Desmatamento afeta balanço
hídrico do cerrado e causa erosão.
por Júlio
Bernardes, da Agência USP
Na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da
USP, estudo do engenheiro e pesquisador Paulo Tarso Sanches Oliveira procura
entender os mecanismos dos processos hidrológicos e de erosão do solo no
cerrado brasileiro. A partir das informações obtidas por sensoriamento remoto e
em áreas experimentais, a pesquisa constatou que o desmatamento para
implantação de cultivos agrícolas e atividades pecuárias altera o balanço
hídrico da região e potencializa os efeitos da erosão. O trabalho recomenda que
os dados obtidos sirvam de base para um zoneamento que regule o uso e manejo do
solo.
Estudo usou informações de sensoriamento remoto e
de áreas experimentais.
A pesquisa adotou diferentes escalas de trabalho
(vertentes, bacias hidrográficas e continental), com base em dados
experimentais obtidos em um fragmento de cerrado em Itirapina (interior de São
Paulo), em laboratório e a partir de sensoriamento remoto (imagens de
satélite). “Assim, foram estudados cada componente do balanço hídrico”,
descreve o pesquisador, “tais como a precipitação, precipitação interna [parte
da precipitação que passa pela vegetação e atinge o solo], escoamento pelo
tronco das árvores, interceptação da chuva, evapotranspiração [parcela da água
que evapora mais o uso da água pela vegetação denominado de transpiração],
infiltração, água armazenada no solo, que recarrega o aquífero subterrâneo, e o
escoamento superficial”.
“O balanço hídrico foi avaliado primeiramente para
toda a região do cerrado a partir de dados de sensoriamento remoto no período
de 2003 a 2010, que permitiram quantificar o aumento e diminuição de água na
superfície terrestre e visualizar espacialmente as regiões mais afetadas”, diz
Oliveira.
A estimativa dos valores médios de evapotranspiração
variou entre 1,91 a 2,60 milímetros diários (mm d-1) para a estação seca e
chuvosa, respectivamente. Os valores de interceptação da chuva variam de 4% a
20% e o escoamento pelo tronco das árvores foi de aproximadamente 1% da
precipitação total no cerrado. “O coeficiente de escoamento superficial foi
menor que 1% nas parcelas de cerrado e o desmatamento tem o potencial de
aumentar em ate 20 vezes esse valor”, relata. “Neste estudo também foi
desenvolvido um modelo regional para estimativa da evapotranspiração a partir
de dados de sensoriamento remoto, que estima a evapotranspiração de forma
satisfatória a cada 16 dias, com uma resolução espacial de 250 metros (m)”.
Erosão
A pesquisa aponta que no cerrado os valores de
escoamento superficial, erosão do solo e o fator C da Equação Universal de
perda do Solo (USLE), que fornece uma estimativa das perdas, variam de acordo
com as estações do ano. “Os maiores valores do fator C foram encontrados no
verão e outono”, ressalta. “O uso do solo é considerado um dos principais
fatores que controlam o processo de erosão hídrica. Os resultados sugerem que
mudanças no uso do solo, como por exemplo a substituição da vegetação original
do cerrado pelos cultivos agrícolas, têm o potencial de intensificar a erosão do
solo em mais 10 vezes”.
Localizado na porção central do Brasil, o cerrado é
o segundo maior bioma da América do Sul e ocupa uma área de aproximadamente 2
milhões de quilômetros quadrados (km2), correspondente a 22% do território
nacional e abrange dez das 12 grandes regiões hidrográficas brasileiras. “A
água dessas bacias hidrográficas são cruciais para o abastecimento humano e
dessedentação animal, manutenção de funções ecohidrológicas de sistemas no
cerrado e outros biomas como o pantanal e caatinga, e para o fornecimento de
água para a indústria, agricultura, navegação e turismo”, conta. “Várias usinas
hidroelétricas do Brasil usam águas provenientes da região de cerrado, que
também abriga aquíferos de água subterrânea”.
O pesquisador ressalta que o desflorestamento do
cerrado, motivado pela expansão dos cultivos agrícolas, ocorre mais rapidamente
que na floresta amazônica e pode levar ao desaparecimento do ecossistema nos
próximos anos. “A partir dos dados sobre balanço hídrico e de erosão do solo
seria fundamental a elaboração de um zoneamento para definir as áreas
prioritárias de preservação, as que possuem melhor e pior potencial agrícola ou
de pecuária, as regiões mais vulneráveis a erosão e as que precisam ser
recuperadas”, afirma. “Os resultados obtidos na pesquisa podem fornecer alguns
subsídios para auxiliar neste processo, que levaria alguns anos para ser
concluído”.
A tese de doutorado apresentada no EESC foi
dividida em cinco artigos científicos que contemplam estudos sobre o balanço
hídrico e erosão do solo no Cerrado em diferentes escalas espaciais e
temporais. A pesquisa foi liderada pelo professor Edson Cezar Wendland, do
Departamento de Engenharia Hidráulica e Saneamento. O pesquisador Mark Nearing
foi supervisor do trabalho no período de intercâmbio no United States
Department of Agriculture – Agricultural Research Service (USDA-ARS) e na
University of Arizona (Estados Unidos). Também participaram pesquisadores da
Queens School of Engineering, na University of Bristol (Reino Unido) do Instituto
de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP e o Departamento
de Agronomia da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).
Fonte: Agência USP
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