Sociedade
critica resultado de Adis Abeba.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon (esquerda),
durante entrevista coletiva em Adis Abeba, após participar da Terceira
Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento. Foto:
Eskinder Debebe/ONU.
Por Thalif Deen, da IPS –
Nações Unidas, Adis Abeba, Etiópia, 17/7/2015 – A
Terceira Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento
(FPD) teve um final previsível. A Organização das Nações Unidas (ONU) assegura
que foi um sucesso estrondoso, mas grande parte da sociedade civil não tem a
mesma opinião.
Poucas horas depois da conferência, que começou no
dia 13 e terminou ontem, em Adis Abeba, capital da Etiópia, a ONU afirmou que a
Agenda de Ação de Adis Abeba (AAAA) é um “acordo inovador que fornece uma base
para implantar” os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que serão
adotados em uma cúpula mundial em setembro.
O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon,
afirmou que o acordo é um passo fundamental na construção de um futuro
sustentável para todos, já que fornece um contexto mundial para o financiamento
do desenvolvimento sustentável. “Os resultados aqui em Adis Abeba nos dão as
bases para uma aliança mundial revitalizada para o desenvolvimento sustentável
que não deixará ninguém para trás”, ressaltou Ban.
Porém, Danny Sriskandarajah, secretário-geral da
organização Civicus, com sede em Johannesburgo, na África do Sul, discorda.
“Esta semana vimos mais um sinal de que estamos no princípio do fim da ordem
mundial do desenvolvimento posterior à Segunda Guerra Mundial”, afirmou. Parece
que os países ricos não podem ou não querem aumentar os fundos de ajuda
oficial, que constituem uma fração do que eles mesmos prometeram há anos,
acrescentou.
“Estamos decepcionados porque o processo FPD ainda
não gerou recursos para financiar os investimentos necessários que acabem com a
pobreza ou para tomar medidas significativas para abordar os problemas do
sistema financeiro internacional”, destacou Sriskandarajah ao fim da
conferência. “O resultado não proporcionará as reformas que precisamos em campos
como o fiscal, que a maior parte da sociedade civil pretendia, e que são
necessárias para aumentar os recursos disponíveis para o desenvolvimento”,
acrescentou.
Martin Hojsik, da organização Action Aid, pontuou
que a rejeição a uma proposta para instalar um organismo fiscal mundial é “um
fracasso deplorável e um grande golpe na luta contra a pobreza e a injustiça”.
À IPS, afirmou que aos países em desenvolvimento, que perdem milhares de
milhões de dólares por ano com evasão fiscal, não recebem o mesmo peso na hora
de remediar a injustiça das normas fiscais internacionais.
O dinheiro produto da evasão poderia ser destinado
para “educação, saúde e outros serviços públicos que reduzem a pobreza.
Enquanto as multinacionais prosperam, os pobres e marginalizados sofrem. A luta
por um sistema tributário mundial justo não deve e não pode decair”, alertou
Hojsik.
Em um comunicado, a organização humanitária Oxfam
International afirma que o problema não resolvido das normas fiscais arranjadas
e o desenvolvimento privatizado são os principais reveses da conferência de
Adis Abeba. Mas, com a tensão produzida nas negociações, não há dúvidas de que
a determinação do Sul em desenvolvimento por uma verdadeira reforma e
cooperação fiscais se fez sentir, e que não pode ser ignorada por muito tempo.
“Uma em cada sete pessoas vive na pobreza e a
conferência de Adis Abeba foi uma oportunidade em uma década para encontrar os
recursos necessários que ponham fim a esse escândalo”, ressaltou a diretora da
Oxfam, Winnie Byanyima. Mas a AAAA “permitiu que os compromissos de ajuda
murchassem, e se limitou a entregar o desenvolvimento ao setor privado sem as
devidas garantias”, acrescentou.
O Sul em desenvolvimento se manteve firme em Adis
Abeba sobre a necessidade de se criar um órgão fiscal intergovernamental que dê
o mesmo peso aos seus países para fixar as normas internacionais em matéria de
impostos, apontou Byanyima. “Por outro lado, voltam para casa com um
compromisso frágil, o que significa que as normas arranjadas e a evasão fiscal
continuarão roubando os povos mais pobres do mundo”, enfatizou.
Para Byanyima, um sistema fiscal justo é vital na
luta contra a pobreza e a desigualdade. “Os cidadãos devem poder depender de
seus próprios governos para terem os serviços que necessitam. Mas não é lógico
pedir aos países em desenvolvimento que arrecadem mais recursos próprios se não
for reformado o sistema fiscal mundial que os impede de fazê-lo”, ressaltou.
Eric LeCompte, diretor da Rede Jubileu dos Estados
Unidos, disse à IPS que, “embora se tenha acordado um texto de compromisso
sobre o comitê fiscal, temos o primeiro acordo mundial que leva em conta o dano
gerado pelos movimentos financeiros ilícitos e pede que cessem até 2030”. Neste
momento, o mundo em desenvolvimento perde US$ 1 trilhão devido à corrupção e à
evasão fiscal, e “esses são recursos que necessitamos para acabar com a
pobreza”, acrescentou.
Em comunicado conjunto, divulgado no dia 15, as
organizações Integridade Financeira Global, Africa Progress Panel e Jubileu dos
Estados Unidos elogiaram o compromisso mundial para reduzir o traspasso de
fundos ilícitos oriundos das economias em desenvolvimento. Pela primeira vez
chegou-se a um consenso internacional sobre a importância de um tema que foi
objeto dos esforços de centenas de organizações de investigação e
desenvolvimento nos últimos dez anos, acrescentaram.
De concreto, o documento final de Adis Abeba exige
que os Estados membros “redobrem os esforços para reduzir substancialmente os
movimentos financeiros ilícitos até 2030, com o objetivo de erradicá-los,
inclusive mediante a luta contra a evasão fiscal e a corrupção, por meio de
normas nacionais mais fortes e maior cooperação internacional”. Além disso, o
texto final pede “às instituições internacionais e organizações regionais
competentes que publiquem cálculos sobre o volume e a composição” desses
movimentos.
Em sua declaração, a ONU informou que a AAAA contém
mais de cem medidas concretas que abordam todas as fontes de financiamento e
abrange a cooperação em uma ampla gama de temas, com tecnologia, ciência,
inovação, comércio e desenvolvimento de capacidades. A AAAA se baseia nos
resultados de duas conferências de FPD anteriores, que aconteceram em
Monterrey, no México, e Doha, no Catar.
Fonte: ENVOLVERDE
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