COP-21 e
as dificuldades de um acordo num período conturbado.
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“É preciso um acordo de longo prazo e com metas dos
principais emissores, que são, em primeiro lugar, os países industrializados,
tendo à frente os Estado Unidos; em segundo lugar, um conjunto de países
intermediários, tendo à frente a China, incluídos entre eles o Brasil, além da
Índia”, menciona o Secretário Executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças
Climáticas, Luiz Pinguelli Rosa.
A 21ª Conferência das Partes da Convenção das
Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas – COP-21, que será realizada entre os
dias 30 de novembro e 11 de dezembro deste ano, em Paris, na França, terá “um
papel semelhante ao que teve a Conferência de Kyoto”, ou seja, abrirá “um novo
período de discussão sobre as questões climáticas”, diz Luiz Pinguelli Rosa, na
entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por telefone.
Para ele, o ponto central da Conferência deve focar
na elaboração de um acordo que possibilite “a redução das emissões” a partir de
uma perspectiva de “eficiência energética”, e de analisar quais políticas são
necessárias para uma “economia viável”.
Além da dificuldade de os países chegarem a um
acordo acerca das metas a serem seguidas a partir de 2020, Pinguelli Rosa chama
atenção para o fato de o novo acordo ter de emergir num “momento em que o mundo
está conturbado por uma série de problemas”, desde crises e dificuldades
econômicas, até a situação dos refugiados e do Estado Islâmico. “Tudo isso
chama a atenção do mundo, de maneira que a Conferência do Clima acaba ocupando
um papel modesto nas prioridades das grandes potências e dos países como um
todo”, salienta.
O Brasil ainda não divulgou suas metas para a
COP-21, mas, de acordo com o pesquisador, o país deve manter uma proposta em
três níveis, como já vem fazendo nas Conferências anteriores. A primeira
proposta de compromisso, explica, seria “para os países desenvolvidos, como já
são os do anexo I da Convenção do Clima”; a segunda seria para um “grupo que
inclui Índia, Brasil, China, países grandes e que têm certo desenvolvimento
econômico e tecnológico; e um terceiro dos países menores, mais pobres e que
não podem assumir compromissos muito fortes”.
Luiz Pinguelli Rosa é graduado em Física pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestre em Engenharia Nuclear
pela COPPE/UFRJ e doutor em Física pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro – PUCRJ. Foi Diretor da COPPE/UFRJ por quatro mandatos e é
ex-presidente da Eletrobrás. Atualmente é Diretor da COPPE/UFRJ, Professor
Titular do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ, Professor do
Programa de História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia da UFRJ e
Secretário Executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual é a importância da COP-21 em
relação às demais COPs, neste momento? Que aspectos são diferentes hoje em
relação à época em que se propôs Kyoto, tanto em relação aos dados acerca das
mudanças climáticas quanto acerca da postura dos países no sentido de tomar uma
decisão de enfrentar as mudanças climáticas?
Luiz Pinguelli Rosa – A COP-21 tem um papel semelhante
ao que teve a Conferência de Kyoto, porque o período iniciado com o Protocolo
aprovado em Kyoto se encerra a partir da COP-21, ou seja, ela abre um novo
período de discussão sobre as questões climáticas. Então, ela terá um papel de
decidir sobre os compromissos dos países a partir de agora e por um longo
período de tempo na direção, em primeiro lugar, da redução das emissões de
gases de efeito estufa – GEE. Isso está acontecendo em um momento em que o
mundo está conturbado por uma série de problemas: problemas econômicos, não
totalmente resolvidos — o exemplo da Grécia chama a atenção, agora o do Brasil
também, e a Europa não está em uma situação cômoda economicamente. Quem está
melhor é os Estados Unidos, mas não se sabe até quando. O preço do petróleo
teve grandes oscilações e também há o problema dos refugiados, o problema do
Estado Islâmico, uma instabilidade política enorme no Iraque e na Líbia — países
que sofreram intervenções norte-americanas ou dos países ocidentais,
malsucedidas porque estão totalmente desorganizados. Na Síria também houve um
estímulo à rebelião, o qual está dando péssimos resultados, inclusive com a
penetração do Estado Islâmico também, tanto no Iraque quanto na Síria, que é
uma radicalização absurda do islamismo. Portanto, tudo isso chama a atenção do
mundo, de maneira que a Conferência do Clima acaba ocupando um papel modesto
nas prioridades das grandes potências e dos países como um todo.
A exceção a isso foi a Encíclica Papal, que chamou
a atenção para o problema do clima, mas mesmo ela teve um efeito passageiro:
naquele momento se falou muito no assunto, mas logo depois voltou-se a omiti-lo
na grande mídia e no debate político, que é o caso do Brasil, que hoje discute
se a política econômica vai nessa direção em que está ou deve mudar, e as
questões ligadas à corrupção — em particular na Petrobras e nas empreiteiras
que tinham contratos fraudulentos. E o clima também, aqui no Brasil, não ocupa
uma posição de destaque, apesar da importância da COP-21.
IHU On-Line – Alguns estimam que a COP-21 não
formulará um acordo para substituir Kyoto, mas antes apresentará um panorama
acerca de com quais metas os países aceitariam se comprometer. Qual a sua
expectativa em relação a um possível acordo? Essa tende a ser mais uma
conferência em que não se chegará a um acordo? O que fará a COP-21 ser
bem-sucedida?
Luiz Pinguelli Rosa – Acredito que o objetivo é o
acordo. Pode não se chegar a ele, mas isso será muito ruim. Embora o papel de
cada país seja o de apresentar metas próprias — como o Brasil já fez na
Conferência Copenhague, na COP-15, quando se comprometeu em reduzir
aproximadamente 36% das emissões no ano 2020. Mas isso não é o suficiente, é
preciso um acordo mais profundo, de longo prazo e com metas dos principais
emissores, que são, em primeiro lugar, os países industrializados, tendo à
frente os Estados Unidos; em segundo lugar, um conjunto de países
intermediários, tendo à frente a China, incluídos entre eles o Brasil também,
além da Índia — mas a China é o principal emissor desse grupo. Enfim, faremos o
possível, mas seria muito bom que se chegasse a um acordo válido para todos os
países.
IHU On-Line – Quais deverão ser os pontos mais
difíceis de negociação?
Luiz Pinguelli Rosa – Chegar a um acordo sobre o
quanto será reduzido das emissões e quais são as políticas para uma economia
viável. Nós fizemos um trabalho aqui, coordenado pelo Fórum Brasileiro de
Mudanças Climáticas, do qual sou o secretário, e com participação
principalmente da COP, mas também de várias representações de setores
empresariais, sindicais, das Organizações Não Governamentais e de
Universidades, em que demonstramos, com um modelo e cenários para o futuro, que
é possível o crescimento econômico com geração de emprego junto com a redução
das emissões dos gases de efeito estufa. Ou seja, uma economia verde para o
Brasil.
Mas o problema não é o Brasil, é o mundo todo. Não
há solução só para um país para esse problema, pelo menos no terreno da
mitigação das emissões. É preciso que o mundo inteiro coparticipe dentro de uma
política que evite um aumento de temperatura global muito grande, acima de 2ºC
— já se considera isso difícil de acontecer —, mas que pelo menos fique não
muito acima de 2ºC de aumento da temperatura global ao fim desse século.
IHU On-Line – Em que consiste essa proposta de
Economia Verde para o Brasil?
Luiz Pinguelli Rosa – Medidas como: eficiência
energética, utilização de energia eólica e solar, de hidroeletricidade, de
biocombustíveis — especialmente do etanol e do bagaço da cana-de-açúcar — e
redução do consumo de combustíveis fósseis, como os derivados de petróleo —
gasolina, diesel, óleo, gás e carvão mineral —, que são os combustíveis fósseis
responsáveis pela maior parte das emissões. O Brasil tem outro papel que é a
redução do desmatamento, que está sendo bem-sucedida: houve uma redução
significativa do desmatamento, principalmente na Amazônia.
IHU On-Line – Como vê os acordos bilaterais entre China
e EUA para reduzir emissões?
Luiz Pinguelli Rosa – Acho ótimo que haja acordos
bilaterais; não bastam, mas ajudam, particularmente entre os dois “cabeças de
série” — Estados Unidos e China —, que são os maiores emissores do mundo.
IHU On-Line – O senhor já tem algum palpite ou
informação acerca de quais serão as metas brasileiras para a COP-21?
Luiz Pinguelli Rosa – Não. Estamos cobrando isso do
governo. Houve algumas reuniões, o Brasil está levando uma proposta semelhante
ao que falei, de ter três níveis de compromisso: o primeiro para os países
desenvolvidos, como já são os do anexo I da Convenção do Clima; um segundo
grupo que inclui Índia, Brasil, China, países grandes e que têm certo
desenvolvimento econômico e tecnológico; e um terceiro dos países menores, mais
pobres e que não podem assumir compromissos muito fortes. Tentar, entretanto,
ter compromissos nesses três níveis.
IHU On-Line – Com que tipo de metas o Brasil teria
condições de se comprometer na COP-21? Elas dizem respeito a quais setores?
Luiz Pinguelli Rosa – Já está comprometido com as
metas de Copenhague, o problema é a partir de 2020; até 2020 o Brasil já tem
metas oficiais. E daí para frente é preciso, creio, usar algo do tipo desse
projeto de Economia Verde que o Fórum, inclusive, apresentará, em uma reunião
com a Ministra do Meio Ambiente [Izabella Teixeira] nas próximas semanas.
IHU On-Line – A crise atual está impactando ou deve
impactar numa possível revisão das metas brasileiras?
Luiz Pinguelli Rosa – Está tendo, não na reversão das
metas, mas sim na discussão sobre a questão do clima, porque essa crise acaba
tomando toda a atenção do governo.
IHU On-Line – Quais os principais resultados da sua
pesquisa sobre as possíveis consequências econômicas e sociais das mudanças
climáticas para o futuro?
Luiz Pinguelli Rosa – A mudança climática tem efeito
negativo para todos os países e o Brasil não escapa. Poderá ter grandes
fenômenos climáticos, muito intensos, como alguns indícios que estejam
ocorrendo, principalmente no Sul do Brasil, além de grandes inundações e
grandes secas. A produção agrícola pode ser muito afetada, pois o Brasil é um
grande celeiro de atividade agrícola e pecuária, e que poderá ser muito
prejudicado com a mudança do clima.
IHU On-Line – Que medidas devem ser tomadas em
setores específicos, como o de energia?
Luiz Pinguelli Rosa – O Brasil, no setor de energia,
está no bom caminho até certo ponto, ou seja, nós usamos as energias renováveis
mais do que qualquer outro país do mundo. Entretanto, recentemente, com o problema
da hidroeletricidade, nós aumentamos muito a emissão de gases na geração
elétrica, usando usinas termoelétricas que, aliás, são muitos ineficientes — as
nossas em particular. E, também, no caso do combustível, porque houve uma
redução do preço relativo da gasolina em relação ao etanol e acabou
desorganizando a produção de cana-de-açúcar, do etanol e do bagaço, que também
fizeram aumentar o consumo de gasolina na contramão da história, na contramão
da redução das emissões, tanto no setor elétrico quanto no transporte. Isso,
neste momento, tem sido muito ruim.
IHU On-Line – Recentemente o senhor fez uma
apresentação no Senado acerca da sua pesquisa sobre possíveis medidas a serem
tomadas para enfrentar as mudanças climáticas. Quais suas impressões sobre a
receptividade política a esse debate?
Luiz Pinguelli Rosa – O Senado foi muito
participativo. Havia muitas lideranças dos Senadores presentes e foi uma
discussão bastante intensa. Para os Senadores presentes, o interesse foi
grande, mas não sei como isso se dá no Senado, em particular na Câmara também,
onde houve outro seminário muito pouco participativo, ao contrário do Senado.
IHU On-Line – Faltando poucos meses para a COP-21,
qual deve ser o foco central dos países que irão participar da COP-21?
Luiz Pinguelli Rosa – A redução das emissões. Para
isso, usando mais energia renovável, mais eficiência energética e usando menos
combustível fóssil.
Fonte: IHU On-Line
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