segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Discriminação e desigualdade fomentam o HIV/aids no Caribe.
por Desmond Brown, da IPS
O pintor Edison Liburd, em Saint John, capital de Antiga e Barbuda. Foto: Desmond Brown/IPS.

Saint John, Antiga e Barbuda, 13/02/2014 – Aos 49 anos, Edison Liburd é um dos pintores mais reconhecidos de Antiga e Barbuda. Mas nem sempre foi centro de atenção. Na verdade, se poderia dizer que era um homem refugiado na clandestinidade. “Estive infectado com o vírus HIV (causador da aids) durante aproximadamente 24 anos. O primeiro exame que fiz foi em fevereiro de 1993, no hospital Allen Pavilion, de Manhattan, em Nova York”, contou à IPS. “Posso recordar esse dia muito claramente. Senti como se a terra desaparecesse debaixo dos meus pés quando recebi o resultado do exame”, acrescentou.

O HIV (síndrome da imunodeficiência adquirida) surgiu pela primeira vez na década de 1980, e agora, mais de 30 anos depois, persiste o estigma associado à enfermidade. Esse foi o principal motivo que levou Liburd a esconder sua condição. “Escondi meu estado por anos da minha família. Contei a alguns amigos, mas a maioria das pessoas nada sabia sobre minha saúde. Era o medo do ostracismo que me impedia de revelá-la”, destacou.

Os soropositivos em Antiga “ainda sofrem insegurança no trabalho. São os primeiros demitidos e os últimos contratados. O estigma e a discriminação continuam altos porque muitos ainda se consideram superiores aos infectados”, pontuou Liburd. “Creio que, quando as pessoas infectadas se empoderam ao assumir as rédeas de sua saúde, desferem um golpe enorme na discriminação. As pessoas começam a vê-las de maneira diferente”, ressaltou.

O Caribe é uma das regiões do mundo mais afetadas por essa doença, com prevalência de HIV de 1% acima das demais regiões fora da África subsaariana. No Caribe, o vírus se concentra sobretudo no entorno social dos homens que praticam sexo com homens, mas a discriminação manteve essa situação oculta e sem reconhecimento. Também existe uma forte incidência entre os usuários de drogas injetáveis, trabalhadores e trabalhadoras sexuais e seus clientes.

O principal modo de transmissão no Caribe é o coito heterossexual sem proteção, mediante pagamento, ou não. Também se acredita que as relações sexuais entre homens são um fator importante em vários países, embora isso seja negado devido ao estigma social. A discriminação que sofrem as pessoas infectadas pelo vírus na região leva à ocultação da pandemia, o que dificulta o acesso de muitos setores da população.

Depois de enfrentar o pior de seus medos, e de ficar internado próximo à morte, Liburd decidiu “lutar contra a discriminação ao incrementar sua capacidade de ajudar os demais em todos os sentidos, com o dom da minha arte e da minha voz nos meios de comunicação, na igreja e outros lugares. Fiquei mais seguro e audacioso na hora de enfrentar oposição”. O artista acrescentou que “fui e continuo sendo, mais do que nunca, uma fonte de inspiração e estímulo para muitos que ouvem minha história”.

A diretora da Rede de HIV/aids de Antiga e Barbuda (Abhan), Eleanor Frederick, afirmou que as pessoas soropositivas têm muitas dificuldades, como, por exemplo, falta de moradia, e, em alguns casos, abandono pelas suas famílias. Também os afetam “estigma, discriminação, escassez de recursos e a marginalização social”, dependendo da comunidade com a qual se identifiquem, como as de trabalhadoras e trabalhadores do sexo, homens que têm sexo com homens, consumidores de drogas ou presos.

“Muita gente reluta em iniciar o tratamento devido aos mitos que existem sobre HIV e aids. Os provedores de saúde, seus companheiros e seus assessores no tratamento podem ajudá-los a entender as barreiras e a superá-las”, ressaltou Frederick à IPS.

A Abhan tem um programa de companheiros que recrutam, supervisionam e mantêm os pacientes no tratamento e se asseguram que cumpram o regime que este implica. Também oferece um pacote completo de serviços, que inclui gestão de cada caso e que busca limitar a conduta sexual de risco e melhorar o funcionamento do sistema imunológico e da saúde em geral.

“O programa oferece serviços de apoio direto de estudantes voluntários especialmente treinados pela Abhan e pela Universidade Americana da Faculdade de Medicina de Antiga, sob a forma de interação social, apoio emocional e supervisão no cumprimento da medicação dos que vivem com HIV/aids”, explicou Frederick. Os países caribenhos têm leis que abordam especificamente o tratamento dos trabalhadores soropositivos, mas estas nem sempre são cumpridas, apontou.

“Em 2012, foi aplicado um programa-piloto. A intenção era fomentar a aplicação e o cumprimento das normas estabelecidas no código de prática da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre HIV/aids e o mundo do trabalho”, afirmou Frederick. Também “a recomendação 200 da OIT, bem como a Política Nacional Tripartite de Antiga e Barbuda, baseada nas normas universais de direitos humanos aplicáveis ao HIV e ao mundo do trabalho”, acrescentou.

Segundo Frederick, “há pessoas que perderam o emprego por sua situação de HIV e a outros foi pedido que fizessem o exame, quando havia suspeita de sua possível infecção”. O HIV deveria ser uma preocupação de todos porque “não discrimina nem conhece fronteiras. A equidade e a justiça social são muito importantes em nossa resposta à epidemia. O HIV é tanto uma doença social e de desenvolvimento quanto médica”, ressaltou.

“Gostaria de animar todos no sentido de ajudarem a melhorar a qualidade de vida das pessoas com HIV e aids e aumentar a compaixão por elas e seus entes queridos mediante a prestação de serviços humanos vitais para as pessoas necessitadas, com base em uma filosofia de apoio sem julgamentos, como a praticada pela Abhan”, enfatizou.


Fonte: ENVOLVERDE

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