E atrás da cortina na crise da
energia?
por
Washington Novaes*
Que vai o Brasil fazer nas áreas de petróleo e
energia em geral, com o mundo em rebuliço e nós aqui diante de tantas
incógnitas, recheadas por escândalos financeiros, obras inacabadas, falta de
recursos e necessidade de contingenciar gastos governamentais?
No recém-realizado Fórum de Davos, onde líderes do
pensamento econômico mundial discutiram o papel da energia na atual
transformação do modelo de crescimento planetário, chegou-se a conclusões
importantes. Uma delas é sobre as consequências da queda do preço do petróleo
no panorama global. As análises – disseram os líderes – devem soar como uma
trombeta de alarme (The Huffington Post, 29/1) para empresas que exploram
petróleo. Com o encarecimento de projetos de exploração de petróleo no Ártico, em
águas profundas e em outras áreas, com o preço do petróleo em baixa e já com
subsídios cortados em muitos lugares, os combustíveis fósseis vão perdendo
terreno para as energias eólica e solar, por exemplo, com seus custos em baixa.
Por isso mesmo, em 2014 o índice da agência S&P 500 para essa área dos
combustíveis fósseis caiu 9,5%.
E a tendência continuará de alta para as
renováveis.
Não se trata de discussão acadêmica, disseram os debatedores. A eólica e a solar não são mais “tecnologias marginais”. Em 2014 os investimentos nessas áreas chegaram a US$ 312 bilhões, 16% mais que em 2013. Até países do Oriente Médio, que sempre investiram pesado no petróleo, estão ingressando na energia solar.
Com esse mesmo panorama e questões cada vez mais
problemáticas na área do clima, grandes corporações mundiais estão ingressando
no chamado “mercado mundial do baixo carbono”, porque acham as transformações
inevitáveis. Em Davos, mil dessas empresas pediram uma manifestação
intergovernamental sobre a viabilidade de o mundo caminhar para emissão zero de
poluentes em 2050, como recomendam cientistas para evitar que a temperatura
planetária vá além de 2 graus Celsius. E manifestaram, muitas dessas
corporações, que a estratégia de eliminação de poluentes e busca de energias renováveis,
ao lado da agricultura e do transporte adequados, são e serão contribuições
decisivas para o “desenvolvimento sustentável”, para a segurança nos campos da
alimentação e da água, assim como da saúde pública.
Não por acaso, discutem-se hoje em muitos fóruns,
como The Global Calculator (BBCNews, 28/1), previsões de que em 2050 centenas
de milhões de carros elétricos estarão circulando no mundo; e de que o dióxido
de carbono por unidade de eletricidade precisará cair pelo menos 90%. E o
consumidor em geral precisará mudar seus formatos de alimentação ricos em
vegetais e carnes.
Na revista New Scientist (15/11/14), o estudioso
Tim Ratcliffe prevê um declínio de US$ 30 bilhões por ano nos investimentos em
energias fósseis, enquanto os investimentos em energia de baixo carbono
precisarão aumentar em US$ 147 bilhões, assim como em US$ 100 bilhões os da
área de eficiência energética. Outro estudo, de John Dyer (news.vice.com,
1.º/1/15), lembra que a baixa do preço do petróleo, se favorece os Estados
Unidos (já beneficiados pelo uso do gás de xisto), “empobrece a Rússia, a
Venezuela e outros países”, com cotações que já estiveram em US$ 100 o barril
agora reduzidas à metade. Não por acaso, o valor do rublo caiu 50%, já que o
petróleo contribui com 30% para o PIB russo. A participação do petróleo na
demanda de energia no mundo foi de 31% em 2012 e pode ter chegado a 48% em
2014. Mas os investimentos em energias limpas, segundo a Bloomberg, aumentaram
16% em 2014. Na solar e na eólica o crescimento será de 10% este ano.
E não param de surgir questões. Estudo do governo
dos EUA, mencionado por Justin Gillis (The New York Times, 28/1) sustenta que
as nações ocidentais deveriam também rever suas políticas de energia baseadas
no uso em larga escala de vegetais como combustíveis. A conversão para
biocombustíveis seria “ineficiente” e não atenderia a parcela importante da
demanda mundial. Além disso, implica o uso de vastas extensões de terras
férteis que poderiam aumentar a oferta mundial de alimentos. Energia eólica e
energia solar seriam alternativas melhores.
Chega-se perto do Brasil. Texto do deputado Arnaldo
Jardim (29/1) sustenta o contrário, ao defender o nosso setor sucroalcooleiro –
que tem estado em crise com a contenção de seus preços e a não ampliação de sua
participação nos combustíveis. Foram extintos, com o fechamento de 60 usinas e
a recuperação judicial de 66, nada menos que 300 mil postos de trabalho –
embora o etanol seja “ambientalmente correto e economicamente viável”. Tudo
está em revisão agora. Mas já em 2014 o setor forneceu 132,9 bilhões de litros
de combustíveis (mais 5,5% em relação a 2013), garantiu a adição do etanol à
gasolina com 44,2 bilhões de litros (mais 7,1%) e 13 bilhões de litros de
etanol hidratado (mais 10,4%). Mudanças na mistura poderiam adicionar 1,3
bilhão de litros de álcool anidro – sem falar na possibilidade de geração de
energia a partir da biomassa da cana: em 2014 ela já contribuiu, no setor
elétrico, com quase 21 mil GWh, ou 18% mais que em 2013.
E por aí se ingressa de novo na discussão sobre a
nossa matriz energética. Qual é nossa estratégia diante das questões globais na
área do petróleo e com a redução dos preços? Que vamos fazer no pré-sal? Na
nossa matriz de combustíveis para veículos e em suas ligações com os problemas
do clima? Vamos ouvir o que o mundo diz sobre a energia eólica? Chegamos a
4.708 MW no final de 2014, que poderiam ser mais com a instalação de linhas de
transmissão e maior investimento; mas espera-se chegar ao final deste ano com
10.354 MW (4,7% da matriz energética nacional). Para 2023 a projeção é de 25,6
GW. Na solar, a participação na matriz energética nacional ainda é de apenas
1,03%. Mas os custos poderão baixar.
Atrás da cortina da crise econômico-financeira há
muita informação a ser discutida.
* Washington Novaes é jornalista.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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