Degradação avança sobre áreas
protegidas.
Entre 2007 a 2013, 30% das áreas afetadas
pela degradação florestal estavam localizadas dentro de áreas que deveriam
estar protegidas, como Terras Indígenas e Unidades de Conservação. Um dos
principais facilitadores para esta degradação é a falta de gestão nessas áreas.
A criação de áreas de preservação, que inclui
Unidades de Conservação (UC’s) e territórios destinados a populações
tradicionais, são os instrumentos mais eficazes conhecidos para preservar a
integridade das florestas. Mas a falta de gestão destas áreas acaba por reduzir
seu efeito, já que, amparados pelo descaso político e a impunidade, madeireiros
e outros exploradores ilegais transitam livremente, deixando um rastro de
destruição e violência.
Entre 2007 a 2013, segundo levantamento do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) analisado pelo Greenpeace,
foram degradados ou desmatados quase 16 milhões milhões de hectares (ha) na
Amazônia. A perda de vegetação em decorrência dos incêndios florestais, que em
90% dos casos, segundo ICMBio, são causados por interferência humana, chegou a
mais de 82 milhões de hectares no mesmo período.
Quantificação anual (2007-2013) dos dados Prodes,
Degrad e dados das queimadas florestais na Amazônia. Foto:© Greenpeace
“Áreas Protegidas”?
Em termos de áreas degradadas – onde a cobertura
florestal ainda não foi totalmente removida – a extensão superou os 10 milhões
de hectares no período de 2007-2013, sendo que 30% desse total ocorreu em áreas
que tecnicamente deveriam ser “Protegidas”[1]. Esse padrão de perda florestal é
característico da exploração madeireira ilegal que, segundo Imazon, apenas
entre agosto de 2011 e julho 2012 alcançou 78% e 54% da área total explorada,
no Pará e Mato Grosso respectivamente, os maiores produtores de madeira nativa
no Brasil.
Relação da Degradação com áreas Protegidas entre
2007-2013. Foto: © Greenpeace
Um estudo do Tribunal de Contas da União (TCU), de
2013, avaliou a implementação e gestão das Unidades de Conservação da Amazônia
e concluiu que, de um total de 247 unidades apenas 4% apresentaram alto grau de
implementação e gestão. Cerca de 40% apresentaram baixo grau de implementação e
56% médio. Segundo verificou o Greenpeace, o bloco de áreas protegidas
avaliadas como tendo um dos mais baixos índices de implementação e gestão
(Bloco do Xingu – APA Triunfo do Xingu e Flota do Iriri) abrange a APA Triunfo
do Xingu, no Pará, a unidade de conservação que concentrou o maior índice de
degradação ambiental, com quase 46 mil hectares degradados, entre 2007 e 2013.
Degradação Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo
do Xingu no Estado do Pará no período 2007-2013. Foto: © Greenpeace
Um dos fatores que contribui para esta
“deficiência” em gestão é a falta de recursos humanos para realizar o serviço
“in loco”. No Pará, por exemplo, em 2013 a Diretoria de Áreas Protegidas (Diap)
da Sema/PA contava com 138 servidores, dos quais 73 estavam voltados à gestão
direta das UCs, ou seja, 293,1 mil hectares para cada funcionário supervisionar.
Desse total, 45% eram temporários e apenas 28 estavam lotados nas bases das
UCs. Em 2014 o quadro piorou: o número de funcionários caiu de 73 para 35,
sendo 23% temporários, onde os funcionários lotados nas UCs somam apenas 10, ou
seja, mais de 2 milhões de hectares por funcionário em campo.
A situação financeira dos órgãos que administram
estas áreas também é preocupante. Para se ter uma ideia, enquanto o principal
órgão gestor de áreas protegidas dos Estados Unidos (National Park Service)
dispõe de um orçamento de US$ 7.806 por km²,, para administrar uma área total
de 340 mil km²,, o ICMBio, órgão brasileiro responsável pela gestão de 750 mil
km²,, possui um apenas US$ 277 por km²,. No Canadá e no México, que tem áreas
protegidas de aproximadamente 225 mil km², cada, o volume de recursos aplicados
varia entre US$ 2.000 e US$ 2.500 por km²,.
“Criar unidades de conservação é importante, mas a
homologação das áreas, por si só, não garante sua manutenção. Isso precisa vir
acompanhado da efetiva implementação, com planejamento e ferramentas adequados
para uma gestão responsável”, afirma Claudia Caliari, da campanha Amazônia do
Greenpeace.
Somente no bioma Amazônico, cada funcionário da
ICMBio é responsável por cerca de 3.260km², sendo que 84% UCs da Amazônia (90
de 107 UCs) contam com menos de 5 servidores lotados, com média de um ou dois
servidores por área. Este é o caso da Esec Terra do Meio/Pará, com área de 33,7
mil km2 – o equivalente a mais de 3 milhões de campos de futebol ou quase 6
vezes a área do Distrito Federal, que conta com apenas dois servidores. A
unidade está localizada no arco do desmatamento, região que sofre grande
pressão pela exploração legal de madeira e grilagem de terra. Há ainda seis
unidades que não possuem servidor lotado.
Violência e destruição
O abandono destas áreas pelo poder público tem
fomentado a ação de todo o tipo de atividade ilegal no bioma amazônico, que
traz à reboque altas doses de violência, mortes e destruição.
Tal fato levou o Brasil a ser vergonhosamente
reconhecido, em 2014, como o país mais perigoso para a defesa do direito à
terra e ao meio ambiente, com cerca de 50% das mortes registradas por este
motivo no mundo. A falta de condenações contribui para a ação destes grupos. De
acordo com um levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de 1985 a 2013
foram registradas 699 assassinatos na Amazônia. De todos esses crimes, apenas
35 foram julgados, condenando 20 mandantes e 27 executores.
No caso de populações tradicionais, como
quilombolas, indígenas e ribeirinhos, que tem a sobrevivência ancorada na
preservação da floresta, a ação desenfreada de madeireiros, mineradores e a
expansão de latifúndios sobre as florestas tem impacto profundo em sua
subsistência, assim como sobre sua dignidade.
Segundo os dados do Inpe, dos 10.292.300 hectares
degradados entre 2007 e 2013, cerca de 26% (mais de 2,6 milhões de hectares)
estavam dentro de Territórios Indígenas (TI’s). Vale ressaltar que, segundo a
World Resources Institute, por estarem em melhores condições de preservação, as
florestas comunitárias indígenas detém 36% mais carbono por hectare do que
outras áreas da Amazônia brasileira. A TI Parque do Xingu (MT) foi o mais
afetado neste período com mais de 370 mil hectares degradados.
Degradação TI Parque do Xingu no Estado do Mato
Grosso. Foto: © Greenpeace.
Além disso, a fragmentação das terras em áreas
menores e isoladas ameaça a continuidade biológica e cultural dos povos
tradicionais, pois limita ou impede o contato entre as comunidades/aldeias e
expõe as populações à linha de frente de atividades extrativas ilegais. Nesse
contexto cria-se um cenário de pressão, violência e impunidade.
“As estimativas, apesar de claramente alarmantes,
não conseguem capturar a real extensão dos danos ao meio ambiente e para a
sociedade, que vão desde perdas irreparáveis da biodiversidade ao aumento das
emissões de gases do efeito estufa e a perda da identidade cultural de uma
nação”, observa Claudia Caliari. “É um desestímulo aos trabalhadores que tentam
legitimar o efetivo Manejo Sustentável e uma perda para as economias locais e
de todo o país”, completa. Não é de se estranhar que justamente as duas “áreas
protegidas” nacionais mais degradadas estejam localizadas justamente nos dois
Estados com maior produção de madeira nativa do Brasil, Pará e Mato Grosso.
A degradação em proporção tão significante dentro
de áreas que deveriam ser protegidas mostra a fragilidade e a falta de
governança na Amazônia. Após três anos de silêncio o governo finalmente
publicou dados oficias sobre a degradação. Esta falta de transparência dos
números é mais um indício da falta de comprometimento e interesse do governo em
manter uma gestão eficiente no combate à perda de área florestal no Brasil. Se
queremos combate-la temos que ir direto ao ponto, afinal essa perda florestal é
boa pra quem?
[1] Unidades de Conservação e os Territórios de
Ocupação Tradicional (Terras Indígenas ou Territórios Remanescentes de
Quilombo).
Fonte: Greenpeace
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