Os
bairros pobres são uma armadilha mortal para a infância.
Crianças a caminho da escola em Kibera, a maior
favela de Nairóbi. Foto: Save the Children
Por Valentina Ieri, da IPS –
Nações Unidas, 11/5/2015 – A brecha de
sobrevivência urbana, alimentada pela crescente desigualdade entre ricos e
pobres, tanto nos países do Norte industrial quanto do Sul em desenvolvimento,
determina se milhões de meninos e meninas viverão ou morrerão antes de
completarem cinco anos. O informe anual da organização internacional Save
the Children intitulado Estado das mães do mundo 2015, analisou 179
países e concluiu que, no caso “dos bebês nascidos na grande cidade, sobrevivem
os mais ricos”.
Pela primeira vez na história, mais famílias se
mudam do campo para as cidades para dar aos seus filhos uma vida melhor, disse
Carolyn Miles, presidente de Save the Children, na apresentação do
informe na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova Iorque. Mas esse
deslocamento da sociedade rural para a urbana aumentou as desigualdades dentro
das cidades, acrescentou.
“Nosso informe revela uma devastadora brecha na
sobrevivência infantil entre ricos e pobres, que conta uma história de duas
cidades entre comunidades urbanas de todo o mundo, incluídos os Estados
Unidos”, afirmou Miles.
O trabalho calcula que 54% da população mundial
vivem em zonas urbanas, e que até 2050 essa proporção será de 66%, sobretudo na
Ásia e África. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que quase um bilhão
de pessoas vivem em favelas urbanas, nos assentamentos informais, nas ruas, sob
as pontes e ao longo das vias férreas.
Rizell, de 17 anos, e seu bebê de três semanas vivem
sob uma ponte em San Dionisio, na Indonésia. Foto: Save the Children.
As mulheres que vivem nas cidades podem ter um
acesso mais fácil à atenção primária da saúde, incluindo os hospitais, mas
muitos governos não conseguiram seguir o ritmo desse rápido crescimento urbano.
Um terço de todos os residentes urbanos, mais de 860 milhões de pessoas, vive
em favelas onde há escassez de água potável e saneamento, além de uma
generalizada desnutrição.
Apesar dos avanços obtidos em todo o mundo na
redução da mortalidade urbana nos menores de cinco anos, a brecha de
sobrevivência entre as crianças ricas e pobres das cidades cresce mais
rapidamente do que nas zonas rurais.
Na maioria dos países em desenvolvimento
pesquisados a população infantil correspondente aos 20% mais pobres da escala
socioeconômica tem o dobro de probabilidade de morrer do que as crianças dos
20% mais ricos. Em algumas cidades essa disparidade é muito maior.
Robert Clay, vice-presidente de saúde e nutrição da
Save the Children, explicou que os pobres urbanos são mais transitórios,
já que tendem a ter empregos e condições de vida mais instáveis. No meio rural,
muita gente conta com terra e alimentos, pelo menos, bem como um sistema de
apoio comunitário mais sólido.
“Nas zonas urbanas isso não existe. As cidades
estão superlotadas por muitos grupos étnicos que convivem, por isso é um pouco
mais difícil a integração, a comunicação e a geração de confiança. A população
oculta é a mais problemática de se alcançar”, apontou Clay à IPS. Acrescentou
que a falta de dados complica o acesso de organizações humanitárias, como Save
the Children, ou dos governos nacionais e municipais a essas comunidades
marginalizadas.
Os 10 países em desenvolvimento com maior brecha de
sobrevivência infantil são Bangladesh, Camboja, Gana, Índia, Quênia,
Madagascar, Nigéria, Peru, Ruanda e Vietnã. Segundo o índice materno de 2015,
baseado nos critérios de saúde materna, bem-estar infantil, nível educacional,
situação econômica e situação política feminina, a Save the Children
conclui que as condições são dramáticas para as mães e os filhos desses 10
países pior qualificados, dos quais oito ficam na África central e ocidental.
Segundo Miles, “em média, nesses países uma em cada
30 mulheres morre por causas relacionadas com a gravidez, e uma em cada oito
crianças morre antes de completar os cinco anos”.
O rio que passa pela favela de Kroo Bay, em Serra
Leoa. Foto: Save the Children.
Em nível mundial, baixaram as taxas de mortalidade
dos menores de cinco anos, de 90 para 46 mortes para cada mil nascidos vivos.
Mas, estes números ocultam o fato de a sobrevivência infantil estar
estreitamente ligada à posição econômica da família, e deixam de lado as
condições de pobreza e a vida insalubre dos bairros marginalizados, segundo a
organização.
O informe da Save the Children também revela
algumas boas soluções aplicadas pelos governos para reduzir a mortalidade
materna e infantil e fechar a brecha da iniquidade entre crianças ricas e
pobres em seus países. Os melhores casos são registrados nas capitais de
Etiópia, Egito, Guatemala, Uganda, Filipinas e Camboja.
“A Etiópia, onde recentemente foi acelerado o
crescimento econômico, as soluções foram no sentido de desenvolver políticas de
focalização eficazes, e deu atenção médica preventiva e curativa acessível às
mães e às crianças pobres”, destacou Clay. “A Etiópia deve ser um modelo para
outros países, no que diz respeito ao acesso às comunidades nos bairros pobres,
de maneira que a população local não seja excluída”, acrescentou. Segundo Clay,
a contratação de trabalhadores de extensão urbana, que podem ir às localidades,
falar o idioma das pessoas que vivem ali e entender sua situação e suas
necessidades, é vital.
Miles disse que sua organização exorta todos os
governos a aplicarem medidas para investir na atenção sanitária materna e
infantil universal, desenvolver planos urbanísticos intersetoriais e reduzir as
desvantagens urbanas, bem como para priorizar os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) da Agenda de desenvolvimento pós-2015.
Fonte: ENVOLVERDE
Nenhum comentário:
Postar um comentário