quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Nova detecção espacial do desmatamento.
Por Sandra Damiani –

O uso de duas novas tecnologias deve gerar ganhos significativos na detecção do desmatamento na Amazônia ao permitir o monitoramento de áreas cobertas por nuvens e aquelas desmatadas de menor dimensão a partir deste segundo semestre do ano. A primeira inovação, anunciada nesta semana, é o uso de imagens do radar orbital SAR (sigla em inglês para Synthetic Aperture Radar) que começa a gerar dados para a fiscalização a partir de outubro. O investimento totalizou R$ 80,5 milhões, R$ 63,9 milhões dos quais fazem parte dos recursos não reembolsáveis do Fundo Amazônia e o restante do orçamento da União.

A segunda será o aumento da resolução do mapeamento do Deter com a adoção de imagens do satélite indiano, ResourceSat-2 (AWiFS). Em fase de testes, ele é capaz de detectar desmatamentos com tamanho mínimo de 6,25 hectares. Esperado inicialmente para final de 2014, a previsão, segundo o Ministério do Meio Ambiente, é de que a nova ferramenta seja lançada nos próximos meses.

Com os dois investimentos, a política brasileira de monitoramento e combate ao desmatamento superaria neste ano dois limitadores: a impossibilidade de identificação de desmatamentos em áreas sob nuvens e a baixa resolução do Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter), usado para alertas à fiscalização, quando comparado ao Prodes, responsável pela taxa anual de desmatamento com base em três satélites.

Aprimorando o monitoramento

Conforme o diretor do Departamento de Políticas para o Combate ao Desmatamento (DPCD) do Ministério do Meio Ambiente, Francisco Oliveira Filho, o governo federal deve anunciar ainda neste segundo semestre o aprimoramento do Deter, aumentando sua resolução para padrões equivalentes ao do radar orbital e ao dos satélites que alimentam o Prodes. Hoje o Deter identifica áreasdesmatadas a partir de 25 metros, mas com as imagens do satélite indiano e a melhor resolução terá capacidade para descobrir desmatamentos pelo menos quatro vezes menores.

Fiscalização antecipada e em áreas sob contínua nebulosidade

O uso do radar orbital trás como principal avanço o fornecimento de informações sobre o desflorestamento durante o período com maior predominância de nuvens, entre outubro e março, e em regiões com alta nebulosidade mesmo fora da estação chuvosa. Oliveira Filho explica que a oferta desses dados, até então indisponíveis ou limitados, permitirá antecipar e melhor distribuir ao longo do ano as ações de fiscalização terrestre. “Nossa capacidade de observação da Amazônia está mais completa. Neste período ficávamos com um olhar limitado à equipe de inteligência no campo, agora temos um novo aliado que são as imagens de radar.”

Sem o radar, a derrubada da floresta no início dos meses chuvosos só seria descoberta após vários meses quando a condição atmosférica estaria favorável à captura de imagens pelo sensor ótico do satélite MODIS, usado pelo Deter. Dessa forma, a informação ágil que estará acessível a partir de outubro, pode ajudar a coibir os desmates antes que alcancem maiores proporções.

O radar também tornará visível a retirada de cobertura florestal em regiões que estão continuamente sob nuvens, independente do período do ano, como é o caso de todo o estado do Amapá e de partes do extremo norte do Pará. “Vamos passar a monitorar sistematicamente o Amapá e outras áreas com essas características”, adianta o diretor Geral do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), Rogério Guedes.

Para o pesquisador sênior da ONG Imazon, Beto Veríssimo, o uso do radar precisa ser comemorado e suas informações podem intensificar o combate ao desmatamento . Em sua opinião, o Brasil tem chance de cumprir a meta oficial de redução do desmatamento em 80% até 2020, alcançando a taxa anual de 3.900 quilômetros quadrados de área desmatada, mas o governo teria condições de assumir uma posição mais ousada com o objetivo de perseguir o desmatamento zero para 2020. “O desmatamento ocorrido na Amazônia é muito grande. Já desmatamos três vezes o estado de São Paulo, então já deveríamos estar zerando e recuperando essas áreas”, ressalta.

Como funcionará dobradinha SAR e MODIS.

O uso do radar orbital será restrito às áreas sob condições climáticas adversas, complementando o monitoramento do Deter, que faz a cobertura de toda a Amazônia Legal. Como usa a tecnologia ótica, que não ultrapassa a barreira das nuvens, os dados do Deter não identificam a perda florestal em regiões encobertas. Acoplado a um satélite, o sensor radar realiza um monitoramento mais rápido e preciso porque funciona com tecnologia de micro-ondas. Sua resolução de 18 a 22 metros permitirá identificar desmatamentos de dimensões menores que todos os demais sistemas.

O radar auxiliará, em especial, a geração de dados para alertas às equipes que atuam na fiscalização em terra. Em razão do alto custo, a ação terá como foco regiões prioritárias em função do alto risco de desflorestamento. Esse mapeamento ocorrerá dentro do âmbito de 950 mil quilômetros quadrados, aproximadamente 17% da região amazônica.

As imagens do radar serão analisadas pelo Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam) e enviadas ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a cada 30 dias.

Guedes observa que as imagens do radar, compradas pelo órgão, reduzem o tempo de processamento e análise das áreas monitoradas de 15 para 3 dias, em comparação ao desempenho obtido em sobrevoos feitos com a aeronave R-99 da FAB na etapa anterior do projeto Amazônia SAR. Paralelo ao monitoramento constante, o projeto prevê a construção da antena de recepção em Brasília, com início de operações em 2018, o que, entre outras coisas, reduzirá o custo das imagens e o tempo de processamento.

* Sandra Damiani é jornalista e atua há 15 anos em iniciativas de comunicação para o desenvolvimento. Foi especialista de comunicação para os biomas Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal nas organizações ambientalistas WWF-Brasil e Conservação Internacional. Pela ANDI, desenvolve projetos especiais de apoio à cobertura em temáticas de relevância socioambiental, tais como mudanças climáticas e desmatamento na Amazônia. É mestranda em Desenvolvimento Sustentável na Universidade de Brasília.


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