Há algo além de oxigênio no ar de
Nova Délhi.
por Neeta
Lal, da IPS
O número de veículos particulares na Índia chegará
a 400 milhões até 2040. Em relação aos 170 milhões atuais, se multiplicará por
cinco as emissões de gases contaminantes liberados na atmosfera por automóveis
e caminhões. Foto: Neeta Lal/IPS.
Nova Délhi, Índia, 27/2/2015 – Aastha Sarma, de 15
anos, não pode fazer o mesmo que suas amigas que vão a uma escola particular na
capital indiana. A doença pulmonar obstrutiva crônica que sofre a obriga a
permanecer confinada em sua casa. A origem de seu problema provavelmente seja o
ar extremamente contaminado de Nova Délhi.
Nos últimos três anos, Sharma passou de um
medicamento a outro, perdeu atividades sociais e foi obrigada a seguir uma
dieta limitada, que não inclui seus alimentos preferidos. Além dos livros e do
almoço, em sua mochila carrega um nebulizador para enfrentar os ataques
ruidosos, dos quais já tem medo. “Estou cansada de tudo o que posso e não
posso. Quando terei uma vida livre?”, perguntou a jovem.
A mesma pergunta fazem muitos jovens obrigados s
suportar as consequências do ar extremamente poluído nessa cidade de 18 milhões
de habitantes, considerada a pior do mundo nesse aspecto. Um estudo da
organização Greenpeace Índia mostra que a qualidade do ar em cinco grandes
escolas da capital é má.
“A contaminação do ar nas escolas de Nova Délhi é
alarmante, e as crianças o respiram constantemente”, afirmou Aishwarya
Madineni, ativista do Greenpeace. “O novo governo deve reconhecer a severidade
do problema”, destacou. Outro estudo, realizado em 2014 com 11.628 estudantes
de 36 escolas localizadas em diferentes partes da cidade, concluiu que uma em
cada três crianças tinha as funções respiratórias diminuídas devido à
contaminação por partículas.
Em um informe enviado à Suprema Corte de Justiça, a
Autoridade para a Prevenção e o Controle da Poluição Ambiental pediu urgência a
esse tribunal no sentido de determinar a todas as escolas de Nova Délhi que
fechem nos dias com maior risco para a saúde.
Estudos da Agência de Proteção Ambiental dos
Estados Unidos indicam que, quando as crianças ficam expostas à matéria
particulada – um complexo de ácidos (nitratos e sulfatos), químicos orgânicos,
metais e partículas de pó de 2,5 mícrons –, pode ocorrer um conjunto de
enfermidades respiratórias mortais. A Agência Internacional de Pesquisa sobre o
Câncer classificou em 2013 a contaminação por matéria particulada como
cancerígena para os humanos e a considerou “a principal causa das mortes por
câncer”.
“Além das membranas mucosas e das cavidades nasais,
a poluição do ar também irrita olhos e pele. A exposição a altos graus de
contaminação pode causar doenças graves em longo prazo”, alertou Abha Sood,
oncologista e consultora no Hospital Max, de Nova Délhi. A exposição de
mulheres grávidas a prolongados períodos de contaminação pode causar má
formação nos órgãos do feto, acrescentou.
Sood explicou que “a matéria particulada com menos
de dez mícrons de diâmetro é especialmente nociva, pois se aloja profundamente
no pulmão e penetra na corrente sanguínea, elevando a vulnerabilidade das
pessoas em relação ao câncer e a cardiopatias”.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que a
contaminação neste país é das piores do mundo e atenta contra a expectativa de
vida. Segundo um estudo de alguns economistas das universidades
norte-americanas de Harvard e Yale, esse problema reduz em três anos a vida das
pessoas.
Cerca de metade da população da Índia,
aproximadamente 660 milhões de pessoas, vive em regiões onde a matéria
particulada supera a média nacional do que se considera seguro, diz o
documento. Se a Índia conseguir reverter a tendência, poderá salvar 2,1 bilhões
de anos de vida para sua população. Além disso, esse país registra a maior
quantidade de mortes por doenças respiratórias crônicas e asma no mundo,
segundo a OMS, que também aponta que na Índia estão 13 das 20 cidades mais
poluídas.
Aproximadamente, 1,5 milhão de pessoas morrem ao
ano nesse país devido à contaminação interna e externa, o que também contribui
para cardiopatias agudas e crônicas, a principal causa de morte na Índia.
A Autoridade para a Prevenção e o Controle da
Poluição Ambiental também pediu à Suprema Corte que aumente o imposto sobre
veículos que utilizam gasóleo e que proíba os automóveis particulares de
circularem quando a poluição ambiental for excessiva. Também recomendou que os
veículos com mais de 15 anos de vida sejam retirados de circulação e que se
instale purificadores de ar nos mercados de maior movimento, além de tomar
medidas enérgicas contra a queima de lixo.
Mas a implantação dessas medidas é irregular, no
melhor dos casos. De fato, haverá 400 milhões de veículos na Índia em 2040, bem
acima dos atuais 170 milhões, segundo estimativas do Instituto de Recursos e
Energia da Universidade da Califórnia e da Direção de Recursos Aéreos da
Califórnia. Isso poderia causar uma crise na saúde, pois o grau de matéria
particulada de 2,5 mícrons de diâmetro triplicaria e os gases contaminantes
muito reativos emitidos por automóveis e caminhões aumentariam em cinco vezes,
segundo o estudo.
O custo da contaminação já representa uma pesada
carga para a terceira economia da Ásia. Um estudo do Banco Mundial de 2013
destaca como a contaminação e outros problemas ambientais custam à Índia US$ 80
bilhões ao ano, quase 6% do produto interno bruto. Cerca de 23% da mortalidade
infantil e 2,5% da de adultos pode ser atribuída à degradação ambiental,
acrescenta o informe.
A contaminação do ar é a quinta causa de mortes na
Índia. Entre 2000 e 2010, aumentou seis vezes, deixando 620 mil mortos de forma
prematura, segundo o Centro para a Ciência e o Ambiente, com sede em Nova
Délhi.
Outro estudo, divulgado esta semana, se concentra
na contaminação causada pelas centrais elétricas movidas a carvão. Uma
auditoria de dois anos, realizada em 47 centrais de energia térmica, estatais e
privadas, mostra que suas instalações estão entre as mais ineficientes do
mundo, operando, em média, entre 60% e 70% de sua capacidade instalada.
Também se descobriu que as emissões de dióxido de
carbono são 14% maiores do que as de instalações semelhantes na China. Além
disso, 76% das centrais não cumpriam os objetivos de utilização das cinzas
voláteis, impostos pelo Ministério de Ambiente e Silvicultura.
Como o governo não parece estar interessado em
criar um plano de ação que envolva todos os atores para frear e reverter o
problema da poluição do ar, parece que Sharma e seu nebulizador serão
inseparáveis por mais um bom tempo.
Fonte: ENVOLVERDE
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