PEC 215 será desarquivada.
por
Oswaldo Braga de Souza, do ISA
Presidente da Câmara diz que não pode impedir
recomeço da tramitação do projeto que transfere para Congresso tarefa de
aprovar formalização de Terras Indígenas, Unidades de Conservação e Territórios
Quilombolas.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ),
confirmou na quata-feira (4/2) que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC)
215 será desarquivada. O projeto transfere do governo federal para o Congresso
a última palavra sobre a oficialização de Terras Indígenas (TIs), Unidades de
Conservação e Territórios Quilombolas.
Em reunião com índios Kayapó, ele afirmou que não
poderia impedir o reinício da tramitação da proposta, arquivada no final do ano
passado. Os indígenas exigem que ela seja sepultada definitivamente (saiba
mais).
Qualquer um dos 170 deputados que assinaram o
projeto pode pedir seu desarquivamento. A bancada ruralista apresentou um
requerimento com esse objetivo ontem e, segundo Cunha, o Regimento da Câmara
obriga-o a acatá-lo automaticamente. “Não tenho poder ou competência legal para
acabar com a PEC 215 ou nenhuma outra PEC. Tenho de cumprir o Regimento”,
afirmou o peemedebista.
De acordo com o presidente da Câmara, após o
projeto ser desarquivado, será necessário recriar a Comissão Especial que vai
analisá-lo. Cunha mencionou que há dúvidas sobre os prazos necessários para o
início das atividades do colegiado e o novo trâmite. O deputado informou que
será preciso discutir qual interpretação do Regimento deve prevalecer sobre essa
questão específica.
Por sugestão de parlamentares que participaram do
encontro, Cunha comprometeu-se a facilitar uma reunião entre deputados
ruralistas e socioambientalistas nas próximas semanas para discutir uma
alternativa à PEC.
Na avaliação de Sarney Filho (PV-MA) e Nilto Tatto
(PT-SP), que participaram da conversa com o presidente da Câmara, essa
alternativa poderia ser um projeto para regulamentar a indenização pela terra a
produtores rurais que ocupem áreas indígenas e tenham títulos fundiários válidos.
Ainda não há consenso sobre como isso poderia ser feito. A Constituição
garante, hoje, apenas o pagamento das benfeitorias aos fazendeiros retirados de
TIs.
Kayapós cobraram do presidente da Câmara
arquivamento definitivo da PEC 215. Foto: J. Batista – Agência Câmara.
“Os povos indígenas estão entendendo a PEC 215 como
uma quebra do contrato estabelecido com eles para garantir seus direitos na
Constituição de 1988. Se a PEC seguir tramitando, teremos toda a semana uma
manifestação aqui na Câmara contra o projeto”, advertiu Tatto. O petista
acredita que a análise e aprovação do projeto vão acirrar os conflitos entre
povos indígenas e produtores rurais. “Faremos tudo o que estiver ao nosso
alcance para que a Comissão Especial não seja aberta e não funcione”, disse
Sarney Filho.
Os deputados também pediram à Cunha que ele usasse
de sua influência para aprofundar a discussão sobre a PEC, permitindo que a
sociedade fosse ouvida sobre o assunto. O presidente da Câmara, todavia, apenas
repetiu vagamente que é favorável ao diálogo e ao consenso entre ruralistas e
povos indígenas e tradicionais.
Acordo
Cunha negou que tenha feito um acordo com os
ruralistas para fazer avançar a tramitação do projeto em troca de apoio à sua
eleição para a Presidência da Câmara, ocorrida no fim de semana. A demanda apenas
teria sido apresentada a ele.
O deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS) confirmou, no
entanto, que houve, sim, o entendimento com o peemedebista. “Vamos cobrar do
presidente esse compromisso”, destacou. Ele informou que os ruralistas
pretendem reapresentar o relatório de Osmar Serraglio (PMDB-PR) sobre a PEC e
vão defender a manutenção do parlamentar no cargo de relator. A decisão sobre
este último ponto depende do presidente da Câmara.
Heinze adiantou os outros pontos principais da
agenda ruralista neste início de ano, além da PEC 215: a instalação de uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a Fundação Nacional do Índio
(Funai); a aplicação da Portaria 303/2012 da Advocacia-Geral de União (AGU),
atualmente suspensa e que restringe vários dos direitos indígenas; e a
aprovação do Projeto de Lei (PL) 7.735/2014, que regula o acesso aos recursos
genéticos associados à biodiversidade (a votação do PL foi marcada para a
próxima segunda, 9/2).
“Queremos acabar com a PEC. Não queremos briga com
os brancos, mas eles é que estão caçando briga conosco”, comentou Dotô Takakiri
Kayapó. “Sabemos que estão sendo feitos acordos no Congresso sobre a PEC”,
completou. Ele avaliou que a aprovação do projeto será vista pelos povos
indígenas como um ato de guerra e ressaltou que eles irão se mobilizar contra a
proposta.
Fonte: Instituto Socioambiental
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