Banco Mundial lança fundo de
infraestrutura no Sul.
por Carey
L. Biron, da IPS
Construção próxima das cataratas Victoria, na
fronteira entre Zimbábue e Zâmbia. Foto: David Brossard/cc by 2.0.
Washington, Estados Unidos, 14/10/2014 – O Banco
Mundial anunciou uma iniciativa de US$ 15 bilhões para que empresas do setor
privado invistam em obras de infraestrutura no Sul em desenvolvimento. O
presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, apresentou, no dia 9, o Fundo para a
Infraestrutura Mundial (GIF), destinado a motivar bancos, fundos de pensões e
outros investidores institucionais a darem mais atenção às necessidades de
infraestrutura desses países.
Ao fazer o anúncio, Kim afirmou que essas obras
exigirão até US$ 1 trilhão por ano de investimento adicional até o final da
década, o dobro do que esses países gastam atualmente. Nos últimos anos, o
setor privado se afastou da infraestrutura dos países em desenvolvimento e das
economias emergentes segundo o Banco Mundial. Entre 2012 e 2013, esses
investimentos caíram quase 20%, para US$ 150 bilhões.
“Devido à magnitude das necessidades de
financiamento das obras de infraestrutura nos países em desenvolvimento, sem
dúvida damos as boas-vindas a uma iniciativa como esta”, disse à IPS Marilou
Uy, nova diretora do grupo dos 24 países em desenvolvimento (G 24) e
ex-funcionária do Banco Mundial. “O papel do setor privado aqui é especialmente
importante: encontrar bons modelos para trabalhar, para que o investimento
privado nos países em desenvolvimento possa começar a crescer novamente até
níveis inclusive maiores do que antes, acrescentou.
Em um passo que surpreendeu a muitos, o Fundo
Monetário Internacional (FMI) realizou este mês uma calorosa defesa do gasto
público, especialmente em obras de infraestrutura. Neste momento, FMI e Banco
Mundial realizam suas reuniões semestrais na cidade de Washington.
O GIF iniciará uma série de empresas-piloto até o
final deste ano, supostamente dedicadas a projetos que respeitem o ambiente e
que incentivem o comércio exterior. Mas o instrumento não financiará estas
iniciativas diretamente. Seu objetivo será chamar a atenção do setor privado
para estradas, pontes, produção de energia e outros projetos físicos de grande
escala que constituem a base do desenvolvimento socioeconômico dos países.
“Os investidores institucionais têm bolsos
profundos. Os fundos de seguros e pensões têm cerca de US$ 80 trilhões em
ativos”, pontuou Kim em entrevista coletiva, ressaltando que “menos de 1% dos
fundos de pensão é destinado diretamente aos projetos de infraestrutura, e
desse 1% a maior parte é nos países avançados”. “O verdadeiro desafio não é uma
questão de dinheiro, mas a falta de projetos financiáveis. Uma oferta
suficiente de investimentos em infraestrutura comercialmente viáveis e
sustentáveis” acrescentou.
O Banco Mundial espera que o GIF funcione como um
condutor pelo qual os grandes investidores, junto com os especialistas da
própria instituição, assessorem os governos sobre como estruturar projetos de
infraestrutura para atrair os investimentos. O enorme “déficit de
infraestrutura” atual no Sul em desenvolvimento constitui um “freio mundial”
para lidar com a pobreza, principal objetivo do Banco Mundial, destacou Kim.
Talvez em resposta a críticas passadas, o Banco
Mundial também disse que o GIF não se limitará a injetar tanto dinheiro quanto
possível nesses projetos. “É possível que o simples aumento do investimento em
infraestrutura não cumpra o potencial para fomentar um crescimento forte,
sustentável e equilibrado”, afirmou Bertrand Badre, diretor-gerente do Banco,
em um comunicado. “A qualidade da infraestrutura é vital”, acrescentou. O GIF
fomentará associações particularmente complexas entre os setores público e
privado, conhecidas como parcerias público-privadas (PPP).
Porém, organizações dedicadas ao desenvolvimento e
ativistas que lutam contra a pobreza consideram que os objetivos das entidades
com fins lucrativos costumam chocar-se com o bem público. Embora o GIF seja
“bem-vindo, o Banco Mundial deve garantir que os novos empréstimos para
infraestrutura venham com garantias adequadas para proteger as comunidades mais
pobres e vulneráveis dos clientes, que poderiam estar mais interessados no
lucro do que no desenvolvimento.
Precisamos de garantias para as pessoas, não
só para os investidores”, enfatizou Nicolas Mombrial, da Oxfam Internacional.
Por sua vez, o diretor do GIF, Jordan Schwartz,
lembrou à IPS que a iniciativa ainda está em seus primeiros dias. “Mantive
reuniões com organizações da sociedade civil que estavam verdadeiramente
interessadas em participar conosco no GIF”, contou. “Como elas, queremos
garantir que as decisões sobre investimentos em infraestrutura levem em conta
uma ampla gama de considerações ambientais, sociais e econômicas, para não
haver benefícios somente para os pobres e a atividade econômica em geral, mas
também para que os investimentos sejam sustentáveis”, ressaltou.
A preocupação com as PPP se destaca em relação aos
sistemas públicos de água. Nos últimos anos, empresas privadas de todo o mundo
mostraram grande interesse nas PPP para ressuscitar a infraestrutura hídrica do
setor público, que em muitos casos recebeu escasso investimento durante
décadas. O braço privado do Banco Mundial, a Corporação Financeira
Internacional (CFI), é uma forte defensora desse tipo de negócio, embora alguns
críticos afirmem que a privatização da água em muitos casos gerou maiores
custos e um serviço injusto.
Neste mês, por exemplo, ativistas nigerianos
redobraram sua campanha para exortar o governo a se retirar das negociações com
a CFI sobre um possível projeto de água em Lagos, cujos dados são mantidos
reservados, segundo afirmaram.
“Em todo o mundo, a CFI assessora os governos,
realiza processos de licitação, desenha contratos de privatização da água que
são complexos e pouco equitativos, dita as condições de arbitragem e é a
proprietária parcial das empresas de água que ganham os contratos que ela
desenha e recomenda, enquanto defende o modelo para que se repita em todo o
mundo”, afirmou o nigeriano Akinbode Oluwafemi, da organização Environmental
Rights Action.
“Essas atividades não só afetam a gestão
democrática da água, como também constituem um conflito de interesses nas
atividades da CFI no setor hídrico, uma tendência que se observa com alarme
desde a Europa oriental, passando por Índia, até o sudeste asiático”, afirmou
Oluwafemi, de Lagos, aos meios de comunicação.
Fonte: ENVOLVERDE
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