2015 será um ano decisivo para o
desenvolvimento? A ONU diz que sim.
por
Thalif Deen, da IPS
O secretário-geral Ban Ki-moon no Fórum Econômico
Mundial em Davos, na Suíça, em 23 de janeiro. Foto: Mark Garten/ONU.
Nações Unidas, 24/2/2015 – A Organização das Nações
Unidas (ONU) não deixa de promover 2015 como um ano decisivo em vários setores
fundamentais, como os fundos para o Sul em desenvolvimento, a mudança
climática, o desenvolvimento sustentável, a redução do risco de desastres
naturais e a proliferação nuclear. Ao mesmo tempo este ano o fórum mundial
comemora 70 anos, o vigésimo da histórica Conferência de Pequim sobre a Mulher.
Em um documento intitulado O Caminho Para a
Dignidade em 2030: O Fim da Pobreza, a Transformação de Todas as Vidas e a
Proteção do Planeta, divulgado em dezembro, o secretário-geral da ONU, Ban
Ki-moon, declarou que 2015 é “o momento para a ação mundial”.
Entre as próximas reuniões estão a terceira
conferência mundial sobre Redução do Risco de Desastres, em março, em Sendai,
no Japão, o exame quinquenal do tratado de Não Proliferação Nuclear, em abril e
maio, em Nova York, e a terceira conferência internacional sobre Financiamento
para o Desenvolvimento, em julho, em Adis Abeba.
Ban destacou três prioridades em declarações aos
meios de comunicação este mês. “Temos de fazer o máximo esforço para alcançar
as metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM)”, cujo prazo vence
no final deste ano, afirmou. Os Estados membros trabalham com afinco para dar
forma à agenda de
desenvolvimento pós-2015 antes de setembro, acrescentou.
A ONU será sede de uma cúpula de governantes de
todo o mundo, entre 25 e 27 de setembro, na qual está previsto que os líderes
“adotem e declarem como sua visão para o mundo, apontando para 2030, os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”, disse Ban Ki-moon.
Em dezembro deste ano “devemos contar com um acordo
sobre mudança climática que seja universal e significativo”, que será adotado
em Paris durante a 21ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações
Unidas sobre a Mudança Climática, acrescentou o secretário-geral.
Em cada um desses “marcos vamos ser ambiciosos para
acabar com a pobreza, reduzir a desigualdade e aproveitar as oportunidades que
acompanham o desafio da mudança climática”, afirmou Ban. Quanto aos 70 anos da
ONU, o aniversário será “um momento importante para refletir seriamente sobre
nossos êxitos e retrocessos”, reconheceu.
Entretanto, Jim Paul, diretor do Global Policy
Forum, uma organização independente cuja sede fica em Nova York, que analisa as
políticas das Nações Unidas, disse à IPS desconfiar do espalhafato político que
existe em torno das próximas conferências. A ONU “apregoa os encontros mundiais
de 2015 como eventos revolucionários, mas as expectativas do mundo real estão
atrasadas diante do discurso do secretário-geral e de sua equipe”, afirmou.
Segundo Paul, há vários temas a serem considerados.
Enquanto as cúpulas da ONU abordam alguns dos problemas mais urgentes do mundo,
países poderosos, como os Estados Unidos, em geral tentam enfraquecer essas
reuniões e impedir que tenham consequências de peso. Essa tendência já era
visível nos anos 1990, a década dourada das cúpulas da ONU, quando Washington
começou a insistir que as mesmas eram muito “caras” e tratavam de tudo,
acrescentou.
“Essa política atingiu sua forma mais extrema no
período anterior à cúpula de 2005, quando os Estados Unidos insistiram em uma
reformulação total e de última hora do texto acordado, mas pode-se encontrar em
muitos outros casos, antes e depois, afirmou Paul, acrescentando que os Estados
poderosos, tendo os Estados Unidos na primeira fila, não gostam que as decisões
da ONU os limitem.
Em segundo lugar, existe o problema da falta de
obrigatoriedade das decisões adotadas nessas reuniões internacionais, disse
Paul. As declarações finais das mesmas costumam incluir grandiosas aspirações,
e em algumas ocasiões usa-se a palavra “vinculante”, mas todos os participantes
sabem que o resultado continuará sendo um desejo e não uma política
obrigatória, acrescentou.
Isso gera a desconfiança dos diplomatas e
especialmente das pessoas comuns. Os governos costumam culpar a ONU por sua
conduta supostamente irresponsável, algo do que eles mesmos costumam ser
responsáveis, destacou Paul.
Em uma entrevista coletiva no dia 15 de janeiro, o
presidente da Assembleia Geral da ONU, o ugandense Sam Kutesa, disse que, 70
anos depois da criação da ONU, “temos a oportunidade verdadeiramente histórica
de acordar um programa inspirador que possa energizar a comunidade
internacional, os governos de todas as partes e os cidadãos do mundo”.
Chee Yoke Ling, diretora de programas da Rede do
Terceiro Mundo, com sede em Penang, na Malásia, disse à IPS que a incorporação
dos ODS é uma parte importante da agenda de desenvolvimento pós-2015.
Mas
“devemos colocar a agenda econômica como uma prioridade na Cúpula de
desenvolvimento”, ressaltou. A instabilidade financeira “continuou pendente
diante de nós, enquanto os grandes países desenvolvidos impõem cada vez mais
normas comerciais contra as pessoas e contra o desenvolvimento nos acordos
bilaterais e plurilaterais, como o Acordo de Associação Transpacífico”, afirmou
Ling.
Segundo a ativista, as demandas judiciais “por
investidores transnacionais contra governos nacionais por centenas de milhões
de dólares em virtude de acordos bilaterais de investimento provocou protestos
em muitos países, e alguns governos de nações em desenvolvimento modificaram e
inclusive cancelaram esses tratados manifestamente injustos”.
A conferência de Adis Abeba é crucial para abordar
várias questões financeiras e econômicas fundamentais, afirmou Chee. Sem
reformas estruturais que respeitem o espaço normativo nacional e garantam a
estabilidade, o desenvolvimento sustentável continuará sendo difícil de
alcançar, ressaltou.
Para Paul, os Estados Unidos, por serem o país
maior e mais rico, tem a inclinação mais pronunciada de trabalhar segundo seus
próprios interesses e não em um processo de consulta amplo. A criação de uma
ordem econômica justa e estável regida pelos ODS parece quase impossível em uma
economia mundial com tropeços e cada vez maior desigualdade. Paul se pergunta
se os oligarcas do mundo cederão seu poder e sua renda.
Isso significa que as cúpulas da ONU em 2015 serão
inúteis? Não necessariamente. “Saber que não podemos esperar um milagre talvez
seja uma maneira de pensar mais realista sobre o que se pode e o que não se
pode conseguir”, explicou Paul. “Acima de tudo, há uma recordação de que os
Estados do mundo atuam, como de costume, de maneira irresponsável. E que
precisamos de um mundo que funcione muito melhor se temos que sobreviver às
ameaças e aos desafios do século 21”, concluiu Paul.
Fonte: ENVOLVERDE
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