O mundo
esqueceu dos refugiados da Síria.
Crianças sírias junto à sua moradia provisória no
vale do Beka, no Líbano. Foto: DFID-Departamento da Grã-Bretanha para o
Desenvolvimento Internacional/CC-BY-2.0.
Por Zhai Yun Tan, da IPS –
Washington, Estados Unidos, 6/7/2015 – O Programa
Mundial de Alimentos (PMA) alertou que 440 mil refugiados da guerra civil da
Síria poderão passar fome se esta organização de ajuda alimentar da Organização
das Nações Unidas (ONU) não receber fundos adicionais até agosto. O PMA, maior
agência humanitária dedicada à luta contra a fome, oferece comida mensalmente a
seis milhões de pessoas necessitadas na Síria e na região vizinha.
Embora o PMA tenha recebido US$ 5,38 bilhões em
2014, as emergências constantes na Síria, no Iraque e em outros lugares fazem
com que as necessidades superem com juros os fundos disponíveis. A agência
ajudou 2,5 milhões de refugiados em 2014, mas a escassez de dinheiro obrigou-a
a reduzir suas operações, e atualmente só 1,6 milhão de pessoas recebem suas
rações.
Um informe do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (Pnud), publicado em março, revela que 3,33 milhões de
refugiados fugiram da Síria desde 2014, o que converte os sírios na segunda
população de refugiados do mundo, depois dos palestinos.
Os cortes do PMA ocorrem no quarto ano em que os
refugiados sírios passam fora de suas casas, sem poderem celebrar o Ramadã, o
mês sagrado dos muçulmanos. No próximo inverno boreal, até 1,7 milhão de
pessoas poderão ficar sem combustível, moradia, isolamento térmico ou cobertas.
O PMA é financiado em sua totalidade com as
contribuições voluntárias de governos empresas e particulares. A agência
informa que seu programa regional no Oriente Médio opera com déficit de 81% e
precisa de US$ 139 milhões para ajudar os refugiados sírios no Egito, Iraque,
Jordânia, Líbano e Turquia, até setembro deste ano.
“Justo quando pensávamos que as coisas não podiam
piorar, nos vemos obrigados novamente a fazer mais cortes”, afirmou o diretor
regional do PMA para o Oriente Médio, Muhannad Hadi, em um comunicado de
imprensa divulgado no dia 1º deste mês. “Os refugiados já se esforçavam para se
arranjarem com o pouco que podíamos oferecer”, acrescentou.
A escassez de fundos humanitários começou em 2013,
quando caiu em 30% o número de refugiados sírios que recebiam ajuda alimentar
do PMA. O tamanho dos pacotes de alimentos diminuiu em outubro do ano passado,
após o anúncio da agência de que em dezembro ficaria sem dinheiro para seus
programas na Síria.
Em abril, Ertharin Cousin, diretora-executiva do
PMA, pediu mais fundos ao Conselho de Segurança e aos países membros das Nações
Unidas. “Quando anunciamos as reduções na Jordânia, nossas linhas telefônicas
congestionaram. Todos os dias nos chegam milhares de pedidos. Telefonemas de
famílias que esgotaram seus recursos e se sentem abandonadas por todos nós. Uma
mulher nos disse ‘não posso ficar se não puder alimentar meus filhos’”,
acrescentou Cousin.
Uma campanha arrecadou dinheiro suficiente para o
PMA continuar com seu trabalho até dezembro de 2014, mas em janeiro a agência
reduziu de US$ 27 para US$ 19 a soma destinada aos cartões eletrônicos de
alimentos que são entregues aos refugiados. A partir deste mês essa quantia
caiu para US$ 13,5.
Não é a primeira vez que o PMA sofre falta de
fundos. Em 2009, as operações de ajuda a Bangladesh, Guatemala e Quênia tiveram
o fornecimento de rações alimentares reduzidas por esse motivo. Em 2011, viveu
situação semelhante no Zimbábue. Nesses casos, o PMA suspende programas e só
fornece ajuda aos mais vulneráveis, como grávidas, crianças e idosos.
As gestões internacionais para aliviar o sofrimento
causado pela crise síria culminaram, no dia 25 de junho, com o Plano Regional
de Refugiados e Resiliência, que precisa de US$ 5,5 bilhões para cobrir as
necessidades dos governos anfitriões, dos organismos da ONU e das operações de
ajuda das organizações não governamentais na região. Segundo o Escritório da
ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários, só foram obtidos 25% da
quantia solicitada.
“Essa crise enorme requer muito mais solidariedade
e responsabilidade compartilhada da comunidade internacional do que vimos até
agora”, afirmou o Alto Comissário da ONU para os Refugiados, António Guterres,
em um comunicado de imprensa divulgado no dia 25 de junho. “Temos uma escassez
tão perigosa de fundos que corremos o risco de não podermos atender nem mesmo
as necessidades básicas de sobrevivência de milhões de pessoas nos próximos
seis meses”, ressaltou.
Os Estados Unidos colaboraram com US$ 609 milhões,
o que representa 26,4% do total prometido. A Grã-Bretanha vem a seguir com US$
344 milhões.
Uma entrevista do PMA com refugiados sírios no
Líbano capta seu desespero. “Cada vez que damos um passo adiante, retrocedemos
outros dez. Já renunciei à esperança de que um dia voltaremos a viver com
normalidade. Sei que o mundo se esqueceu de nós, somos uma carga muito pesada.
Fomos abandonados”, afirmou Fatmeh, refugiada que fugiu para o Líbano em 2012.
A crise na Síria começou em 2011, quando as forças
de segurança mataram vários manifestantes que pediam reformas democráticas. Os
distúrbios foram acompanhados de pedidos de renúncia do presidente Bashar al
Assad, aos quais o governo respondeu com violência.
A situação se agravou com o surgimento do
extremista grupo armado Estado Islâmico (EI), no norte e leste da Síria. O país
se converteu em um campo de batalha entre as forças pró-governamentais, os
combatentes curdos, o EI e os insurgentes que pretendem derrubar Assad.
No contexto da violência, a economia síria está em
ruínas. O informe do Pnud revela que 80% da população vivia na pobreza em 2014,
e quase dois terços não tinha os alimentos nem os artigos não alimentares
necessários para a sobrevivência. Até o final do ano passado, a guerra civil
havia causado a morte de 210 mil pessoas e deixado mais de 840 mil feridos.
Fonte: ENVOLVERDE
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