Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo está em uma encruzilhada em Lima.
por Wambi
Michael, da IPS
“A perspectiva geral é que o MDL se encontra em uma
encruzilhada. Os mercados colapsaram”, afirmou Hugh Sealy, presidente da junta
executiva do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Foto: Wambi Michael/IPS.
Lima, Peru, 9/12/2014 – O instrumento da
Organização das Nações Unidas (ONU) para apoiar projetos de emissões de carbono
nos países em desenvolvimento, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), está
em crise devido à queda dos preços que se paga por créditos de carbono.
O MDL, encarregado das reduções certificadas de
emissões (RCE), poderia colapsar porque nos últimos anos caiu a demanda dos
principais compradores, países obrigados a reduzir suas emissões contaminantes
no contexto do Protocolo de Kyoto, já que os objetivos de redução não
aumentaram significativamente e porque houve um crescimento econômico mais
lento.
Na 20ª Conferência das Partes (COP 20) da Convenção
Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), que acontece
até o dia 12 em Lima, a junta executiva do MDL tenta convencer os negociadores
a renovarem seus compromissos com o mecanismo, que já tem dez anos. Em
entrevista à IPS, Hugh Sealy, presidente do MDL, explica porque o instrumento
se complicou e quais desafios há pela frente.
IPS: Pode nos dar um panorama geral da situação do
MDL?
HUGH SEALY: A perspectiva geral é que o MDL se encontra em uma
encruzilhada. Os mercados colapsaram. O preço das RCE caiu para US$ 0,30,
comparado com os mais de US$ 30 há cinco anos.
IPS: O que se conseguiu até o momento?
HG: O mecanismo permitiu o registro de 7.800 projetos e
programas em 107 países em desenvolvimento com centenas de milhares de milhões
de dólares em investimentos, que significaram 1,5 bilhão de toneladas de
gases-estufa a menos liberados na atmosfera.
IPS: Qual foi o problema do MDL?
HG: A origem do problema, e é minha opinião pessoal,
foi a decisão da União Europeia (UE) de 2009 (de restringir a possibilidade dos
créditos internacionais e de proibi-los totalmente a partir de 2020), que entrou
em vigor em 1º de janeiro de 2013. O Japão decidiu criar seu próprio sistema, a
Austrália seguiu seu próprio caminho, como o Canadá, e os Estados Unidos nunca
se interessaram. Se existe um sistema em que a União Europeia, como nosso maior
comprador, vai excluir todas as outras unidades, então o mercado não tomará
muitas delas. Foi aí que os preços começaram a cair.
IPS: Acredita que deveria ter existido um mercado
regulado para as RCE?
HG: Um mercado como esse, que não é de qualquer
mercadoria, teria que ter um piso, como têm outros. Mas agora o Banco Mundial
diz que deveríamos criar um fundo de reserva do mercado que possa absorver o
excesso de créditos. Dizem que precisariam de “US$ 3 bilhões para absorver todo
o excesso, não vejo que o excesso seja um problema, mas falta de demanda. Veja
todas as RCE que geramos. Temos 1,5 gigatonelada de emissões reduzidas. A
diferença de emissões é de dez gigatoneladas por ano. Para mim continua havendo
uma demanda radical e essencial de um sistema de mercado.
IPS: A junta executiva do MDL enfrenta o
cancelamento voluntário como opção para criar demanda da RCE. Qual é a ideia
por trás disso?
HG: A ideia é que qualquer um, você como meio de
comunicação, eu como pessoa, uma companhia ou um governo possam comprar e cancelar
RCE de imediato. Mas não sabemos que demanda teremos para o cancelamento
voluntário. Mas, como junta diretora, acreditamos que é o correto. Colocar RCE
à disposição para quem quiser reduzir sua pegada de carbono.
IPS: Qual seria a solução duradoura?
HG: Necessitamos uma decisão clara em Lima, e em
particular em Paris (na COP 21, de 2015) sobre qual papel cabe a um mecanismo
internacional sob um novo regime climático. Precisamos que as partes, em
especial os países ricos, elevem sua ambição e criem mais demanda de RCE.
IPS: Quais são as consequências desse
desenvolvimento para os países menos adiantados e os pequenos Estados insulares
em desenvolvimento?
HG: Se fosse responsável pelo desenvolvimento de um
desses países, reservaria minhas RCE. Não buscaria concretizar um acordo para
comprar nesse momento. Não a US$ 0,30. Sou otimista e creio que o preço das RCE
subirá. Trabalho em uma aritmética fundamental, na qual a diferença de emissões
é de aproximadamente dez gigatoneladas ao ano e aumenta cada vez mais. Se os
países decidirem que os mercados serão um componente vital do acordo de Paris,
não vejo como o preço das RCE poderá continuar a US$ 0,30. É muito frustrante
para países, como a Jamaica, que já se registraram em projetos RCE, ou da
África.
IPS: Se o MDL acabasse hoje, o que perderíamos?
HG: Perderíamos dez anos de experiência e de aprender
fazendo. Levou muito tempo para criar o MDL e levá-lo à etapa em que estamos
agora. Não posso lhe dar um número ou um valor em dólares, mas há mais de 4.500
organizações envolvidas com ele.
IPS: O que os países podem fazer a respeito nessas
negociações de Lima?
HG: Podem aumentar sua demanda de RCE antes de 2020,
reconhecer o valor que o MDL agrega aos sistemas de comércio de emissões
emergentes e reconhecer o valor óbvio do mecanismo para a resposta
internacional à mudança climática, depois da entrada em vigor do novo acordo em
2020. É um dos instrumentos mais efetivos já criados pelos governos no contexto
da CMNUCC. Impulsiona e fomenta a redução de emissões, os fundos climáticos, a
transferência de tecnologia, a construção de capacidades, o desenvolvimento
sustentável e a adaptação, tudo o que os próprios países pedem do novo acordo
de Paris.
Fonte: Envolverde
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