sábado, 27 de dezembro de 2014

A amanuense Dilma, o PMDB e a reforma fiscal.
Getty Images - Reeleita, Dilma terá um 2015 atribulado com aliados, corrupção e a Petrobras. 

Estimativas indicam que dez por cento de nosso Congresso (hoje com 513 deputados) está contaminado com a corrupção do Petrolão.

Baixemos, a título de ensaio aleatório, os 53 deputados supostamente infectados para, digamos, 40.

Ao contrário de seus sucessores tucanos (Serra e Alckmin, apagados politicamente nos primeiros quatro anos de Lula na Presidência), Aécio é uma liderança ativa, expressiva, que por menos de 4 milhões de votos não fincou os pés lá. O que ele decidir pode se cumprir como palavra de um “vieux combatant”.

Mas como Dilma e Aécio vão lidar com os deputados imundos, inundados pelo óleo sujo do Petrolão? Vão negociar com tais lideranças? Vão condená-los ao opróbrio? Um vai negociar e o outro vai guilhotiná-los?

Lula e FHC eram caudilhos, no seguinte senso do termo: gostam de poder, seja pelo sacrossanto atalho do voto, seja por “jeitinhos” –como foi a compra de votos pela emenda de reeleição de FHC, seja pelo Mensalão de Lula.

Dilma não: é uma amanuense. O termo vem do latim amanuensis, derivado da expressão latina "ab manu" (à mão). Considera-se amanuense o escriturário duma repartição pública ou estatal, que manualmente registra documentos ou os copia.

Amanuense é aquele funcionário público cumpridor de ordens, que quase sempre te trata mal, e segue cegamente as regras, mesmo que estas representem o colapso do sistema (em medicina isso se chama de “efeito iatrogênico, o do mal gerado pelo remédio que se propôs a uma cura).

Cientificamente amanuense, Dilma repeliu o investimento externo no Brasil porque segue sendo a velha comunista nacionalista. Agora promete consertar isso, em seu segundo mandato.

Cientificamente amanuense, Dilma disse sim a que o conselho da Petrobrás passasse a processar Gabrielli, (queridinho de Lula e ex-presidente da Petrobrás) pela compra superfaturada de Pasadena.

A amanuense Dilma agora está sozinha, com suas regras e calundus (acessos seriados de mau humor).

A amanuense Dilma pode ficar ainda mais sozinha se mandar metralhar os deputados contaminados. Pode com isso afundar atirando: como um galeão holandês. Se não fizer nada, e negociar politicamente os perdões, vai levar sobras e fazer água por todas as juntas, igualmente. Difícil, não?

Ajuste fiscal

Mas os nossos problemas não são a Dilma. Todos eles nascem do clientelismo político gerado pelo nosso modelo fiscal.

Nossa Constituição de 1891 imitava o modelo de união dos estados, como nos EUA. Vejamos: a fortuna de impostos coletada pela Califórnia só é remetida para a União em 50%. Com a metade restante, faz seu caixa estadual.

Até a Constituição de 1967, éramos assim. Foi nessa carta magna que fomos convertidos de República dos Estado Unidos do Brasil a República Federativa do Brasil.

Com esse modelo (o mesmo da Federação Russa de Putin) São Paulo, por exemplo, manda 90 % do que arrecada para a União.

Com isso, a grana arrecadada nos estados acaba indo irrigar os dólares nas cuecas, os mensalões (mineiro e petista), as Alstoms da vida, os Petrolões.

Os estados passam 90% do que arrecadam para a União. E, quando vão rolar as suas dívidas, precisam de caudilhos locais que vão a Brasília pedir favores e oferecer votos em troca -- de resto, esse é o sistema que sempre manteve em pé as oligarquias do nordeste…

Caudilhos como Lula e FHC querem poder: lutam até o fim para nele se manterem. Dilma não: quer assinar papéis e metralhar os inimigos. Não tem jogo de cintura (nem isso seria fisicamente possível, não?).

Qual o quadro do Brasil na América Latina?

Estamos no grau C de catarse e colapso. O grau A são Venezuela e Bolívia: no poder um cobrador de ônibus que tortura a população e um índio fantasiado de comunista.

O grau B são Argentina e Equador: a primeira só se mantem ainda porque Cristina não mexeu com as 20 famílias mais ricas do país... e no Equador a indústria pesqueira não foi atacada pelo governo.
No grau C estamos nós.

E neste grau, bem abaixo da linha de colapso institucional, quem vai segurar a peruca é o PMDB, a quem todos julgavam morto: o peso municipalista (lembrem-se que Quércia foi quem inventou as frentes municipalistas) fez do partido o mais forte do Brasil (Luiz Fernando de Souza, o Pezão, o mais novo arauto do municipalismo, vem de uma terra carioca de ninguém, obscuro município de Piraí).

O PMDB aprendeu a resistir na ditadura e a gerenciar o poder depois que ela acabou.

Se o PMDB lutar pela reforma fiscal, Dilma for “impichada” e Temer segurar a peruca, o partido não sai mais do poder.

Lembre-se: o PMDB saiu das eleições de 2014 como o maior partido do país em Estados administrados. Dispõe também possui o maior número de municípios e de parlamentares no Congresso Nacional : emplacou sete governadores, a maior quantidade entre as nove legendas que elegeram governantes neste ano. Em 2012, lembre-se também, o PMDB fez o maior número de prefeitos (1.019 ao todo).
Esta é a equação de 2015.

Claudio Julio Tognolli é jornalista há 35 anos e já passou por “Veja”, “Jornal da Tarde”, “Caros Amigos”, “Joyce Pascowitch”, “Rolling Stone”, “Galileu”, “Consultor Jurídico”, rádios CBN, Eldorado e Jovem Pan e “Folha de S. Paulo”. Ganhou prêmios de jornalismo e literatura como Esso e Jabuti. É diretor-fundador da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e membro do ICIJ (International Consortium of Investigative Journalism). Professor da ECA-USP, escreveu 12 livros. Ele escreve regularmente em seu blog no Yahoo.


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