três
seções: I) dinâmicas econômicas, estrutura social e mercado de trabalho; II)
dinâmicas demográficas e segregação residencial; III) a produção dos espaços da
metrópole.
“Trata-se de um livro coletivo e não de uma
coletânea de artigos. Durante o processo de elaboração, o material levantado e
as análises em curso foram discutidos em seminários abertos do CEM.
Investigamos as transformações ocorridas em São Paulo desde a redemocratização
do país, em um período que compreende as décadas de 1990 e 2000. Os dados mais
recentes são os do censo de 2010, liberados em 2012”, disse o coordenador do
trabalho, Eduardo Cesar Leão Marques, professor livre-docente do Departamento
de Ciência Política da Universidade de São Paulo e vice-diretor do CEM à
Agência FAPESP.
“A metrópole continua sendo fortemente desigual,
mas suas desigualdades se reconfiguraram. O acesso aos serviços públicos
aumentou, embora os serviços oferecidos apresentem diferenças de qualidade
conforme o segmento social atendido. E principalmente as periferias, que antes
agrupavam quase exclusivamente populações pobres, constituíram-se em espaços
mais heterogêneos em termos sociais”, disse.
O livro destaca que São Paulo tem-se tornado uma
cidade mais heterogênea, em termos produtivos, sociais e espaciais. E também
uma cidade menos desigual, em termos de renda, inserção no mercado de trabalho
e condições de vida. Mas que os padrões de desigualdades continuam fortes e
presentes.
“Certas áreas precárias pouco melhoraram e os
padrões de mobilidade urbana tendem a ser estáveis e marcados por fortes
desigualdades sociais. Sob o ponto de vista de seus espaços, a metrópole
continua fortemente segregada em termos de raça e classe, em uma estrutura
claramente hierárquica”, escreveu Marques.
O retrato resultante da pesquisa é bem mais
completo e complexo do que a imagem de uma cidade clivada pela polaridade
centro-periferia, que caracterizou os diagnósticos sociológicos dos anos 1970.
Se essa imagem pode ter sido precisa naquela época, ela já não dá mais conta
dos processos em curso. Na nova configuração, áreas de elite cada vez mais
exclusivas e fechadas coexistem com a popularização do centro histórico e
regiões intermediárias e periféricas misturadas socialmente.
Outro desmentido proporcionado pelo estudo foi que
o crescimento econômico do setor de serviços, especialmente dos serviços
produtivos e do comércio, não provocou um esvaziamento da indústria, ao
contrário do que sugeriam certas análises dos anos 1990.
“A metrópole paulistana aparentemente experimentou
uma superposição de funções econômicas, concentrando capacidades de comando sem
perder completamente a produção industrial”, ponderou Marques.
O balanço das duas décadas estudadas apontou o
crescimento da escolaridade em todas as classes, como resultado do maior acesso
às políticas educacionais. E a forte entrada de mulheres no mercado de trabalho,
especialmente nas ocupações profissionais que requerem maior escolaridade e
proporcionam maior rendimento.
Também o processo de favelização não se
intensificou. Ao contrário, a população favelada cresceu proporcionalmente
menos do que o conjunto da população. E, como tendência predominante, as
condições sociais de infraestrutura das favelas paulistanas melhoraram,
especialmente na última década.
Mas esse cenário menos desigual não se expressou em
termos de raça. “Embora a presença dos autodeclarados não brancos tenha
aumentado em todas as classes, a sua presença relativa nas classes superiores
não se alterou, sugerindo a manutenção quase intocada das desigualdades
raciais. Grupos de renda mais baixa apresentam menor segregação racial do que
os grupos de renda mais alta”, destacou Marques.
“As décadas de 1990 e 2000 apresentaram sinais
trocados em termos de emprego e pobreza. Nos anos 1990, após um momento
concentrado de melhora em 1994, com a estabilização econômica, o desemprego, a
informalidade e a pobreza voltaram a crescer. Nos anos 2000, esses vetores se
inverteram, com a redução do desemprego e da pobreza e o aumento da
formalização dos postos de trabalho”, disse.
“O balanço geral de duas décadas indica um saldo de
redução da pobreza e das desigualdades medidas pela renda, assim como a
diminuição do desemprego e o crescimento dos postos formais de trabalho”,
sintetizou Marques.
Mobilidade urbana
Uma herança especialmente indesejável que a São
Paulo do século XXI herdou da São Paulo do século XX diz respeito à mobilidade
urbana. Como revelou a pesquisa, um terço dos deslocamentos ainda é feito a pé
e as modalidades rodoviárias predominam amplamente na comparação com o
transporte sobre trilhos.
O ônibus é o veículo público mais utilizado,
respondendo por um quarto dos deslocamentos. E também aquele que apresenta
tempos de viagem substancialmente mais elevados.
Essa estrutura pública de transportes, que pouco
evoluiu ao longo das duas últimas décadas, coexiste com o inchaço do transporte
individual, com os automóveis e os ônibus praticamente emparelhados em número
de pessoas transportadas.
A metrópole de São Paulo no século XXI: espaços,
heterogeneidades e desigualdades.
Organizador: Eduardo Marques
Editora: Editora Unesp /CEM
Páginas: 456
Lançamento: 201
Preço: a definir
Fonte: Agência Fapesp
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