O ser humano provoca a sexta
extinção em massa da fauna do planeta.
A extinção em massa da
fauna não é nenhuma novidade: ocorreram cinco nos 600 milhões de anos
em que os animais povoam a Terra, causadas por vários tipos de catástrofes
planetárias como o vulcanismo intenso, os impactos de meteoritos e outros ainda
não esclarecidos. A novidade da sexta extinção da história do planeta, a que
estamos vivendo agora, é que a causa somos nós, os seres humanos. Em certo
sentido, somos piores que um meteorito.
A reportagem é de Javier Sampedro, publicado
pelo jornal El País, 24-07-2014.
Os últimos dados, apresentados em uma coletânea
de ensaios na revista Science, são terríveis, com 322 espécies
de vertebrados terrestres extintos desde o ano de 1500, e com o resto sofrendo
uma redução média de 25% no número de indivíduos, o que, na verdade, é pior que
as extinções por seu efeito nos ecossistemas. O quadro é ainda mais complicado
entre os invertebrados, com declínios de 45% na população de 2/3 das espécies
examinadas. Os cientistas criaram o termo defaunação (semelhante a
desflorestação) para se referir a esse grave fenômeno.
A extinção é tão conatural à evolução
biológica quanto a morte é para a vida: as espécies nascem e morrem,
assim como os indivíduos. Mas ocorreram cinco extinções nos 600 milhões de anos
de história animal que se destacam por seu poder devastador. A pior de todas
não foi a mais popular – a dos dinossauros -, mas outra que ocorreu 200 milhões
de anos antes: a extinção do período Pérmico, que varreu do
mapa metade não apenas das espécies, mas das famílias que abarcam milhares de
espécies. Os braquiópodos e os corais se salvaram nos pênaltis, mas 70% de
nossos ancestrais vertebrados não tiveram tanta sorte.
Os geólogos ainda não chegaram a coincidir sobre
suas causas: pode ter sido por uma crise de temperatura, com a superfície
marinha superando os 28 graus e arruinando o estilo de vida dos animais que
viviam aí, e depois destroçando todo o resto em uma cascata autoalimentada e
catastrófica. Mas também está documentada uma mudança brusca no ciclo global do
carbono em que se baseia toda a biologia. Também entraram em erupção os vulcões
da Sibéria e, sobretudo, na época foi formado o supercontinente
Pangea, que abarcava todos os atuais em uma única massa de terra. Na geologia,
quando as coisas começam a mudar, não param no meio do caminho.
“Claramente a defaunação é tanto um componente
ubíquo da sexta extinção em massa do planeta quanto um dos principais eixos
impulsionadores da mudança ecológica global”, afirma RodolfoDirzo,
da Universidade de Stanford na Califórnia, e o primeiro autor de um dos artigos
apresentados na revista Science, com o título sucinto de
‘Defaunação no antropoceno’. O antropoceno não é um período geológico
convencional, mas foi adotado por especialistas em química atmosférica, como o
prêmio Nobel Paul Crutzen, para denominar a época em que a
atividade humana começou a gerar efeitos globais. Dirzo e seus colegas
consideram que o antropoceno começou há uns 500 anos, embora existam outras
opiniões.
“Nos últimos 500 anos”, dizem os cientistas da
Califórnia, Rio Claro (Brasil), México, Oxfordshire e Londres, “os humanos
desencadearam uma onda de extinção, ameaça e declínio das populações locais de
animais que pode ser comparada, tanto em velocidade quanto em magnitude, com as
cinco extinções em massa anteriores da história da Terra”. Nas escalas dos
geólogos, 500 anos é realmente um piscar de olhos: nem sequer os efeitos do
impacto de um meteorito têm uma duração tão curta, muito menos a formação do
supercontinente Pangea.
A extinção em massa que acabou com os dinossauros
é a que mais captou a imaginação popular.
A extinção em massa que acabou
com os dinossauros – menos seus descendentes voadores, as aves – é a que mais
captou a imaginação popular, com dois Steves (Jay Gould e Spielberg) entre os
principais coadjuvantes. Seu nome técnico é “extinção K-T”, ou
limite entre o Cretáceo (K, por kreide, giz ou calcário em alemão) e o
Terciário (T). O que pouca gente se lembra é que não foram extintos apenas os
dinossauros, mas também 80% das espécies animais existentes naquele momento, há
quase 66 milhões de anos. Adeus aos amonóides, aos belemnites e à maioria dos
corais. Dos inoceramus ninguém se lembra. A razão desta destruição em massa,
terceira em importância na história do planeta, foi provavelmente um enorme
meteorito que caiu perto do México nessa época, um impacto que eclipsou o sol
por éones. Mas também houve um terrível período de vulcanismo, em um novo
exemplo do caráter “pé-frio” dos eventos geológicos.
O termo defaunação quer enfatizar que o problema
não se limita à extinção de espécies inteiras, mas que abarca também o
desaparecimento de populações locais e a redução do número de indivíduos de
cada população. “Embora as extinções tenham uma grande importância evolutiva”,
explica Dirzo, “o declínio do número de indivíduos nas
populações locais, e as mudanças na composição de espécies de uma comunidade,
costumam causar um maior impacto imediato na função dos ecossistemas”. Os
autores reconhecem que as extinções têm mais impacto nos meios de comunicação,
mas ressaltam que “são apenas uma pequena parte da perda real de biodiversidade”.
Segundo diferentes estimativas, entre 16% e 33%
de todas as espécies vivas de vertebrados estão ameaçadas ou “em perigo” de
forma global, e somente nos últimos 500 anos, 322 foram extintas. Pior ainda, o
número de indivíduos foi reduzido em uma média de 28%, com casos extremos como
os elefantes, cuja população diminui a tal ritmo que sua extinção em breve é
algo quase seguro. O elefante é um dos pouquíssimos animais com autoconsciência
– se reconhecem no espelho – que nos acompanham neste vale de lágrimas
evolutivo, junto com o golfinho e os grandes macacos.
“O declínio destas espécies animais afetará em
cascata o funcionamento dos ecossistemas”, asseguram Dirzo e
seus colegas, “e finalmente o bem-estar humano”.
Mesmo que seja só por causa disto, a defaunação
deverá ganhar importância nos próximos anos.
Fonte: IHU On-line
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