Não há
empresa sustentável sem trabalho decente.
Foto: Thiago Lopes
O Brasil foi o último dos países das Américas a
abolir a escravidão, no entanto a herança maldita de trabalhadores submetidos
pela força permanece.
Mais de 120 anos após a promulgação da Lei Áurea
(1888), que estabeleceu o fim do regime escravocrata no país, diversos
problemas relacionados à exploração ilegal da força de trabalho ainda
persistem. A Conferência Ethos 360º 2015 promoveu a mesa de debates “Trabalho
escravo ou só emprego ruim?”, que reuniu profissionais e especialistas para
debater a legislação trabalhista no Brasil e as relações entre mercado e as
condições degradantes de trabalho.
O diálogo contou com a participação do
procurador-geral do Trabalho, Luís Camargo de Melo, da auditora fiscal do
Ministério do Trabalho e Emprego, Marinalva Dantas, e do jornalista e blogueiro
Leonardo Sakamoto, com mediação de Yuri Feres, gerente de sustentabilidade da
Cargill.
Apesar de ser o último país independente das
Américas a abolir a escravidão, o Brasil foi um dos pioneiros na criação de
equipes estatais para o combate ao trabalho escravo – os primeiros grupos datam
de 1891. No entanto, a disposição para barrar definitivamente esse processo de
degradação humana esbarra em déficits estruturais e legislativos, identificados
pelos especialistas no debate.
As imprecisões relacionadas ao conceito de trabalho
escravo contemporâneo, que figuravam como empecilhos à aplicação de sanções e à
elaboração de políticas públicas somente foram sanadas em 2004, com o
surgimento do artigo 146 do Código Penal. A norma traz características da
condição análoga à escrava, como o trabalho forçado, a condição degradante, a
servidão por dívida e ainda a jornada exaustiva tida como aquela que extrapola
de forma contínua os parâmetros legais.
O procurador geral destacou a importância de ações
repressivas além da esfera penal. “A responsabilização civil não pode ficar de
lado, pois em muitos casos é a medida mais eficaz. O trabalhador deve ser
indenizado por sua exploração, assim como a comunidade na qual ele está
inserido”, ressaltou.
Outra questão relevante suscitada pelo procurador
geral foi a edição de emenda constitucional que instituiu o artigo 243 da
Constituição. “A possibilidade de expropriação de propriedades que se utilizam
de trabalho escravo significou um grande avanço”, destacou o representante do
poder judiciário.
Para Sakamoto, a escravidão vai muito além da
questão moral. “Não se trata de mera maldade do empregador, mas o trabalho
escravo é um problema de ordem econômica. Muitas empresas tendem a reduzir ou
suprimir direitos trabalhistas básicos para alcançar competitividade no
concorrido mercado global”.
Outro ponto importante, disse Marinalva Dantas, é
que as condições degradantes de trabalho não fazem parte apenas da realidade
dos locais mais distantes do território nacional, está presente também nos
grandes centros. Ela destacou a importância do engajamento das empresas.
“Flagramos diversos casos de obras destinadas às Olímpiadas que estavam
utilizando trabalho análogo ao escravo. E não há empresa sustentável sem
trabalho decente, nem trabalho decente sem empresa sustentável”, concluiu.
Fonte: Instituto Ethos
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