sexta-feira, 31 de outubro de 2014

As mãos solidárias podem piorar desastres ambientais.
por Jewel Fraser, da IPS
Vista aérea de um acampamento provisório em Porto Príncipe. Além do cólera levado pelos nepaleses da força de paz após o terremoto de 2010, os problemas ambientais surgiram pela distribuição de barracas de campanha de lona, que tiveram que ser substituídas em poucos meses. Foto: Marco Dormino/UN Photo.

Porto Espanha, Trinidad e Tobago, 30/10/2014 – A primeira resposta humanitária quando ocorre um desastre natural pode acabar exacerbando, involuntariamente, alguns problemas e agravando as consequências de futuros eventos climáticos, alerta a Sociedade da Cruz Vermelha de Trinidad e Tobago. Durante as fortes chuvas de 2012, quando as perdas chegaram a quase US$ 20 milhões em Diego Martin, oeste da ilha caribenha de Trinidad, o pessoal de socorro se mobilizou rapidamente para ajudar as vítimas que perderam suas casas.

No entanto, duas semanas depois a área voltou a inundar, só que desta vez devido a uma tempestade tropical. O informe da Sociedade da Cruz Vermelha fala da possibilidade de a segunda inundação ter sido causada, em parte, pelos “recipientes não biodegradáveis descartáveis, como garrafas, embalagens de alimentos e utensílios plásticos, distribuídos depois da primeira”.

“Além das intensas chuvas, um dos principais fatores contribuintes das inundações em Diego Martin foi que os cursos de água estavam barrados. A coleta de resíduos ficou restringida depois do desastre. O uso de materiais biodegradáveis que não prejudicam o ambiente poderia ter evitado a segunda inundação”, acrescenta o relatório.

A apresentação do informe Resposta Verde: Um Estudo de País esteve a cargo do Escritório de Gestão e Preparação de Desastres de Trinidad e Tobago e foi realizado em uma reunião da Associação de Estados do Caribe (ACS). O documento foi preparado após um estudo de viabilidade “sobre como reduzir de maneira sustentável o impacto ambiental dos produtos e da tecnologia usada na resposta a desastres”.

Trinidad e Tobago decidiu investigar a respeito após uma reunião da ACS em 2011, na qual surgiu a necessidade de a resposta aos desastres naturais ser mais respeitosa com o ambiente. Conseguir que a resposta aos desastres naturais seja mais ecológica é um tema de preocupação internacional. A Ferramenta Verde para a Reconstrução e Recuperação diz: “A redução do risco de desastres (RRD) busca reduzir o dano. As atividades para reduzi-lo representam um risco em si mesmas se não se considerar a sustentabilidade ambiental”.

O informe da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e da Meia-Lua Vermelha (IFRC) indica que as organizações dedicadas a esse tipo de tarefa devem incluir “os riscos da mudança climática e os futuros e atuais desastres, bem como várias medidas para contê-los nos programas de recuperação”.

A necessidade de considerar o tema foi especialmente evidente no Haiti, após o terremoto de 2010 que deixou mais de 200 mil mortos. Além do cólera, levado pelos nepaleses da força de manutenção de paz enviada para ajudar na recuperação, surgiu o problema ambiental criado pela distribuição de dezenas de milhares de barracas de lona, não biodegradáveis, que tiveram que ser substituídas em poucos meses.

O informe sobre as práticas da IFRC no Haiti aponta que serão necessárias 50 mil árvores para compensar a emissão de dióxido de carbono das barracas descartadas, se forem jogadas em lixões. “A questão fundamental é encontrar a forma de garantir que o que fizermos tenha o menor impacto possível no ambiente”, disse o diretor de RRD e Transporte da ACS, George Nicholson.

O governo de Porto Espanha se comprometeu a incorporar elementos ambientais e vinculados à mudança climática em todos os seus programas de resposta. Quando surgiu na ACS o tema de uma resposta verde à gestão de desastres, esse país ofereceu a realização de um estudo de viabilidade para o que se chamou Resposta Verde. A ACS trabalhou com o Escritório de Gestão e Preparação de Desastres do país, responsável pela iniciativa, a IFRC e a Sociedade da Cruz Vermelha de Trinidad e Tobago, para fazer o estudo.

Stephen Kishore, da Sociedade da Cruz Vermelha, disse que os esforços verdes para a atenção de desastres incluiriam atividades como produção local de suprimentos para reduzir a pegada de carbono que implica trazê-los da China, de onde procede a maioria dos produtos. Também implicaria procedimentos simples, como usar papel ou roupa, em lugar de plásticos, para envolver os suprimentos, ou embalar vários produtos, como sabão, em um mesmo pacote, e não de forma individual.

Os esforços de socorro também fomentariam a reciclagem e o uso de energia solar, em lugar de combustíveis fósseis. Para que os esforços de socorro sejam mais verdes, deve-se ter em conta o contexto legislativo que rege as organizações humanitárias. Segundo Nicholson, o estudo de viabilidade analisa o “processo legislativo de Trinidad e Tobago e seus sistemas operacionais para ver onde obter benefícios para conseguir um enfoque mais verde”.

Porém, não será fácil ter normas que permitam a sustentabilidade das respostas humanitárias aos desastres, destacou Kishore. Outra complicação, segundo Nicholson, é que os membros da ACS operam sob vários contextos legislativos, pois na região há países onde se fala alemão, francês, espanhol e inglês e têm tradições legais diferentes. “Não se pode fixar as melhores práticas. Os países deverão olhar o estudo e decidir a melhor maneira de adaptar as propostas ao seu próprio contexto”, explicou.

Terminada a etapa do estudo de viabilidade, o próximo passo da Resposta Verde será identificar e criar processos de resposta verde e produtos na região, o que será um incentivo para que a indústria local comece a produzir elementos recicláveis para usar durante um desastre natural.


Fonte: ENVOLVERDE

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