Iniciativa pretende analisar o
impacto das mudanças climáticas sobre os manguezais.
por
Fundação Grupo Boticário
Manguezais brasileiros são foco de estudo que
analisará impacto das mudanças climáticas em ecossistemas costeiros. Foto:
Haroldo Palo Jr.
Estudo vai usar como indicador biológico
o caranguejo-uçá, espécie bastante sensível às alterações do clima. Os
manguezais são berçários de vida marinha e funcionam como barreira natural para
ondas e ressacas.
Conhecer os efeitos exatos das mudanças climáticas
sobre os ecossistemas e sua biodiversidade ainda é algo complexo. Para mudar
essa realidade, Marcelo Pinheiro, professor doutor da Universidade Estadual
Paulista (Unesp), será o responsável pelo estudo do impacto das alterações do
clima em duas áreas de manguezal: Estação Ecológica Juréia-Itatins (SP) e Estação
Ecológica de Guaraqueçaba (PR). Essas unidades de conservação estão localizadas
no Lagamar, complexo estuarino que é um dos maiores berçários de vida marinha
do planeta. O projeto será executado com o apoio de Setuko Masunari, professora
doutora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba, cuja equipe será
responsável pela análise da área de manguezal paranaense.
O objetivo do estudo é analisar os efeitos das
mudanças climáticas para o caranguejo-uçá (Ucides cordatus),
crustáceo muito sensível às alterações de habitat. “Iremos acompanhar essa
espécie durante quatro anos nessas duas regiões para entender como ela vai se
comportar”, explica Pinheiro. A pesquisa é apoiada pela Fundação Grupo
Boticário de Proteção à Natureza e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo (Fapesp).
Pinheiro estuda a espécie desde 1998 e já foi
responsável por outras quatro pesquisas com ela. “Nos estudos anteriores,
analisamos diversos aspectos do caranguejo-uçá, como estrutura
populacional (abundância de machos, fêmeas, jovens, adultos) e densidade
(quantidade por metro quadrado), bem como avaliamos essas características em
locais diferentes, com tipos variados de vegetação. A partir daí produzimos um
protocolo para a espécie”.
O protocolo elaborado possui duas partes: um passo
a passo de como fazer esse tipo de análise com caranguejos dessa e de
outras espécies que constroem tocas no sedimento de manguezal, e um trecho
teórico contendo o que é esperado acontecer com a espécie no futuro, considerando
a influência das mudanças climáticas. Na atual pesquisa, essa parte teórica
será colocada em prática.
“Iremos testar a aplicação do protocolo em campo e
verificar sua sensibilidade às diferentes condições de inundação já verificadas
nos manguezais, esperando que ele seja suficiente para detectar alterações nas
populações do caranguejo”, explica Pinheiro. Depois da pesquisa aplicada,
o protocolo poderá ser ajustado e repassado para monitoramento em outros
manguezais brasileiros.
“Certamente com o aquecimento global os efeitos gerados
poderão ser similares ou ainda mais preocupantes”, destaca o pesquisador.
De acordo com ele, apesar do caranguejo-uçá
ocorrer em toda a costa do Atlântico ocidental, desde a Flórida, nos Estados
Unidos, até Santa Catarina, tem sido verificado redução em sua abundância e
densidade. Tal situação ocorre pela reduzida taxa de crescimento da espécie
(tamanho comercial em 10 anos), que é um dos aspectos que justificou sua
inclusão na categoria de Quase Ameaça, da União Internacional para Conversa da
Natureza (IUCN). Outros fatos agravantes foram o aterro, desmatamento e
poluição dos manguezais, sendo que, neste último caso, o despejo de esgoto não
tratado nos rios e mares, bem como a concentração de lixo nos manguezais
interferem muito no equilíbrio desse ecossistema. “O chorume produzido pelos
lixões possui imensas concentrações de metais pesados. Além disso, a poluição
orgânica por falta de saneamento básico diminuem drasticamente o oxigênio na
água dos rios, lagos e mares. Isso prejudica tanto o próprio caranguejo,
como também as algas microscópicas que servem de alimento à suas larvas em sua
fase aquática”, destaca.
Mudanças climáticas devem piorar o cenário
Um dos efeitos esperados com as alterações do clima
é o aquecimento global, que deverá aumentar o nível dos oceanos. Segundo o
professor da Unesp, isso certamente promoverá maior inundação dos manguezais,
fazendo com que ocorra redução das áreas desse ecossistema. “De forma bem
simplificada, será mais mar e menos manguezal, o que pode gerar um grande
desequilíbrio, não apenas para o caranguejo-uçá, mas a outras espécies
animais, já que esse ambiente é fundamental à reprodução de
diversas outras espécies”, comenta.
Ao ser questionado se em apenas quatro anos ele
acredita que terá resultados das mudanças do clima, Marcelo Pinheiro é
enfático. “Já estamos começando a senti-las no próprio clima nos últimos anos.
Acredito que nesse período vamos ter material para trabalhar”. O pesquisador
ainda completa: “esperamos que a modificação seja tênue para que possamos
propor ações de conservação da espécie enquanto ainda há tempo”, conclui.
Manguezais e sua importância natural
Os manguezais são ecossistemas costeiros de
transição entre o continente e o mar, presentes em regiões tropicais e subtropicais
do planeta e considerados berçários da vida marinha. No Brasil, eles se
espalham em áreas lamosas por quase 26 mil km2, do Amapá a Santa
Catarina. Recebem esse nome por conta da espécie de flora predominante – o
mangue – que é constituído de três a quatro espécies de árvores.
Por ter águas calmas e protegidas por raízes, o
manguezal é utilizado como berçário por muitos peixes, crustáceos e outros
animais, que ali se reproduzem e desovam. Além disso, o mangue é fundamental na
absorção do impacto das ondas, evitando a erosão marinha. Esse ecossistema
também funciona como barreira para os fenômenos climáticos extremos como
enxurradas, ressacas e grandes tempestades.
O ecossistema marinho é muito rico em
biodiversidade, porém é pouco conhecido. Segundo Malu Nunes, diretora executiva
da Fundação Grupo Boticário, essa realidade precisa ser alterada no Brasil.
“Fomentar a pesquisa científica nesse ecossistema é indispensável para que o
país conheça melhor sua fauna e flora, bem como tenha os subsídios adequados
para protegê-los.”, destaca.
Fonte: Fundação
Grupo Boticário
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