Esgoto
tratado aumenta produtividade na agricultura de água.
Por Giovanna Lukesic Reis, para Agência USP –
Em tempos de escassez de água, pesquisas que
resultam em métodos de economia desse recurso são fundamentais. É o caso da
pesquisa feita pelo Núcleo de Pesquisa em Geoquímica e Geofísica da Litosfera
(Nupegel) da USP, em Lins e Piracicaba, sobre irrigação de solos agrícolas
utilizando os resíduos do tratamento de esgoto.
A técnica desenvolvida apresenta três resultados principais: a economia de água e de fertilizantes minerais nitrogenados; evita o descarte de águas residuárias do tratamento de esgoto diretamente em rios; e aumenta a produtividade das culturas irrigadas com esses efluentes.
Setor agrícola consome cerca de 70% da água do País
em irrigação. Foto: Marcos Santos / USP Imagens.
Em um dos experimentos com cana-de-açúcar, a
produção foi 60% maior que a média da produção sem irrigação para o estado de
São Paulo no ano avaliado, segundo o professor Adolpho Melfi, responsável pela
pesquisa e coordenador do Nupegel. Na cultura de capim, economizou-se de 32% a
81% da fertilização nitrogenada mineral no ano mais chuvoso (menos irrigação) e
mais seco, respectivamente. “Em todos os casos, a irrigação com efluente
aumentou [o rendimento da cultura] em relação àquele sem irrigação ou mesmo com
irrigação com água”, conta Melfi.
De acordo com os pesquisadores, o estudo é
importante para o setor agrícola, o qual consome, segundo a Agência Nacional de
Águas (ANA), cerca de 70% da água do País em irrigação. O crescimento do
agronegócio, principalmente em São Paulo, é um agravante da situação, pois faz
com que o interesse por áreas irrigadas aumente, uma vez que elas geram mais
alimentos, fibras e combustíveis. A utilização de resíduos de esgotos tratados
apresenta um grande potencial justamente porque substitui a água doce na
irrigação de certas culturas, o que possibilita a grande economia desse
recurso.
Existem diversos tipos de tratamento de esgoto e,
em princípio, todos eles podem ser usados na irrigação. No caso do projeto do
Nupegel, foram usados dois processos biológicos: o primeiro, por lagoas de
estabilização, no qual os esgotos são degradados por bactérias e utilizando
energia solar.
No segundo tratamento, chamado Sistema de Reatores
Anaeróbios de Fluxo Ascendente com Manta de Iodo (UASB), também são utilizadas
bactérias, mas com o esgoto é tratado em reatores que funcionam com energia
elétrica.
Os pesquisadores utilizaram os resíduos tratados
nas culturas de milho, cana de açúcar, laranja, girassol e café. No caso da
cana de açúcar, em um dos experimentos, a produção aumentou 60%. Na cultura de
uma espécie de capim, economizou-se de 32% a 81% da fertilização no ano mais
chuvoso (menos irrigação) e mais seco, respectivamente.
Regulamentação
Apesar de ser uma alternativa viável e interessante
dos pontos de vista ambiental, econômico e social, a técnica é quase
inexistente no Brasil, ao contrário do que se vê nos Estados Unidos, Israel e
Austrália. Segundo o professor Melfi, é uma área relativamente nova para a qual
não existe ainda uma legislação específica, por isso são necessários estudos
sistemáticos sobre o impacto dessa técnica no solo, nas plantas, na água e na
atmosfera para que haja regulamentação e permita sua implantação.
Segundo os pesquisadores, em projetos de utilização de esgoto tratado na irrigação de culturas, deve-se estar atento a possíveis modificações no ambiente, positivas ou negativas. Por isso, foram avaliados, nos diversos experimentos, os impactos da irrigação nas propriedades físicas, químicas e físico-químicas do solo, na produtividade das plantas, no balanço nutricional e na fertilidade do solo. Por fim, foi realizado um estudo sistemático das emissões de gases de efeito estufa pelos solos irrigados com água e com efluente.
Segundo os pesquisadores, em projetos de utilização de esgoto tratado na irrigação de culturas, deve-se estar atento a possíveis modificações no ambiente, positivas ou negativas. Por isso, foram avaliados, nos diversos experimentos, os impactos da irrigação nas propriedades físicas, químicas e físico-químicas do solo, na produtividade das plantas, no balanço nutricional e na fertilidade do solo. Por fim, foi realizado um estudo sistemático das emissões de gases de efeito estufa pelos solos irrigados com água e com efluente.
Há três pontos importantes para se ressaltar: os
organismos que causam doenças presentes nos esgotos tratados não oferecem
riscos pelo fato de as culturas irrigadas terem obrigatoriamente de passar por
processamentos industriais antes de serem utilizadas pelo homem. A espécie de
capim utilizada, por exemplo, só é consumida pelo gado após a produção de feno.
Outro ponto é com relação ao sódio, o qual, apesar
de sua alta concentração no efluente – o que poderia causar efeitos negativos
sobre as propriedades físicas do solo –, nos períodos de chuva, é naturalmente
lavado e arrastado pela água. Se necessário, é possível ainda minimizar seus
efeitos com a aplicação do gesso agrícola, utilizado para corrigir o solo.
Finalmente, por serem esgotos domésticos, os metais pesados, quando presentes,
apresentam teores abaixo dos valores restritivos impostos pela legislação e
pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
“Existem vários projetos no Brasil sobre isso, mas
acho que estudando nesse período de tempo tão longo, 14 anos, avaliando todas
essas características, estudando solo, planta, atmosfera, água superficial e
subterrânea, [o nosso] seja, provavelmente, um projeto ‘pioneiro’”, comenta a
professora Célia Rocha, vice-coordenadora do Nupegel.
O projeto é fruto de uma parceria entre a USP e a
Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), com apoio
financeiro e bolsas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (Capes) e
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). “Além dos
resultados positivos do ponto de vista ambiental e econômico, o projeto teve o
mérito de permitir a formação de recursos humanos em um setor ainda carente de
especialistas”, comenta Melfi.
Fonte: Agência USP
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