Planejamento urbano e transporte
interferem na prática de atividade física e impactam na saúde.
Chegar mais rápido ao se deslocar pela Região
Metropolitana de São Paulo (RMSP) e ao mesmo tempo praticar atividade física
pode ser possível se houver alterações nos meios de transporte para o
deslocamento e no planejamento urbano. Apenas a combinação de mais viagens
curtas e uso de transporte público serão capazes de influenciar a saúde da
população, reduzindo tanto o tempo total dos deslocamentos e o tempo “parado”
e, ao mesmo tempo, aumentando a prática de atividade física associada às
viagens cotidianas.
Transporte e planejamento urbano interferem na
prática de atividade física.
A análise foi feita pelos pesquisadores Thiago
Hérick de Sá, Carlos Augusto Monteiro e Diana Parra do Núcleo de Pesquisas
Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Faculdade de Saúde Pública da
USP. O estudo avaliou o potencial impacto de cenários alternativos de
transporte e planejamento urbano na RMSP sobre a prática de atividade física,
sobre o tempo não ativo e sobre o tempo total acumulado pela população em seus
deslocamentos diários.
O tempo total de qualquer viagem pode ser dividido
entre a parte que foi feita de forma ativa, comumente a pé ou de bicicleta, e
aquela não ativa, de pé ou sentado. “Quando você sai de casa e pega um ônibus,
parte dessa viagem é ativa porque você andou até o ponto. O período dentro do
transporte público é não ativo, sentado ou de pé. Já dentro do carro, por
exemplo, este tempo não ativo será sentado, invariavelmente”, explica Thiago.
Os pesquisadores incluíram a análise do tempo não
ativo durante os deslocamentos porque algumas pesquisas sugerem que o excesso
de tempo sentado ao longo do dia pode influenciar na saúde. “O tempo não ativo
não é exatamente igual ao tempo sentado, mas ele nos fornece uma noção sobre o
tempo sentado no contexto dos deslocamentos. Passar muito tempo sentado pode
trazer prejuízos à saúde, mesmo que a pessoa pratique atividade física
regularmente”, alerta Thiago.
Dados
Para a construção dos cenários, o estudo se baseou nos dados da pesquisa “Origem e Destino da Região Metropolitana de São Paulo de 2007”, realizada a cada dez anos pelo Metrô de São Paulo. A análise é voltada à população adulta e economicamente ativa, de 18 a 60 anos, da RMSP.
De acordo com o pesquisador, atualmente, a
distribuição das viagens na RMSP é de, aproximadamente, um terço em veículos
particulares, um terço em transporte público e um terço em forma ativa — a
pé e de bicicleta. “Na Região Metropolitana, há uma distribuição desigual entre
a oferta de trabalho e o local onde as pessoas vivem, obrigando-as a se
deslocar grandes distâncias e a fazer viagens muito longas todos os dias”.
A partir desses dados, foram construídos três
cenários diferentes de acordo com substituições nos modos de transporte das
pessoas e no número de viagens longas que elas precisam fazer, e avaliado o
efeito de cada uma dessas alterações sobre o tempo total das viagens, o tempo
ativo e o tempo não ativo.
Cenários
Na primeira projeção do estudo, os pesquisadores analisaram a troca das viagens curtas (inferiores a mil metros) motorizadas —veículos individuais ou transporte público — por caminhada. “Hoje, o tempo médio acumulado de viagem na RMSP é de 86,4 minutos por habitante para o subgrupo estudado, dos quais, 19,4 minutos se dá de forma ativa e 67 minutos, não ativa. Quando a gente substitui todas as viagens curtas motorizadas por caminhada, nada muda em relação à diminuição do tempo gasto de deslocamento (86,2 minutos) ou de tempo ativo (19,6 minutos) e não ativo (66,4 minutos). Se uma pessoa que vai à padaria de carro passa a ir caminhando, ela terá ganhos enormes para a sua saúde. Mas o impacto positivo desta alteração sobre os determinantes da saúde da população é baixo”, analisa Thiago.
Cenário ideal inclui transporte público de
qualidade e reorganização da RMSP.
No cenário dois, os deslocamentos mais longos, com
mais de mil metros, feitos por veículos motorizados individuais foram
substituídos por transporte público. O resultado mostrou que o tempo médio
acumulado de viagem aumentou para 100,4 minutos e o tempo não ativo passou para
74 minutos e 26,3 minutos de tempo ativo.
“O deslocamento ativo médio populacional aumentou
sete minutos, o que é ótimo, mas o problema é que o tempo de viagem e o não
ativo também foi maior. Por mais que o aumento da atividade física nos
deslocamentos seja algo positivo, não adianta as pessoas fazerem mais atividade
física gastando ainda mais tempo nos deslocamentos do dia a dia”, ressalta o
pesquisador.
O cenário três combina os cenários um e dois, mas
nessa projeção haveria uma mudança na Região Metropolitana de São Paulo: o
arranjo urbano seria alterado de modo a reduzir a necessidade de viagens
longas. Por exemplo, os locais de trabalho das pessoas seriam próximos de suas
residências e a distribuição dos equipamentos e serviços públicos na RMSP seria
descentralizada.
Assim, metade das viagens longas foi substituída
por viagens curtas e os deslocamentos seriam feitas apenas por transporte
público ou a pé. O resultado apontou uma queda brusca no tempo de viagem para
52,9 minutos e no tempo não ativo para 26,2 minutos, com a manutenção do tempo
ativo em torno de 26 minutos.
“Nesse cenário, conseguimos ter mais atividade
física nos deslocamentos (tempo ativo) que é fundamental, além de ser uma
possível meta do desenvolvimento humano sustentável para as cidades nas
próximas décadas Além disso, vimos uma diminuição em dois problemas, gastar
muito tempo nos deslocamentos e, pior, muito tempo inativo”, avalia Thiago.
Segundo o pesquisador, a construção desses cenários
é utópica, mas não impossível. “Tanto que há várias cidades do mundo
perseguindo esses cenários. Helsinki, na Finlândia, pretende chegar a uma
realidade próxima disto em dez anos. É fundamental uma combinação de
investimento e valorização das formas ativas de deslocamento, como caminhada e
bicicleta, além do fortalecimento do transporte público, deixando-o mais
capilarizado, democrático, confortável e seguro. Além disso, precisamos de uma
reorganização urgente no planejamento urbano da região, porque apenas melhorias
no transporte não vão dar conta de resolver o problema da Região Metropolitana
de São Paulo”.
Foto: Marcos Santos / USP Imagens
Fonte: Agência USP de Notícias
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