Entre discursos contundentes e
avanços deprimentes.
por Bruno
Toledo, do Observatório do Clima
Foto: Libby Ferguson/Twitter.
“Se a evidência é tão clara, se o nível do mar está
subindo, se os eventos climáticos extremos que estamos vivendo são evidentes
para qualquer um – por que não estamos agindo agora?”
A fala do ex-presidente mexicano Felipe Calderón,
feita durante cerimônia nesta quinta-feira (11/12) do Climate Action Day na
Conferência de Lima, sumariza o assombro que muitas pessoas, veteranas e
novatas nas negociações internacionais em clima, estão tendo com a lentidão do
processo político na COP 20. Como um problema pode ser tão urgente e ameaçador
e as nossas lideranças políticas serem tão incapazes de se reunir para
construir um caminho de enfrentamento imediato e efetivo?
Ontem, quando a sociedade civil foi às ruas de Lima
pedir por mais ambição e ação climática, os gritos da marcha anteciparam o que
Calderón falou de forma polida: precisamos agir, e precisamos fazer isso agora!
Não existe amanhã quando estamos tentando conter o aquecimento do planeta em 2oC
neste século, porque o business as usual está nos levando para uma trajetória
que baterá 5oC de aumento da temperatura média do planeta nas próximas décadas.
A diferença de três graus centígrados não é pequena: é a diferença entre um
clima relativamente contornável, com efeitos colaterais possíveis de serem
suportados sem grandes mudanças, e um clima catastrófico, com impactos que
sequer somos capazes de prever, mesmo com a tecnologia que temos hoje.
No entanto, a urgência é um ator curioso em Lima.
Está presente em todos os discursos, de todos os setores, em todos os momentos
públicos. Porém, quando chega a hora de discutir e negociar, a credencial da
urgência é sumariamente cassada na COP 20: falta urgência e sobra lentidão. Por
exemplo, há cinco anos estamos discutindo o compromisso assumido pelos países
desenvolvidos em destinar recursos para o fundo climático verde (GCF, sigla em
inglês) de forma escalonada, com o objetivo de atingir a média de US$ 100
bilhões a partir de 2020. O GCF começou a receber recursos apenas neste ano, e
o montante é de apenas 10% da meta para o final dessa década. Por mais que os
países em desenvolvimento, que dependem desse fundo para financiar suas
atividades de mitigação e transição para o baixo carbono, defendam nos corredores
e plenários da COP, não temos um roadmap que assegure a esses países que o
compromisso dos US$ 100 bilhões anuais será atingido até 2020. Ou seja: a coisa
está na base do “acredite, se quiser”.
Falta dinheiro e falta ambição. Mesmo com o
consenso de que todos os países terão algum grau de compromisso de redução no
futuro acordo climático, a diferenciação dessas metas é um asteróide no sapato
dos negociadores. Para os países desenvolvidos, a divisão precisa ser justa a
partir do cenário atual das emissões: ou seja, os grandes emissores, países
ricos ou não, terão os compromissos mais abrangentes em mitigação. Para os
países em desenvolvimento, particularmente o clube dos emergentes do BASIC
(Brasil, África do Sul, Índia e China), o novo acordo precisa se alinhar ao
conceito das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”, consagrada no
texto da Convenção. Em suma, as responsabilidades históricas precisam ser
consideradas na hora de definir o tamanho dos compromissos de redução dos
países.
À despeito da proposta brasileira da diferenciação
concêntrica – na qual os países se distribuiriam em bandas de compromisso, com
possibilidade de transição de uma zona para a outra dependendo do contexto e
das capacidades correntes de cada país – ter sido recebida com interesse por
alguns negociadores, ela não foi capaz de romper o impasse nas negociações. Ou
seja, todos os países concordam que algo precisa ser feito, mas divergem
profundamente sobre quem o fará e como o fará.
Enquanto os bombeiros discutem quem vai apagar o
incêndio, as chamas ganham altura e vão se alastrando para outros lugares.
Nessas horas, urgência não passa de vocábulo da letra “U” do dicionário.
Fonte: Observatório do Clima
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