Empresas estrangeiras tiram
terras dos pobres na África.
por Jeffrey Moyo, da IPS
Harare, Zimbábue, 9/4/2015 – Uma nova luta é
travada na África. As elites políticas e as empresas estrangeiras expulsam os
habitantes pobres de suas casas na medida em que se apoderam de grandes
extensões de terra em todo o continente, conforme denúncias de ativistas.
“Nossos antepassados protestaram quando os
colonizadores se apoderaram de suas terras há mais de um século, mas hoje a história se
repete, já que nossos próprios líderes políticos e compatriotas ricos estão
saqueando a terra”, afirmou Claris Madhuku, diretor da Plataforma pelo
Desenvolvimento da Juventude (PYD), uma organização não governamental do
Zimbábue.
O ativista Owen Dliwayo, da Rede de Ação Diálogo
Juvenil, outra ONG do Zimbábue, adverte que as empresas transnacionais têm a
culpa da apropriação das terras que afeta a maioria dos países africanos.
“Posso dar o exemplo do projeto de combustível de etanol, em Chisumbanje, aqui
em Chipinge”, sudeste do país, disse à IPS.
“O projeto resultou no deslocamento de milhares
de aldeões para preparar o caminho para uma plantação de cana-de-açúcar,
mediante a liberação de milhares de hectares de terra para produção de etanol”,
acrescentou Dliwayo. A plantação de 40 mil hectares, que começou em 2008,
deslocou mais de l.754 famílias, segundo PYD.
Há 15 anos, o Zimbábue aplicou um controvertido
plano de reforma agrária para resolver os desequilíbrios na posse da terra
herdados da época colonial.
“Dizer que nações africanas como o Zimbábue
resolveram o problema da terra é faltar com a verdade, porque a terra
confiscada dos agricultores brancos foi dividida entre as elites políticas à
custa dos camponeses”, denunciou à IPS Terry Mutsvanga, reconhecido ativista
pelos direitos humanos. “O confisco de terras na África ajudou a perpetuar
desigualdades econômicas semelhantes aos desequilíbrios econômicos da época
colonial”, apontou.
Em 2010, o serviço de notícias ZimOnline informou
que cerca de 2.200 zimbabuenses negros pertencentes à elite do país controlam
quase 40% dos 14 milhões de hectares de terras confiscadas de fazendeiros
brancos, e que o presidente Robert Mugabe e sua família possuem 14 propriedades
com extensão de 16 mil hectares, pelo menos.
Em Uganda, ocorre um padrão de desigualdade
semelhante, segundo documento de 2011 preparado por Joshua Zake, coordenador do
Grupo de Trabalho Florestal da organização Alerta Ambiental. A suspeita da
existência de petróleo e outros recursos minerais fomenta a monopolização das
terras na África, especialmente em Uganda, como aconteceu nos distritos
ugandenses de Amuru e Bulisa, explicou. O mesmo se aplica ao Zimbábue, onde o
governo deslocou mais de 800 famílias da localidade de Chiadzwa, na província
de Manicaland, após a descoberta de diamantes na área, em 2005.
A apropriação de terras também acontece no âmbito
urbano, segundo urbanizadores privados africanos. “Há uma grande demanda por
terras para a construção de moradias nos povoados e nas cidades da África,
devido à forte migração rural”, explicou Etuna Nujoma, um empresário imobiliário
de Windhoek, capital da Namíbia. “Os ricos e poderosos, bem como os políticos
corruptos, se aproveitam da demanda por terras e costumam dividir entre si os
terrenos urbanos para sua revenda a preços exorbitantes à custa dos pobres”,
ressaltou.
Nessas circunstâncias, em 2014 um grupo de
habitantes de assentamentos informais nos arredores do balneário costeiro de
Swakopmund, na Namíbia, ocupou terrenos municipais. Já em Moçambique os pobres
estão perdendo a partida diante dos investidores estrangeiros, apesar de nesse
país existir a propriedade privada da terra. A Constituição moçambicana
estabelece que o Estado é o único proprietário da terra e de seus recursos
derivados, mas as leis outorgam aos particulares o direito ao usufruto e
benefício das terras, embora não tenham um título formal de posse.
Uma pesquisa realizada em 2014 pela União
Nacional de Agricultores Moçambicanos revelou que no país se produzia uma
apropriação de terras ao estilo colonial, já que empresas com vínculos
políticos confiscavam dos agricultores centenas de milhares de hectares de
terras de cultivo.
Segundo a Grain, organização internacional que
apoia os pequenos agricultores, os camponeses do norte de Moçambique têm
dificuldades para manter suas terras, na medida em que companhias estrangeiras
se instalam com seus agronegócios em grande escala. Aos moçambicanos se diz que
esses projetos lhes trarão benefícios, mas essa não é a opinião de César
Guebuza e outros camponeses.
“Os investimentos agrícolas das empresas
estrangeiras não nos beneficia. Pelo contrário, perdemos as terras para essas
companhias que investem aqui e nos tratam como estrangeiros em nossa própria
terra”, destacou Guebuza à IPS. “O governo de Moçambique é conhecido por ficar
do lado dos investidores estrangeiros, que agora ocupam grandes extensões de
terra para próprio uso, enquanto os camponeses locais perdem as suas, que são
seu direito de nascimento”, enfatizou Kingston Nyakurukwa, um economista
independente do Zimbábue.
Este ano, a organização humanitária ActionAid Tanzânia,
informou que, com apoio da União Europeia e dos Estados Unidos, a Nova Aliança
para a Segurança Alimentar e a Nutrição pretende investir cerca de US$ 8,2
bilhões no desenvolvimento agrícola da África. Porém, essas iniciativas
empresariais tirarão dos africanos seu dinheiro bem ganho, quando comprarem os
produtos agrícolas, afirmou Nyakurukwa.
Do mesmo modo, em Moçambique, Nigéria e Tanzânia,
os pequenos agricultores são deslocados de suas terras para liberá-las para as
plantações de cana-de-açúcar, arroz e outros cultivos destinados à exportação,
com apoio do dinheiro da Nova Aliança, segundo a ActionAid Tanzânia.
Na Tanzânia, os grandes investimentos poderiam
gradualmente deixar os camponeses sem terra. “O dinheiro dos investidores
parece estar empurrando-os de nossas terras aqui na Tanzânia, já que a ninguém
foi oferecida a possibilidade de escolher ser reassentado ou não, porque, à
força, nos oferecem dinheiro ou terras de reassentamento”, ressaltou o camponês
Moses Malunguja.
Fonte: ENVOLVERDE
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