quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Desenvolvimento deve ser diferente.
O secretário-geral da ACP, Patrick Gomes, na Cúpula sobre Desenvolvimento Sustentável realizada na 70ª Assembleia Geral da ONU.

Por Ramesh Jaura, da IPS – 

Bruxelas, Bélgica, 6/10/2015 – Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) refletem as cinco estratégias nas quais o Grupo de Estados da África, do Caribe e do Pacífico (ACP) se concentrará na medida em que se reposicionar como uma organização mais eficaz no mundo, afirmou o secretário-geral deste bloco de 79 países, Patrick Gomes.

Essas estratégias são o Estado de direito e o bom governo, justiça e segurança humana internacionais, comércio entre os membros do ACP, industrialização e integração regional, construção de economias sustentáveis, flexíveis e criativas, bem como o financiamento para o desenvolvimento, explicou Gomes em entrevista por correio eletrônico à IPS.

IPS: O grupo ACP é integrado por 48 países da África subsaariana, 16 do Caribe e 15 do Pacífico. Conseguiu uma estratégia conjunta?

PATRICK GOMES: Desde o princípio, o Comitê de Embaixadores do ACP em Bruxelas reconheceu a importância da Agenda de Desenvolvimento Pós-2015 como plataforma para a ação global para enfrentar as enormes necessidades dos países em desenvolvimento. Em 2014, o ACP estabeleceu um grupo de trabalho de embaixadores para se dedicar exclusivamente a elaborar uma posição comum sobre a matéria, destacando as áreas mais importantes para nossos Estados membros, como mudança climática, financiamento para o desenvolvimento, transferência de tecnologia, por exemplo. No centro está o desejo de criar condições para que nossos países prosperem no desenvolvimento e se industrializem de maneira sustentável, com a finalidade de elevar os níveis de vida de nossos povos. Este trabalho foi um insumo para a declaração conjunta com a União Europeia (UE) sobre a Agenda Pós-2015, que foi aprovada pelo Conselho Conjunto de Ministros ACP-UE, em junho de 2014. Isso foi um verdadeiro marco e destacou claramente nossos interesses comuns, ao mesmo tempo em que proporciona uma diretriz para nossa cooperação futura. O grupo ACP também acordou, mais recentemente, sua postura para a conferência internacional da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Financiamento para o Desenvolvimento, em julho, e estamos trabalhado em uma posição para a 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, em Paris, em dezembro. Mediante uma série de diferentes plataformas, o grupo ACP conseguiu articular uma posição comum sobre questões de interesse direto nas perspectivas de nossos países para o desenvolvimento sustentável.

IPS: Em sua opinião, até que ponto os 17 ODS abordam os problemas e as aspirações de um grupo tão diverso como o ACP?

PG: O ACP na verdade é um grupo diverso. Todos estão em desenvolvimento, mas cada um tem condições específicas. Há pelo menos 40 países menos adiantados, 37 pequenos Estados insulares e 15 Estados em desenvolvimento sem saída para o mar. Isso também se expressa em nível regional, por isso o ACP está organizado em seis regiões (África oriental, ocidental, austral e central, e Caribe e Pacífico). O conceito de propriedade nacional e as políticas impulsionadas pelos países é muito importante. Por outro lado, o grupo ACP pediu a criação de um índice de vulnerabilidade que tenha em conta os problemas específicos que afetam a capacidade de um país para se desenvolver. Isso não significa que os Estados membros não possam estar juntos em temas comuns, ou apoiar as causas mútuas em nome da solidariedade. Também seguimos os princípios de subsidiariedade e complementaridade. Os ODS refletem os cinco domínios estratégicos nos quais o ACP se concentrará, na medida em que se reposiciona como uma organização mais eficaz no âmbito mundial. Esses domínios são Estado de direito e bom governo, justiça e segurança humana internacionais, comércio entre os membros do ACP, industrialização e integração regional, construção de economias sustentáveis, flexíveis e criativas, bem como financiamento para o desenvolvimento. Todos esses campos serão regidos pela cooperação Sul-Sul e triangular.

IPS: A conferência de Adis Abeba sobre Financiamento para o Desenvolvimento, a Cúpula de Desenvolvimento Sustentável e a Conferência sobre Mudança Climática de Paris parecem um triunvirato para determinar o destino do mundo nos próximos anos. Em sua parte central encontra-se o financiamento. Com espera que este problema seja resolvido? O Fundo Europeu de Desenvolvimento proporciona um marco adequado?

PG: Na era pós-2015 temos que fazer o desenvolvimento de maneira diferente. Está claro que a tradicional Assistência Oficial ao Desenvolvimento (AOD) quantitativamente não basta para enfrentar as demandas de desenvolvimento de nossos países. Na verdade, a AOD representa agora muito menos do que o investimento estrangeiro direto, a participação de capital e as remessas das comunidades da diáspora que investem em seus países de origem. Em termos de financiamento sustentável de longo prazo, temos que nos fixar na mobilização dos recursos nacionais em nossos próprios países em desenvolvimento. Isso significa aperfeiçoar nossas leis fiscais, a luta contra a evasão fiscal e a corrupção, a fim de reduzir a sangria de milhares de milhões de dólares dos movimentos financeiros ilícitos. Agreguemos o financiamento privado para financiar os investimentos, a melhora da gestão da dívida pública, o impulso ao comércio – todos esses caminhos devem ser abordados de maneira integral. O grupo ACP também tem particular interesse na cooperação Sul-Sul e na cooperação triangular para complementar os modelos tradicionais Norte-Sul de financiamento do desenvolvimento. Porém, a AOD continuará sendo uma parte essencial do financiamento para o desenvolvimento pós-2015. Os países desenvolvidos ainda devem cumprir suas promessas anteriores de destinar 0,7% de sua renda nacional bruta à ajuda para o desenvolvimento. Até agora, apenas uns poucos países europeus alcançaram e superaram esse nível de AOD. Imagine se todos os países industrializados o fizerem. Além disso, já que as nações desenvolvidas reafirmaram a meta de 0,7% para a AOD, em Adis Abeba no mês de julho, agora temos que ver como será implantada no contexto ACP-UE. O Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED) para os países ACP é significativo, mas, obviamente, não é suficiente para conseguir os ODS. Entretanto, o singular do FED é que integra um acordo legalmente vinculante entre dois conjuntos de Estados soberanos. No marco de nossa associação, a UE proporciona uma fonte previsível de fundos se o grupo ACP os co-administra. Ao mesmo tempo, problemas de flexibilidade nos regulamentos do FED e um melhor planejamento dos países ACP, significam que as taxas de absorção reais destes ainda podem melhorar.

IPS: Os ODS terão maior êxito que seus antecessores, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM)?

PG: Os ODS terão o êxito que lhes dermos. Isto é, esses objetivos devem ter recursos suficientes para implantar o trabalho e obter resultados. Contrariamente ao impulso e à esperança gerada por enormes promessas feitas pelos países desenvolvidos nos fóruns internacionais, a realidade é que o financiamento para o desenvolvimento está diminuindo atualmente. Porém, continuo otimista. Há uma consciência crescente em todo o mundo sobre os temas de desenvolvimento. Também existe um interesse em revisar os sistemas atuais para cumprir melhor os ODS, como se vê nas reformas que atualmente buscam a ONU e o grupo ACP. Não há dúvidas de que os recursos e os meios para alcançar a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015 existem. É uma questão de vontade coletiva aplicá-los na direção correta.


Fonte: ENVOLVERDE

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