Para os próximos 4 anos…
por André Trigueiro*
Ser Presidente do Brasil significa estar à frente
da maior potência megabiodiversa do mundo (aproximadamente 20% das espécies
conhecidas e catalogadas pelos cientistas estão aqui), da maior floresta
tropical úmida, do maior estoque de solo fértil e do maior volume de água doce
do planeta.
O manejo desses recursos determinará a qualidade
do modelo de desenvolvimento que o Brasil – único país com nome de árvore –
terá neste século.
Depois de um decepcionante primeiro turno em que
os candidatos não conseguiram detalhar suas propostas sobre esse e outros assuntos
(o formato dos debates e a beligerância de alguns candidatos não favoreceu
isso) aguarda-se de Dilma e Aécio um posicionamento mais claro nessa área
estratégica para o Brasil.
Dentre as muitas questões importantes,
destacaremos aqui aquelas que nos parecem as mais urgentes:
- Água: Alguma dúvida de que o
Brasil experimenta a maior crise hídrica de sua história? Pelo menos 20% dos
municípios enfrentam os efeitos de uma grave estiagem, entre eles, São Paulo, a
maior metrópole da América do Sul. A disputa pela água da Bacia do Rio Paraíba
do Sul (que concentra 20% do PIB e abastece mais de 14 milhões de pessoas)
evidenciou a fragilidade da Agência Nacional de Águas (ANA) na gestão de uma
crise que tende a se agravar. Qual a proposta do(a) candidato (a) para que se
qualifiquem a gestão dos recursos hídricos, a reutilização das águas servidas
(água de reuso) e da água de chuva, se combata o desperdício na cidade e no
campo, entre outras ações importantes, das quais a mais urgente seria a
aceleração dos investimentos em saneamento básico?
- Lixo: O prazo estabelecido
pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) para que os lixões fossem
erradicados no país terminou no último mês de agosto (2/8) e mais da metade dos
municípios não se adequou à Lei. Falta de recursos no orçamento, perda da
capacidade de obter empréstimos federais por estarem inadimplentes, omissão
deliberada de seus dirigentes, são muitas as causas desse descompasso entre o
que a Lei determina e a realidade das cidades, em sua maioria pequenas e
pobres. Qual a proposta do(a) candidato(a) para que não haja mais lixo a céu
aberto no Brasil, contaminando os solos e as águas, agravando as emissões de
gases estufa e espalhando doenças?
- Florestas: Mais de dois anos
após a aprovação do Código Florestal o desmatamento aumentou 29% no último ano
e o Cadastro Ambiental Rural (CAR), ferramenta importante do Código para
identificar a situação de cada propriedade rural e estabelecer a área que
precisará (eventualmente) ser revegetada, avança muito lentamente, seja pela
enorme burocracia, seja pela aposta de alguns proprietários de que essa Lei não
pega. Qual a proposta do(a) candidato(a) para que o CAR seja implementado mais
rapidamente e seu monitoramento ocorra com agilidade e eficiência? Como
pretende conter a ação clandestina de pecuaristas, sojeiros, mineradoras e
madeireiras ilegais na Amazônia?
- Clima: O mais importante
evento previsto no calendário das negociações do clima desde a aprovação do
Protocolo de Kioto (1997) ocorrerá no ano que vem, em Paris, quando todos os
países do mundo deverão definir seus compromissos para reduzir as emissões
globais de gases estufa. O novo acordo climático é visto por especialistas como
a última oportunidade de os países se entenderem a tempo de evitar que a temperatura
média do planeta se eleve acima de 2°C neste século. Acima deste patamar, os
cientistas prevêem o caos climático, com o agravamento de fenômenos que
provocarão importantes impactos econômicos e sociais, com prejuízos ainda mais
severos sobre os mais pobres. Qual o compromisso assumido pelo(a) candidato(a)
para esta Conferência? O que o Brasil está disposto a fazer para reduzir suas
emissões (crescentes) de gases estufa?
- Energia: Difícil imaginar um
país do mundo com tantas opções energéticas quanto o Brasil. Se dermos
preferência às fontes limpas e renováveis (para onde aponta o norte magnético
das bússolas da maioria absoluta dos países desenvolvidos e em desenvolvimento)
a vantagem brasileira é ainda mais consistente. Mas, ao longo dos últimos anos,
as fontes renováveis têm perdido progressivamente espaço em nossa matriz. De
88,9% em 2011, para 84,3% em 2012 e 79,3% em 2013 (dos quais 70,6% de origem
hidráulica). Embora a energia eólica tenha se tornado competitiva em nosso
país, permanecemos perigosamente estacionados em ponto morto quando o assunto é
energia solar.
Enquanto países como China, Alemanha e Estados Unidos
desenvolvem rapidamente novas tecnologias nessa direção, o Brasil – país do
mundo com maior exposição territorial à radiação do sol – parece ignorar o
óbvio: está em curso uma corrida tecnológica internacional para tornar a
energia solar eficiente e competitiva. Se não sairmos da inércia, estaremos
condenados, num futuro próximo, a adquirir produtos solares importados, embora
tenhamos matéria-prima abundante. Outro ponto importante é a indiferença dos
governantes em relação à eficiência energética. Faltam compromisso, campanhas
educativas e punição exemplar para o desperdício. Avançamos na direção da
microgeração distribuída, quando qualquer pessoa interessada em instalar por
conta própria uma fonte limpa e renovável de energia (pequenos aerogeradores ou
telhados solares, por exemplo) tenha assegurado o direito de obter descontos na
conta de luz em função da energia que passará a gerar para si e (se houver
excedente) para a distribuidora local. O problema é que o governo não
transformou isso em política pública, não há campanhas divulgando essa
possibilidade e as distribuidoras locais de energia entravam a instalação dos
relógios digitais que permitem o funcionamento do sistema, aparentemente
incomodadas com a “concorrência” dos microgeradores. Qual a proposta do
candidato(a) para a ampliação inteligente da oferta de energia? Que critérios
irão nortear os investimentos no setor? Como a Petrobras – que desde 2001 se
assume não mais como uma companhia de petróleo mas sim como uma companhia de
energia – participará de forma criativa desse esforço? Será uma companhia de
petróleo ou uma companhia de energia?
- Transportes: Embora apontados
por alguns economistas como medidas necessárias, a redução do IPI para
automóveis e os subsídios a gasolina promoveram impactos importantes sobre a
mobilidade e a saúde dos brasileiros. Estudos promovidos pela Fundação Getúlio
Vargas de São Paulo (leia aqui) e da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro
(leia aqui) revelam os custos diretos e indiretos da proliferação
indiscriminada da frota automobilística nas cidades brasileiras. Além disso, é
gigantesca a demanda de recursos na direção do transporte público de massa,
eficiente, barato e rápido. Na área dos combustíveis, a política fiscal que
protege a gasolina e o diesel teve efeito devastador sobre etanol, combustível
de origem vegetal, menos poluente. O Brasil também sobretaxa carros elétricos e
híbridos (que se multiplicam rapidamente no exterior) e não estimula a produção
nacional desses veículos, mais eficientes e menos poluentes. Qual a política do
candidato(a) para o setor de transportes e de combustíveis? Que investimentos
pretende fazer na direção do transporte individual e coletivo?
São algumas questões – dentre tantas outras – que
o modelo de disputa em segundo turno permite abordar de forma menos apressada e
mais responsável.
* André Trigueiro
é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe-UFRJ onde hoje
leciona a disciplina geopolítica ambiental, professor e criador do curso de
Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livro Mundo Sustentável – Abrindo
Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um
dos autores dos livros Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia,
lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, pela Editora FEB,
em 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor chefe do programa Cidades e
Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador
voluntário da Rádio Rio de Janeiro.
Fonte: Mundo
Sustentável
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