O que
pensam crianças e adolescentes sobre a vida em São Paulo.
Ao lado de Suplicy e Ana Estela Haddad, jovens
foram protagonistas da pesquisa e do evento de lançamento. Foto: Divulgação.
Por Danilo Mekari, do Portal Aprendiz –
“A juventude tem voz / e o futuro somos nós”.
Cantados pelo grupo de rap Matéria Rima, este pequeno refrão encerrou o evento
de lançamento da pesquisa IRBEM (Indicadores de
Referência de Bem-Estar no Município) Criança e Adolescente, realizado nesta
quinta-feira (23/7) no auditório do SESC Consolação, no centro de São Paulo.
Pela primeira vez, o levantamento – feito desde
2010 pela Rede Nossa São Paulo (RNSP) e divulgado sempre no dia do aniversário
da cidade (25/1) – ouviu apenas crianças e adolescentes. No total, 805 pessoas
na faixa etária de 10 a 17 anos, provenientes de todas as regiões da cidade,
opinaram sobre os 53 aspectos da pesquisa, divididos em 13 temas. O lançamento
do diagnóstico concretiza um antigo sonho do Grupo de Trabalho Criança e
Adolescente da RNSP, coordenado por Raniere Pontes.
“Segundo o IBGE, há 3,2 milhões de pessoas na
cidade de São Paulo com menos de 19 anos. Ouvimos de forma qualificada e
representativa as crianças e adolescentes do município. É a nossa contribuição
para o desenvolvimento da cidade. Esperamos que esses dados ajudem essas
pessoas a serem cuidadas e protegidas, e não enviadas à cadeia”, afirma Pontes,
citando o debate sobre a redução da maioridade penal e arrancando aplausos da
plateia.
A CEO do IBOPE Inteligência, Márcia Cavallari,
apresentou os resultados da pesquisa ao público. Para ela, os dados recolhidos
podem subsidiar as políticas públicas dedicadas a meninos e meninas.
“Analisando a tendência das respostas, fica claro que a criança e o adolescente
têm satisfação maior naquilo que se refere aos aspectos cotidianos, como a
relação com a família, amigos e bairro. O que mais as desaponta são as relações
com a cidade, como a conservação de lugares públicos, o estado dos rios, lagos e
represas da cidade e a relação com a polícia.”
A Polícia Militar é uma das instituições que geram
mais desconfiança de criança e adolescentes. Mais de 20% dos entrevistados a
classificam como ruim ou péssima, enquanto 68% são contra o modo como as
pessoas são tratadas pelos agentes de segurança.
Em depoimento, Jonatan, 17, integrante da
Plataforma dos Centros Urbanos da Unicef e morador da zona sul da capital
paulista, defendeu a desmilitarização da PM. “Se for para estar numa praça às
11 da noite vigiada pela polícia, eu prefiro estar em casa, já que sou alvo por
ser jovem, negro e periférico.”
A pesquisa revela que a percepção dessa faixa
etária quanto à presença de postos de saúde, hospitais e espaços de lazer em
seus territórios é acima da média. Não se pode dizer o mesmo de equipamentos
como teatros, bibliotecas e cinemas.
Presente no lançamento, Rodrigo, 19, que faz parte
do Galpão de Cultura e Cidadania da Fundação Tide Setúbal e mora em Ermelino
Matarazzo (zona leste), reclama da falta de infraestrutura em espaços da
periferia. “Tem teatro sem nenhuma apresentação, tem praça sem banco nem
árvore, essas coisas. Não queremos as propostas dos adultos, mas sim poder
propor mudanças nós mesmos. Hoje o jovem periférico não quer apenas ser
inserido no mercado de trabalho, queremos fazer atividades que impactam na
nossa vida, como aulas de teatro, violão, DJ. Não queremos ser só mais um caixa
de supermercado.”
Jonatan também reclama da precariedade de espaços
culturais na periferia. “Eles estão concentrados no centro e possuem acesso
restrito, já que gasto dez reais pra ir e voltar de lá.”
Para as crianças e adolescentes, as relações
humanas existentes na metrópole apontam para os dois extremos, visto que 66%
delas aprova a relação com a família e 56% estão muito satisfeitos com as
amizades de escola. Contudo, 54% delas respondeu negativamente sobre o modo
como as pessoas se relacionam na capital. Ainda, 56% deram notas baixas no
quesito ‘respeito às pessoas de diferentes cores, religiões, culturas e povos’.
A conservação de ruas, calçadas, praças e parques
da cidade foi rejeitada por 65% dos entrevistados, assim como a aparência de
seu bairro (55%). A rejeição atinge o ápice no quesito “preservação de rios,
lagos e represas”: 74%.
Maurício Broizini, coordenador da Secretaria
Executiva do Movimento Nossa São Paulo, classificou a pesquisa como
surpreendente. “Muito interessante as respostas dos jovens. É assim que somamos
condições para olhar gerações que estão vindo de uma maneira mais consistente,
considerando suas expectativas, esperanças e a sua relação com a cidade, com os
processos participativos, as politicas públicas. Serve para avançarmos na
compreensão do universo juvenil e infantil”, acredita.
Citando as recentes votações no Congresso Nacional,
que reduzem os direitos garantidos pelo Estatuto da Criança e Adolescente,
Broizini completa: “Serve ainda para que percebamos como estamos vivendo tempos
equivocados: a proposta do Congresso de diminuir a idade penal incorre em um
profundo erro ao tentar criminalizar adolescentes que mal tiveram o acolhimento
e a atenção que merecem, conforme deveriam ter por direito”.
Fonte: Portal Aprendiz
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