quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Cabras ajudam a enfrentar mudança climática.
Muitos zimbabuenses se dedicam à criação de pequenos animais, como cabras, que suportam condições ambientais mais secas, para evitar as consequências da mudança climática, que já causou a morte de várias vacas ao longo dos anos. Foto: Jeffrey Moyo/IPS.

Por Jeffrey Moyo, da IPS – 

Harare, Zimbábue, 24/7/2015 – No momento em que um clima incomum, quente e seco, afeta o Zimbábue, a mudança climática e a consequente seca fizeram com que muitos criadores perdessem grande número de animais. Isso os levou a optar por criar cabras como forma de preservar seus bens pecuários. Especialistas em mudança climática coincidem em que a criação de animais tolerantes à seca, que se alimentam de arbustos e necessitam menos trabalho humano, é uma alternativa melhor às vacas, as quais exigem muito mais cuidados.

Isso acontece enquanto a Organização das Nações Unidas (ONU) pede urgência às nações do mundo para tomarem medidas de combate à mudança climática e enfrentem suas consequências no contexto das discussões sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que deverão ser aprovados pela Assembleia Geral em setembro. Os ODS são um conjunto de 17 objetivos, metas e indicadores para que os Estados membros da ONU os utilizem como parâmetros de referência em matéria de desenvolvimento, para criar suas agendas e suas próprias políticas para os próximos 15 anos.

“Com as flutuações dos padrões de chuva no Zimbábue, a criação de gado ficou insustentável. Mas as cabras, que suportam melhor a seca, oferecem muito mais benefício”, disse à IPS o especialista em mudança climática Happison Chikova, formado em geografia e estudos ambientais na Midlands State University.

Inclusive, Chrispen Kadiramwando, presidente da Associação de Criadores de Cabras, confirmou que “há planos iminentes para impulsionar a produção desses animais nas regiões secas do Zimbábue, onde prosperam pequenos rebanhos, e identificamos mercados para exportar sua carne em países como África do Sul, Tanzânia, Nigéria e outros do Oriente Médio, onde é considerada um manjar”.

Dados do Ministério de Pequenas e Médias Empresas e Desenvolvimentos Cooperativos mostram que há cerca de 136 mil criadores de cabras no país, que vão de pastores comunitários até periurbanos. Livias Ncube, da região 5, a mais quente do país no distrito de Mwenezi, é um dos que optaram pela criação e venda de cabras. “Dificilmente as chuvas são suficientes nessa parte do país, a zona mais seca do Zimbábue, mas não uso nenhuma ração para alimentar minhas cabras, pois se adaptam às condições e inclusive são mais gordas”, contou Ncube à IPS.

Além de vender as cabras localmente, Ncube se converteu em exportador de carne de caprino para países vizinhos como África do Sul e Moçambique. “Apesar de manter um gado considerável, apesar de uma série de secas que deixaram várias vacas mortas, agora tenho um rebanho de 130 cabras e também ganho dinheiro vendendo-as”, ressaltou. Ele disse que ganha US$ 1.600 por mês vendendo cabras, por cerca de US$ 70 cada uma. Esses animais se reproduzem mais rápido do que as vacas, apesar das condições de seca da região.

Por meio do programa Gado para a Resiliência Melhorada e a Recuperação Acelerada do Zimbábue (ZRR), com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), Ncube aprendeu a gerir a criação de cabras e o mercado para melhorar sua renda. O programa ZRR oferece aos criadores capacitação para a criação de cabras e a gestão de sua saúde, além de formar os trabalhadores rurais em técnicas de prevenção e cuidado de animais.

Já são mais de dois milhões de cabras no Zimbábue e quase todas (cerca de 98%) estão em áreas comunitárias, segundo um estudo sobre criação de cabras e atividades de desenvolvimento, da Estação de Pesquisa Matobo. Porém, especialistas agrários temem que os indígenas que criam cabras não se deem conta do valor monetário que representam seus pequenos rebanhos.

“Milhares se dedicam à criação de cabras, mas poucos podem avaliar o valor de seus animais pela falta de fluxo adequado de informação entre os produtores e o mercado, o que fez com que os criadores acabassem se dedicando à troca, o que prejudica suas possibilidades de comercialização”, apontou à IPS Leonard Vazungu, funcionário de extensão agrícola.

No começo deste ano, o governo zimbabuense distribuiu dez mil cabras para criação e procura aumentar o número para 44 milhões até 2018. A iniciativa coincide com um momento em que o gado diminuiu nesse país da África austral, de 6,8 milhões de cabeças, em 2000, para os atuais 5,2 milhões.

“Investir em pequenos animais como cabras, que têm maiores possibilidades de sobreviver em zonas propensas às secas, protege o país contra os prejuízos da perda de rebanhos”, explicou Barnabas Mawire, diretor da organização Environment Africa, em um painel sobre mudança climática realizado este mês em Harare, capital do país. Mas não será fácil se não existir uma política nacional para frear o aquecimento global.

A legisladora Annastancia Ndlovu apoiou, na Assembleia Nacional, no início deste ano, uma moção para criar uma política de mudança climática em nível nacional. Ndlovu também é a presidente do Comitê da Carteira Parlamentar de Indústria da Hospitalidade, Turismo, Água e Ambiente. No Zimbábue, a escassez de recursos econômicos dificulta a luta contra a mudança climática.

“A redução dos fundos estatais para a mudança climática significa que devemos trabalhar com outros sócios para promover a agenda climática e estamos desenvolvendo uma política climática nacional, a primeira do país e para a qual precisamos da maior quantidade de recursos possível”, afirmou à IPS Veronica Gundu, principal responsável de ambiente do Ministério de Ambiente, Água e Clima.

Mas, com ou sem uma política nacional de mudança climática, muitos criadores de cabras do Zimbábue, como Ncube, dizem que avançaram sozinhos para enfrentar os impactos da mudança climática. “Seguimos com nossas vidas dentro do aprofundamento dos impactos da mudança climática e com a criação de cabras. Para nós, a vida continua apesar de terem morridos vários de nossos animais por causa da mudança climática”, acrescentou.


Fonte: ENVOLVERDE

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