2015 será um ano decisivo para o
desarmamento nuclear.
por
Thalif Deen, da IPS
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, lê uma
declaração à imprensa após visitar a zona zero do local de testes nucleares de
Semipalatinsk, no Cazaquistão, em abril de 2010. Ban exortou os governantes do
mundo, e dos Estados possuidores de armas nucleares em particular, a
trabalharem por um mundo livre destas armas. Foto: Eskinder Debebe/ONU.
Nações Unidas, 22/10/2014 – “Um dos grandes
paradoxos da ciência moderna” é que os seres humanos buscam vida em outros
planetas enquanto as potências nucleares do mundo mantêm e modernizam suas
armas para destruir a vida na Terra, afirmou o secretário-geral da Organização
das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon. “Devemos lutar contra o militarismo que
engendra a busca por essas armas”, afirmou Ban no dia 6 de agosto, aniversário
do lançamento pelos Estados Unidos da primeira bomba atômica sobre a cidade
japonesa de Hiroxima, em 1945.
A partir de abril, uma série de reuniões converterá
2015 em um ano decisivo para o sucesso ou o fracasso do desarmamento nuclear.
Uma das mais importantes será a conferência quinquenal de exame do Tratado de
Não Proliferação Nuclear (TNP), programada para os meses de abril e maio. Quase
ao mesmo tempo, haverá uma conferência internacional da sociedade civil sobre
paz, justiça e ambiente, nos dias 24 e 25 de abril, em Nova York, uma
manifestação internacional e uma marcha pacifista rumo à sede da ONU, no dia 26
de abril, junto com protestos não violentos nas capitais de todo o mundo.
Em 2015 também se completarão 70 anos dos bombardeios
atômicos sobre as cidades japonesas de Hiroxima e Nagasaki, pelos Estados
Unidos. E também 45 anos desde que as primeiras cinco potências nucleares –
China, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e Rússia (P5) – acordaram no Artigo
VI do TNP a realização de negociações de boa fé para a eliminação de seus
arsenais nucleares. Além disso, é possível que a conferência internacional
sobre uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio, acordada na
conferência de exame de 2010, aconteça no próximo ano, após numerosos
adiamentos.
O Grupo Internacional de Planejamento para a
Mobilização da Revisão 2015 do TNP, uma rede de organizações não governamentais
internacionais que terá um papel preponderante nas próximas reuniões,
apresentará uma petição, com milhões de assinaturas, a favor da abolição das
armas nucleares. Caso a conferência de exame de 2015 não decida pelo início das
negociações sobre a abolição, “o próprio tratado poderá fracassar, acelerar a
proliferação das armas nucleares e aumentar a probabilidade de uma guerra
nuclear catastrófica”, segundo o Grupo.
“O que devemos fazer? Deixar que os realistas
pirados nos levem ao inferno? Não creio”, afirmou Joseph Gerson, coordenador da
rede internacional, ao ser perguntado se seria possível algum avanço diante da
intransigência das potências nucleares. A perspectiva do exame do TNP não é
otimista, acrescentou. “Mas tenho esperança ao saber que nossos movimentos da
sociedade civil não estão sozinhos na luta pela abolição”, acrescentou.
As última conferência de exame do TNP, em 2010,
reafirmou “o compromisso inequívoco dos Estados possuidores de armas nucleares
de alcançar a eliminação total de seus arsenais, com vistas ao desarmamento
nuclear”, acrescentou a rede internacional. Cinco anos depois, com outra conferência
no horizonte, os arsenais “capazes de destruir civilizações inteiras”,
persistem, e inclusive se deteve o escasso progresso obtido para o
desarmamento.
Há mais de 16 mil armas nucleares no planeta, dez
mil no serviço militar e 1.800 em estado de alerta, segundo a rede. “Todos os
Estados com armas nucleares estão modernizando seus arsenais nucleares,
manifestando a intenção de mantê-los nas próximas décadas”, apontou a
organização, lembrando que os países com armas nucleares gastam mais de US$ 100
bilhões ao ano com elas.
O gasto com armas de alta tecnologia aprofunda a
dependência de alguns governos de seus arsenais nucleares e fomenta a crescente
brecha entre ricos e pobres. Em 2013 o gasto militar chegou a US$ 1,75 trilhão,
mais do que a renda total anual do um terço mais pobre da população mundial.
Jackie Cabasso, da Fundação Legal dos Estados Ocidentais e também organizadora
da rede internacional, destacou que as potências nucleares “se negam a cumprir
sua obrigação legal e moral de iniciar as negociações para proibir e eliminar
completamente seus arsenais nucleares”.
“Como vimos na Reunião de Alto Nível das Nações
Unidas para o Desarmamento e nas conferências de Oslo e Nayarit sobre as
consequências humanas das armas nucleares, a imensa maioria dos governos do
mundo exige a aplicação do TNP”, assegurou Cabasso. “Estamos trabalhando com
organizações associadas nos Estados Unidos e em outros países para mobilizar
ações internacionais a fim de gerar pressão popular e influir na conferência de
exame de 2015”, acrescentou.
A mobilização destacará as conexões entre a
preparação para a guerra nuclear, as repercussões ambientais da mesma e do
ciclo do combustível nuclear, e o gasto militar em detrimento das necessidades
humanas essenciais, ressaltou Cabasso. Gerson disse à IPS que, “ao longo da
minha vida, vi a superação do sistema de segregação racial nos Estados Unidos,
o fim da guerra do Vietnã e o fim do sistema de apartheid sul-africano, fatos
que antes de se converterem em história às vezes pareciam insuperáveis”.
Em cada um desses casos, “acontecimentos
inesperados e a poderosa vontade humana provocaram a mudança para a qual nos
havíamos sacrificado e lutado”, destacou Gerson, membro da junta diretora do
Escritório Internacional da Paz e da rede Não à Guerra/Não à Otan. A realidade
é que todos os Estados possuidores de armas nucleares estão modernizando seus
arsenais e há colaboração entre os membros do P5 para resistir à reclamação da
maioria dos demais países para que cumpram o Artigo VI do TNP, enfatizou.
O que está acontecendo com a expansão da
Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e a União Europeia e as
respostas da Rússia e Ásia oriental recorda a Europa dos anos prévios à
Primeira Guerra Mundial (1914-1918), com sua ameaça de guerra catastrófica e
aniquilação, advertiu Gerson. “Sei que a lei das consequências imprevistas
significa que nunca podemos saber realmente quais serão as consequências de
nossas ações. Mas confio em que nossa mobilização dará ânimo a numerosos
diplomatas e atores governamentais que são nossos potenciais aliados”,
ressaltou.
Fonte: ENVOLVERDE
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