Baixo Parnaíba: Projetos
socioambientais evitam desmatamentos em Buriti, por Mayron Régis.
[Territórios Livres do Baixo
Parnaíba] Ele se separara daquela visão ingênua que o
impelira três anos antes. Só o amor pela aventura explicaria a sua disposição
em querer conhecer as Chapadas de Buriti sem que ninguém lhe convidasse. Não
necessitava de um convite formal, assim pensava, apenas ligou para Antonio
Pernambucano, técnico que o ministério publico estadual contratara para
elaborar um relatório sobre os impactos ambientais ocasionados pela monocultura
da soja, e avisou –o que apareceria em Buriti. Eles se conheciam pela internet e
não passava disso, um em São Luis e o outro em Buriti, portanto Antonio
Pernambucano desconsiderou a possibilidade real de alguém desembarcar em frente
a sua casa sem antes se conhecerem pessoalmente em outras circunstâncias.
Ele revelou que comporia a Marcha em Defesa do
Baixo Parnaíba e, após o seu termino, compraria a passagem para Buriti. A
Marcha começou em São Bernardo no raiar do dia e seguiu em direção a Santa
Quitéria. Esses municípios viviam situações distintas do ponto de vista
ambiental. A câmara de vereadores de São Bernardo aprovara uma lei que impedia
o desmatamento, a produção de carvão vegetal e o plantio de monoculturas. A lei
deu conta do recado, pois segurou o avanço dos plantios de soja e de eucalipto
por um bom tempo.
Até 2007, nenhum vereador ou vereador discutira
com as comunidades tradicionais e com a sociedade civil de Santa Quitéria uma
lei parecida com a de São Bernardo. Elas se aliaram a organizações de direitos
humanos e defensoras do meio ambiente estaduais e nacionais com o intuito de
estruturarem processos múltiplos de resistência ao projeto de plantio de
eucalipto que a Margusa pretendia implantar nas Chapadas de Santa Quitéria e
Urbano Santos em áreas que arrendara da Suzano Papel e Celulose. Esses
processos culminaram na aprovação pela câmara de vereadores que proíbe os
plantios de soja e de eucalipto no município de Santa Quitéria.
Persistia na sociedade da época uma visão em que
a vida social e econômica se resumia ao urbano e que os conflitos se resolviam
de acordo com parâmetros urbanos. Nada mais natural, então, para esse ponto de
vista urbano que a Suzano Papel e Celulose pedisse a prisão de lideranças de
associações que se colocavam contra seus projetos sob a acusação de invasão de
terras. Esse fato não era previsível em 2007 para as comunidades tradicionais
de Santa Quitéria, pois a resistência se mantinha no campo administrativo como
obstruir o licenciamento ambiental. As comunidades desobedeceram os desígnios
da Secretaria de Meio Ambiente em todas as audiências publicas e essa
desobediência pacifica fez com que a Margusa desistisse do projeto.
A partir do momento em que a Suzano assume o
projeto em 2008 no lugar da Margusa e incursiona com tratores e policiais pelas
Chapadas, a resistência das comunidades tradicionais de Santa Quitéria sai da
esfera do licenciamento ambiental e da esfera da especulação e passa para a
esfera do conflito agrário-ambiental e para a esfera da prática do
conhecimento. Essa mudança de esfera obrigou a Suzano Papel e Celulose a criar
canais de diálogo com as comunidades como forma de reverter as decisões de não
permitir os desmatamentos das Chapadas e os plantios de eucalipto. A empresa
propôs diálogo e parou por ai.
As comunidades de Santa Quitéria não sabiam em
que estavam se metendo quando começaram as cobranças pela regularização
fundiária de seus territórios em 2005. Processos longos e cansativos de
regularização fundiária as esperavam, contudo ou elas suportariam as
insensibilidades dos órgãos fundiários ou elas veriam seus territórios nas mãos
de terceiros ou de quartos. As comunidades tradicionais de Santa Quiteria
devolveram aos órgãos fundiários as suas insensibilidades na forma de
organização social e política. Às comunidades da Lagoa das Caraíbas e São José
se juntaram Coceira e Baixão da Coceira. A demanda por regularização fundiária
aumentou com essas e outras comunidades de Santa Quitéria que se faziam
presentes na Marcha em Defesa do Baixo Parnaíba de 2007.
Seria possível que os órgãos fundiários
atendessem o Baixo Parnaíba como um todo ou era possível somente as comunidades
representadas na Marcha em Defesa do Baixo Parnaíba? Ele não teve oportunidade
de encontrar com Antonio Pernambucano que fora pescar em riachos próximos a
Buriti. Com esse desencontro, não pôde conhecer as Chapadas de Buriti que as
comunidades tradicionais de Matinha, Laranjeiras, Fazenda e Carrancas tocavam
em seus percursos diários. Em 2010, ele retornou com mais tempo e com mais
gente e os moradores de Carrancas informaram-no que os plantadores de soja planejavam
desmatar 3 mil hectares de Cerrado.
De 2011 a 2014, o Fórum Carajás e a Amib
(Associação dos Amigos de Buriti), com recursos do Centro de Apoio
Socioambiental, implantaram dois projetos socioambientais nos povoados de
Carrancas, das Laranjeiras, da Bacaba, do Brejinho, do Capão dos Marcelos, da
Santa Luzia e do Mato Grande. Esses projetos evitaram o desmatamento dos três
mil hectares.
* Mayron Régis, Colaborador do EcoDebate, é
Jornalista e Assessor do Fórum Carajás e atua no Programa Territórios Livres do
Baixo Parnaíba (Fórum Carajás, SMDH, CCN e FDBPM).
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