Desenfreado aumento de
desigualdade e concentração de riqueza.
por
Roberto Savio*
Uma menina come um sanduíche no novo abrigo de sua
família, no acampamento Proteção dos Civis III, perto da Casa da ONU, em Juba,
capital do Sudão do Sul. Foto: UN Photo/JC McIlwaine.
São Salvador, Bahamas, janeiro/2015 – Diariamente
recebemos dados surpreendentes, que deveriam gerar alvoroço e desencadear
ações. No entanto, a vida transcorre como se esses dados nada tivessem a ver
com nossas vidas.
Um bom exemplo é a mudança climática. Bem sabemos
que nosso tempo está acabando. É nada menos do que nosso planeta que está em
jogo. Mas algumas grandes companhias energéticas são capazes de escapulir, em
meio ao silêncio ensurdecedor da humanidade.
Recentemente, recebemos outros dois dados
surpreendentes. Desde o começo da crise financeira, em 2008, os grandes bancos
pagaram a assombrosa quantia de US$ 178 bilhões em multas.
As novas gerações enfrentam um destino muito pior
do que o de seus pais. Atualmente, 79% da população mundial possui apenas 5,5%
da riqueza mundial. Sua participação diminuiu em US$ 750 bilhões em quatro
anos.
Os bancos norte-americanos pagaram US$ 115 bilhões
e os europeus US$ 63 bilhões. Mas, como escreve o analista Sital Patel, do
Market Watch, essas penalizações são consideradas parte do custo de existirem
negócios. Em parte, porque nenhum banqueiro é incriminado a título pessoal.
Outros dados arrepiantes procedem da Oxfam, uma
organização não governamental com sede na Grã-Bretanha, que atua como uma
confederação internacional integrada por 17 organizações que trabalham em cerca
de 90 países na busca de soluções para a pobreza e a injustiça.
Se nada for feito, em dois anos o 1% mais rico da
população mundial possuirá uma riqueza maior do que a dos restantes 99%. A uma
velocidade sem precedentes, os mais ricos estão ficando ainda mais ricos e os
pobres mais pobres, afirma a Oxfam.
No último ano, o que este 1% possui aumentou de 44%
para 48% da riqueza mundial. Portanto, em 2016 terão mais do que a soma dos 99%
restantes.
Os 80 multimilionários que encabeçam a lista
aumentaram sua riqueza em US$ 600 bilhões nos últimos quatro anos, uma
quantidade equivalente à soma dos orçamentos de11 países do mundo com população
coletiva de 2,3 bilhões de pessoas.
Essa enorme e rápida concentração tem um impacto
mundial. O desempenho de 40% dos jovens em vários países é o alerta desta
sucção ao vazio.
As novas gerações enfrentam um destino muito pior
do que o de seus pais. Atualmente, 79% da população mundial possui apenas 5,5%
da riqueza mundial. Sua participação diminuiu em US$ 750 bilhões em quatro
anos.
Pode ser que passe algum tempo até esses números
entrarem na consciência coletiva. Entretanto, o certo é apostar que não
provocarão nenhuma reação, como no caso da mudança climática.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, é o
único líder mundial que anunciou um aumento de impostos para os ricos, que
provavelmente será rejeitado pela maioria legislativa do opositor e direitista
Partido Republicano.
Podemos considerar o ex-presidente norte-americano
Ronald Reagan (1981-1989) como um precursor desses tempos, com sua famosa
declaração: os ricos produzem riqueza, os pobres geram pobreza, por isso se
deve permitir que os ricos paguem menos impostos.
De fato, o Instituto Americano de Tributação e
Política Econômica diz, em seu informe divulgado há alguns dias, que em 2015 os
impostos a serem pagos pela quinta parte mais pobre dos norte-americanos
equivalerão a 10,9% de sua renda, o que será pago pela quinta parte do centro
equivalerá a 9,4%, e o famoso 1% pagará tão somente 5,4%.
Agora, 20% dos multimilionários mais ricos estão
vinculados ao setor financeiro. Deve-se recordar que este cresce mais do que a
economia real e tem apenas regulamentações nacionais. Em nível mundial, as
finanças são a única atividade que está livre de um organismo internacional de
regulamentação, ao contrário do trabalho, das comunicações, etc.
Em nível nacional existem tíbias tentativas para
regular as finanças. Entretanto, vejamos o que ocorre nos Estados Unidos.
A nova regulamentação, chamada Dodd-Frank, é tão
débil que não chegou a restaurar a divisão entre os bancos de depósito, onde o
dinheiro das contas dos cidadãos não pode ser usado em especulações, e os
bancos de investimentos, especializados em especulações financeiras.
Essa separação foi abolida na administração de Bill
Clinton (1993-2001), e a decisão foi considerada o fim do sistema bancário a
serviço da economia real.
De todo modo, os grupos de pressão de Wall Street
estão tentando diluir, pouco a pouco, a lei Dodd-Frank.
Há uma certa esquizofrenia quando observamos as
relações entre o capital e a política. A Suprema Corte de Justiça dos Estados
Unidos eliminou todo limite para as contribuições das empresas às eleições
políticas, declarando que as companhias têm os mesmos direitos que os
indivíduos.
Segundo o jornal The New York Times do dia
16 deste mês, em 2013 as contribuições privadas para o sistema político foram
de US$ 1,2 bilhão. A última eleição custou US$ 2 bilhões.
A democracia garante que todos os cidadãos podem
ser candidatos aos cargos públicos. Mas atualmente não se pode postular o cargo
de senador sem contar com pelo menos US$ 40 milhões.
Os bancos não são responsáveis apenas pela
corrupção do sistema político e por atividades ilegais. Também são responsáveis
por privilegiar os grandes investimentos e restringir o crédito para as
pequenas e médias empresas.
Os esforços do presidente do Banco Central Europeu,
Mario Draghi, para que os bancos deem crédito às pequenas e médias empresas e a
particulares praticamente não levaram a nada.
Mas uma nova e imaginativa iniciativa provém dos
muito severos banqueiros holandeses. A partir de 2016, se exigirá de todos os
banqueiros da Holanda que prestem juramento: “Juro que vou procurar manter e
promover a confiança no setor financeiro. Que Deus me ajude”. Esta iniciativa
preenche uma lacuna: coloca Deus como o regulador do sistema bancário holandês.
Durante a crise financeira, Lloyd Blankfein,
presidente-executivo do banco de investimento Goldman Sachs, disse que os
banqueiros estavam fazendo a obra de Deus.
Wall Street e a City londrina estão dispostas a
aceitar a ideia de introduzir o juramento.
Provavelmente, somente essa classe de poder
superior poderia mudar o rumo neste mundo de crescente desigualdade e carência
de ética.
Fonte: ENVOLVERDE
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