Japão
registra meta ruim e culpa tsunami.
O primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe. Foto:
Prime Minister’s Office of Japan/ Fotos Públicas.
Por Claudio Angelo, do OC –
Proposta do país muda ano-base de 1990 para 2013 e
cria facilidades para cumprimento que podem significar apenas 7% de corte de
emissões em 2030.
O Japão entregou na noite de sexta-feira à
Convenção do Clima das Nações Unidas sua proposta de meta para o acordo de
Paris. É uma das mais tímidas registradas até aqui por um país industrializado,
e quem levou a culpa pela falta de ambição foi o trágico tsunami de 2011, que
afetou o parque energético nuclear japonês.
A INDC (Contribuição Nacionalmente Determinada
Pretendida) do país do sol nascente prevê uma redução de emissões de 26% em
2030 em relação aos níveis de 2013, o que dá um corte de 18% em relação aos
níveis de 1990. No entanto, o governo está aplicando mecanismos contábeis que
reduzem o esforço real a pífios 7% a 11% em relação a 1990. É uma das metas
menos ambiciosas registradas até aqui por um país industrializado.
O anúncio do governo do premiê Shinzo Abe foi
recebido com críticas pela sociedade civil. O Climate Action Tracker, uma rede
de institutos de pesquisa que avalia as propostas de cada país em relação à
meta de evitar que a Terra esquente mais de 2oC, classificou a INDC de
“inadequada”. “Se todos os países adotassem esse nível de ambição, o
aquecimento provavelmente ultrapassaria os 3oC ou 4oC”, afirmou o Tracker em
sua análise da proposta. Segundo a rede, apenas com as políticas já em curso, o
Japão poderia cumprir a meta quase sem esforço adicional.
O esforço de mitigação proposto pelo governo Abe é
menor do que o prometido pelos principais competidores econômicos do Japão no
cenário internacional: significaria um corte de 2,3% a 2,5% das emissões por
ano, enquanto o da União Europeia e dos EUA chegaria mais perto de 3% ao ano.
Na comparação com 1990, a UE propôs um corte de 40% de suas emissões em 2030;
os EUA chegariam a 27% de redução.
Entre os grandes emissores do mundo
industrializado, o Japão só ganha em ambição do Canadá, cuja meta poderia até
permitir um aumento líquido de emissões em 2030 em relação a 1990, e da Rússia,
que mais ou menos declarou que não vai fazer nada, mesmo, mas que está disposta
a negociar.
Não bastasse a mudança radical de ano-base e o
compromisso em si pouco altivo, o Japão ainda declarou que vai aplicar
deflatores à sua meta, por assim dizer. O país, que é um dos mais florestados
do mundo, declarou que pretende usar o carbono sequestrado por suas árvores
como forma de compensar emissões no setor de energia. Segundo o Climate Action
Tracker, isso já reduziria o esforço de 18% para 15% em relação às emissões de
1990. Este esforço, por sua vez, é ainda reduzido em quase um quarto com a
decisão de lançar mão de um mecanismo doméstico de créditos.
No texto da INDC, o governo explica a mudança do
ano-base da meta para 2013 de forma prosaica: isso se deveu a uma “drástica
mudança de circunstâncias” no Japão, que em 2011 enfrentou o pior terremoto já
medido na história, seguido de um tsunami colossal que destruiu a usina nuclear
de Fukushima e abalou a confiança nacional nessa forma de energia, que não
emite CO2.
A partir da tragédia, o governo foi forçado a rever
todo o planejamento nacional de energia – o ano do novo plano, 2013, virou o
ano de referência da meta japonesa. Segundo a Climate Action Network do Japão,
mudar o ano-base para 2013, quando as emissões nacionais foram muito altas,
para dar a impressão de estar fazendo um grande esforço é “enganar o público”.
Escasso em recursos naturais, o Japão já é uma das
economias mais eficientes do mundo. Cortar emissões por lá é significativamente
mais caro do que nos EUA e na Europa. Daí o país ter tentado repetidas vezes
abandonar o Protocolo de Kyoto, o que não fez em parte por uma questão de
imagem – o acordo foi, afinal, assinado na antiga capital nipônica.
No entanto, o país ainda é um grande emissor
histórico, o quinto maior poluidor mundial, e tem emissões per capita muito
altas. “O governo explicou que o compromisso com essa meta para 2030 manteria o
Japão alinhado com a meta de reduzir as emissões em 80% em 2050. Mas, na
realidade, a meta proposta hoje apenas reflete o abandono, pelo Japão, de
medidas contra as mudanças climáticas”, afirma a nota da Climate Action
Network.
Fonte: Observatório do Clima
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