Terramérica – Amazônia Azul, a
nova fronteira brasileira.
por
Fabíola Ortiz*
Um petroleiro navega na baía de Guanabara, na costa
do Rio de Janeiro. A cerca de 250 quilômetros da costa fica uma jazida de
petróleo pré-sal, a grande riqueza econômica da chamada Amazônia Azul. Foto:
Fabíola Ortiz/IPS.
Rio de Janeiro, Brasil, 27 de maio de 2015
(Terramérica)- O Oceano Atlântico é a última fronteira no leste do Brasil, mas
ainda é uma incógnita a dimensão total de sua biodiversidade, e a pesquisa
científica e a proteção em torno dela segue atrasada com relação à exploração
de recursos como o petróleo.
A Amazônia Azul, como as autoridades brasileiras
chamam essa região rica em biodiversidade e recursos energéticos de seu mar
patrimonial, possui área semelhante à da selva tropical brasileira ou cerca de
metade do território continental do país. Por essa costa também saem 95% das
exportações brasileiras, segundo dados oficiais.
A plataforma marítima brasileira guarda 90% das
suas reservas petrolíferas provadas e 77% das gasíferas. E o grande desafio é
proteger as riquezas da Amazônia Azul ao longo dos 8.500 quilômetros de costa.
“Não nos fixamos na grandiosidade desse território.
Para se ter uma ideia, a Amazônia Azul se compara ao tamanho da Índia”, afirmou
ao Terramérica o diretor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade
Federal Fluminense, Eurico de Lima Figueiredo. Para este cientista político,
“não estamos preparados para cuidar dela, mesmo sendo considerada uma
prioridade política e econômica do país”.
Figueiredo, que presidiu a Associação Brasileira de
Estudos de Defesa entre 2008 e 2010, assegurou que a Amazônia Azul é uma
expressão que busca denominar territórios vinculados aos novos tratados do
direito marítimo internacional. O Brasil está entre os dez países do mundo com
maior plataforma continental, em um oceano como o Atlântico, que mantém oculta
uma incalculável riqueza marinha, com grandes potencialidades econômicas,
científicas e tecnológicas.
Segundo a Convenção das Nações Unidas sobre o
Direito do Mar, a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) de cada país inclui seu mar
territorial, de 12 milhas náuticas desde a linha de base, a zona contígua, que
chega até as 24 milhas, e o mar patrimonial, que alcança até 200 milhas
náuticas (370 quilômetros lineares). No caso do Brasil, a ZEE originalmente superava
os 3,5 milhões de quilômetros quadrados.
A esse território o país solicitou o acréscimo de
outros 963 mil quilômetros quadrados, que diferentes instituições nacionais,
incluídas as científicas, reivindicam, argumentando que representam o
seguimento natural do talude de sua plataforma continental. A Comissão de
Limites da Plataforma Continental da Convenção, formada por 148 países, até
agora deu razão ao Brasil na incorporação à sua ZEE de 771 mil quilômetros
quadrados, enquanto permanece pendente a decisão sobre o restante.
A reivindicação brasileira, ao menos na expansão da
plataforma concedida até agora, atende os requisitos da Convenção da
Organização das Nações Unidas (ONU) e dá ao país beneficiado poder para
explorar os recursos existentes na área ampliada e o obriga a manter
responsabilidades em seu manejo.
O reconhecimento a favor do Brasil, ainda que não
seja total, não deixa de levantar desconfiança entre alguns vizinhos, pelos
imensos interesses econômicos na plataforma continental adicional concedida.
Mapa oficial de parte da Amazônia Azul, a grande
fronteira ocidental no Atlântico brasileiro, cuja proteção e pesquisa seguem
atrás de seu desenvolvimento econômico, principalmente petroleiro. Foto:
Governo do Brasil.
Figueiredo explicou que agora o grande desafio é
monitorar e proteger sua plataforma marítima. “Não temos plena soberania em
relação aos territórios marítimos. A sociedade brasileira não sabe da
necessidade e importância de se proteger a Amazônia Azul. Há uma grande
carência em relação às nossas necessidades”, ressaltou.
Em 2005 foi aprovado um plano de modernização da
Marinha com investimento estimado em US$ 30 bilhões até 2025. A defesa de um
país é complexa, segundo Figueiredo, pois reúne dimensões como a militar, a
econômica ou a técnica e a científica.
Atualmente, a velocidade com que são explorados os
recursos marinhos – como os hidrocarbonos situados sob uma camada de sal de
mais de dois mil metros, a 250 quilômetros da costa e a sete mil metros de
profundidade – é muito mais rápida do que o ritmo das pesquisas científicas. Os
depósitos de pré-sal, descobertos há uma década, colocariam o Brasil entre os
dez países com maiores reservas de hidrocarbonos do mundo, enquanto já fornecem
27% dos mais de três milhões de barris equivalentes de petróleo e gás que o
país produz por dia.
“Essa região pertence ao Brasil. O país assumiu
compromissos junto à ONU para monitorar e estudar os recursos vivos e não
vivos, como petróleo, gás e minérios. Se não a preservarmos, vamos perder essa
grande riqueza”, pontuou ao Terramérica o oceanógrafo David Zee, da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Em sua opinião, o Brasil está longe de
cumprir os compromissos assumidos junto à comunidade internacional.
“A ONU nos impõe deveres e pesquisa científica.
Temos que tratar com mais cuidado nossos recursos marinhos”, afirmou Zee. Além
da riqueza hidrocarbonífera, em grande parte da ZEE se sobrepõe o bioma da Mata
Atlântica, que se estende por 17 Estados brasileiros, 14 deles costeiros.
A organização SOS Mata Atlântica afirma que as
zonas costeiras e marinhas representam a transição ecológica entre ecossistemas
terrestres e marinhos, como mangues, dunas, escarpas, baías, estuários,
arrecifes, corais e praias. A riqueza biológica desses ecossistemas converte as
áreas marinhas em grandes “viveiros” naturais. Além disso, o litoral é composto
por águas frias ao sul e quentes a nordeste, contribui para a diversidade
biológica e dá abrigo a numerosas espécies de fauna e flora.
Entretanto, só 1,5% da zona marítima brasileira
está sob alguma figura de proteção, ressalta a organização. Nesse contexto,
assegurar a soberania nacional sobre as águas jurisdicionais ainda é um grande
desafio político e militar. Em março, cerca de 15 mil militares e 250
embarcações e aeronaves da Marinha brasileira participaram da Operação Amazônia
Azul, a maior já realizada em suas águas patrimoniais.
“Esta foi uma oportunidade de capacitação para
garantir a segurança da navegação, a repressão a crimes e o patrulhamento em
alto mar. A missão abrangeu toda a extensão territorial do Brasil”, disse à IPS
o capitão de corveta Thales da Silva Barroso Alves, comandante de um dos três
patrulheiros oceânicos que o país possui para monitorar a Amazônia Azul.
Essas embarcações fiscalizam a muito extensa costa
em “áreas de grande interesse econômico, exploração e acidentes. A pesca ilegal
também é recorrente”, ressaltou Thales. O capitão afirmou que a extração dos
recursos do mar deve ser feita de forma “consciente e sustentável”, com a
finalidade de preservar a biodiversidade.
O cientista político Figueiredo compartilha desse
ponto de vista. “Defender a Amazônia Azul passa por nossa capacidade de
desenvolver meios técnico-científicos para proteger a biodiversidade nessa área
tão extensa”, enfatizou.
Fonte: ENVOLVERDE
Nenhum comentário:
Postar um comentário