As ruas também são para pedalar.
por
Carolina Nunes*
Pedalada
pelo Ártico na Tailândia. Foto: © Greenpeace/Callahan Chittagong Tuttle.
Conforme a infraestrutura cicloviária avança nas
cidades brasileiras, ganham destaque nos jornais e na internet as opiniões
conservadoras de quem não se sente contemplado por essas mudanças.
Nesse último
final de semana, chamou a atenção uma matéria no jornal O Estado de S. Paulo que
foi um pouco além e trouxe opiniões bastante ofensivas a respeito de ciclistas.
Moradores da rua Honduras, localizada em um bairro nobre da cidade de São
Paulo, se irritam com a pintura de uma ciclovia no local e proferem sua
indignação à mudança usando argumentos que desqualificam os ciclistas – um
senhor chega ao extremo de dizer que “quem anda de bicicleta não presta”.
Ofensas à parte, relatos desse tipo são símbolo da
mentalidade que uma cidade excludente produz. São décadas de políticas públicas
que priorizam a propriedade e o transporte privados, que ao longo do tempo
foram tornando a cidade inacessível a pedestres e ciclistas. Muitas pessoas têm
resistência em entender a necessidade de criar essa lógica justamente por
estarem inseridas nesse contexto de privilégio e exclusão.
A boa notícia é que há tempo para promover uma
virada nessa cultura de privilégio ao automóvel. Depoimentos como os dos
moradores da rua Honduras provam que as ciclovias são necessárias não só pela
segurança e incentivo ao transporte não-motorizado e pela dívida histórica do
poder público com esse modo de transporte. Mas também para acelerar uma mudança
pela qual, em algum momento, cidades como São Paulo devem passar.
Apesar de o senso comum apregoar o contrário, as
ruas são públicas e pertencem a todos os cidadãos, independente de seu meio de
transporte. A criação de ciclovias, assim como a reforma de calçadas, são ações
necessárias para democratizar o espaço público, que parece ter sido desenhado
apenas para o uso do carro. Uma pesquisa do IPEA, por exemplo, mostra que 80%
do espaço nas ruas das grandes cidades brasileiras é dedicado ao automóvel,
apesar de apenas 30% das pessoas se locomoverem com eles.
A cada faixa pintada nas cidades é dado o recado,
outrora esquecido, de que as ruas são para o proveito de todos, e não de meia
dúzia de pessoas privilegiadas por morarem em um bairro nobre ou terem um carro
importado. Nessa fase de “redivisão” de espaços, as reações poderão ser
agressivas, como aconteceu em outros lugares no mundo que passaram pelo mesmo
processo. Nesse caminho, todos temos muito a aprender.
Fonte: Greenpeace Brasil
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