sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Nova espécie de peixe é descoberta no Brasil.
por Fundação Grupo Boticário
O Ituglanis boticario vive exclusivamente em cavernas e já está ameaçado de extinção. Local da descoberta deve ser transformado em unidade de conservação.

Uma nova espécie de peixe troglóbio, isto é, que vive exclusivamente em ambientes subterrâneos (como cavernas), foi descoberta na Gruta da Tarimba, em Mambaí (GO), a 500 km de Goiânia. O peixe foi descrito oficialmente em artigo na revista da Sociedade Brasileira de Zoologia e batizado de Ituglanis boticario, em homenagem à Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, instituição que financiou o projeto no qual a espécie foi descoberta.
Fotos: Pedro Rizzato.

De acordo com a professora doutora Maria Elina Bichuette, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), uma das responsáveis pela pesquisa, a homenagem visa a  valorizar o incentivo a projetos de conservação da natureza, que é escasso no Brasil.  “Nosso país tem uma riqueza natural muito grande e temos ecossistemas que estão sendo destruídos antes mesmo de serem conhecidos, por isso é extremamente importante incentivar novas pesquisas”, conta. Ela destaca que o Brasil tem potencial para muitas outras descobertas de espécies troglóbias. “Atualmente temos em torno de 10 a 12 mil cavernas cadastradas, mas podemos chegar a mais de 100 mil”, afirma.

A diretora executiva da Fundação Grupo Boticário, Malu Nunes, acredita que o apoio a iniciativas de conservação da natureza também auxilia na elaboração e melhoria das políticas públicas. “O levantamento de dados relevantes oferece subsídios para que o governo possa tomar decisões importantes para proteção da biodiversidade, como a definição do status de conservação de espécies da fauna e da flora, a criação de Unidades de Conservação e a gestão adequada dessas áreas”, ressalta Malu.

O projeto que descobriu a nova espécie é um exemplo dessa integração entre pesquisa científica e proposição de política pública. Pedro Pereira Rizzato, doutorando da Universidade de São Paulo (USP) e integrante da equipe de pesquisa, explica que a região da Tarimba foi identificada como um hotspot de fauna subterrânea brasileira. Os hotspots são áreas que concentram alto nível de biodiversidade – com parcela significativa dela sendo endêmica – e que já perderam mais de 75% de sua vegetação original. “Com a análise que fizemos, percebemos a importância da conservação da região e enviamos uma carta ao ICMBio propondo a criação de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral para proteger o local”, explica. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) é o órgão do governo brasileiro responsável pela gestão das unidades de conservação federais, como os parques nacionais.

Ameaças à nova espécie

O novo peixe já pode ser considerado ameaçado de extinção por conta não só do seu endemismo (ocorre apenas na região da Gruta da Tarimba) como também por causa da degradação do ambiente no entorno da caverna, que vem sendo explorado recentemente para dar lugar a pastagens. “A deterioração diminui a capacidade desse ambiente de drenar a água para dentro da caverna, o que reduz a quantidade de alimento disponível no seu interior, prejudicando as espécies que vivem ali”, afirma Maria Elina. Além disso, a urina do gado aumenta a concentração de ureia e amônia na água, o que pode chegar até a matar os peixes.
A pesquisadora destaca ainda que o Ituglanis boticario possui papel biológico muito importante na caverna por ser um predador de topo de cadeia. “Ele é carnívoro, alimentando-se de invertebrados como larvas e besouros. Se você retira-lo da caverna, criará grande desequilíbrio, pois eles exercem controle populacional de diversasespécies”, explica. Segundo a pesquisadora, nas duas grutas onde foi encontrada a novaespécie (Tarimba e Nova Esperança), o peixe reina soberano. “Não existem outros tipos de peixes ali, por isso se o Ituglanis não for conservado, todo o ecossistema estará em risco e poderá será perdido”, conclui.

Características da nova espécie

Ituglanis boticário, que não passa dos 10 centímetros, possui bigodes alongados, olhos pequenos e pouca pigmentação, sendo que seu corpo geralmente apresenta cores mais claras. Uma característica bem própria da espécie é a presença de odontoides, pequenos dentes bem desenvolvidos localizados próximos às brânquias e que são utilizados para a fixação do animal, evitando que seja levado em correntezas.

A nova espécie pertence ao gênero Ituglanis, o qual concentra peixes que vivem apenas em cavernas. Diferente dos peixes que ocorrem em regiões abertas, como rios e mares, que procuram ficar mais entocados, o Ituglanis boticario, assim como as demaisespécies do gênero, está sempre em atividade, explorando o ambiente em que vive. “Isso acontece por terem menos alimento dentro das cavernas, então eles precisam procurar mais”, explica Rizzato. Além disso, a visão dos peixes desse gênero é menos desenvolvida do que em outras espécies. Por outro lado, os peixes desse gênero, incluindo a nova espécie, têm compensação sensorial, percebendo melhor cheiros e possuem canais sensoriais na pele que permitem estar alertas para qualquer distúrbio na água.


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