O desmatamento causa estragos em
comunidades pobres do Pacífico sul.
por
Catherine Wilson, da IPS
Pequenos proprietários de terras nas Ilhas Salomão
e em Papua Nova Guiné sofrem o impacto ambiental e social do desmatamento.
Foto: Catherine Wilson/IPS.
Sydney, Austrália, 3/12/2014 – O desmatamento
desenfreado em Papua Nova Guiné e nas Ilhas Salomão, onde a maior parte do
território está coberta por uma espessa selva tropical, agrava as penúrias, a
insegurança e os conflitos nas zonas rurais.
Paul Pavol, dono de um terreno no distrito de
Pomio, na província insular de Nova Bretanha do Leste, no nordeste da ilha
principal de Papua Nova Guiné, disse à IPS que o desmatamento causou “um dano
ambiental permanente no solo e na floresta, da qual dependem nossas comunidades
para obter água, materiais de construção, medicamentos e alimentos”.
Há quatro anos a companhia madeireira multinacional
da Malásia conseguiu dois contratos de arrendamento agrícola especial no
distrito, mas os proprietários locais afirmam que eles nunca consentiram e,
após várias ações legais, o Tribunal Nacional ordenou em novembro ao promotor
cessar toda atividade na área.
Segundo a organização Global Witness, a companhia
desmatou sete mil hectares de selva e exportou toras num valor superior a US$
50 milhões. “Nunca demos nosso consentimento, livre e informado para os
contratos sobre nossas terras, e, naturalmente, não concordamos em ceder nosso
território por 99 anos a uma empresa madeireira”, destacou Pavol.
Em 2012, um terço das exportações de madeira de
Papua Nova Guiné procedeu de terras sujeitas a esse tipo de contrato de
arrendamento, segundo o Instituto de Assuntos Nacionais, apesar de o propósito
declarado desses contratos ser o de facilitar projetos agrícolas em beneficio
da população local. Pavol também denunciou violações de direitos humanos mediante
“esquadrões antidistúrbios da polícia para proteger a companhia e intimidar e
aterrorizar nossas comunidades”.
Uma investigação realizada no ano passado pela
organização Eco-Forestry Forum, junto com órgãos do governo e da polícia,
concluiu que oficiais contratados pela companhia para frear a oposição local
realizaram graves ataques contra os moradores locais.
Papua Nova Guiné tem a terceira maior selva do
mundo, que cobre cerca de 29 milhões de hectares, mas também é o terceiro
exportador de madeira tropical. A Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (FAO) prevê que se perderá 83% da floresta
comercialmente viável até 2021 devido ao corte comercial, à mineração e ao
desmatamento para dar lugar a plantações de palma.
Papua Nova Guiné se comprometeu na Cúpula de
Florestas da Ásia Pacífico, realizada em Sydney, a criar planos para acabar com
o desmatamento em uma década, mas a população indígena não ficou convencida.
“Dentro de dez anos quase toda a selva acessível estará cortada e a raiz do
problema é a sistemática corrupção endêmica, lamentou o porta-voz da
organização Act Now.
“Não temos penas duras para quem viola a lei e esta
não é cumprida”, acrescentou Pavol, uma opinião compartilhada pela organização
Chatham House (Instituto Real de Assuntos Internacionais), com sede em Londres.
A devastação ambiental e a violência relacionada
com o desmatamento aumentam as dificuldades em Pomio, um dos distritos de menor
desenvolvimento da Nova Bretanha do Leste, onde não há serviços de saúde,
saneamento, água e nem estradas decentes. A esperança de vida local é de 45 a
50 anos, e a mortalidade infantil chega a 61 falecimentos para cada mil
nascidos vivos, bem maior do que a média nacional de 47 para mil.
Na vizinha Ilhas Salomão, onde 2,2 milhões de
hectares de florestas cobrem mais de 80% do território, a extração de madeira
foi quase quatro vezes maior do que a taxa sustentável de 250 mil metros
cúbicos por ano. A madeira representou 60% da renda nacional com exportações,
mas é pouco provável que continue devido à previsão do Projeto de Gestão de
Florestas das Ilhas Salomão, de que a selva acessível se esgotará no próximo
ano.
A grande demanda por matéria-prima das crescentes
economias asiáticas é o grande motor do desmatamento nos dois países. O setor é
dominado por empresas da Malásia, e a China é seu principal destino.
As práticas inescrupulosas, como conseguir
autorização para extrair madeira mediante subornos e descumprir as tarefas de
corte determinadas, estão generalizadas. Mais de 80% do comércio de madeira
desses dois países são produto de desmatamento, e a exportação ilegal chegou a
US$ 800 milhões em 2010, segundo um informe do Escritório das Nações Unidas
Contra a Droga e o Crime (UNODC).
Desde 2003 as companhias internacionais mais
envolvidas com a extração de madeira tiveram acesso a 5,5 milhões de hectares
de florestas em Papua Nova Guiné, além dos 8,5 milhões já destinados a essa
atividade mediante aquisições de contratos de corte fraudulentos, segundo a
Comissão de Investigação e um estudo do Instituto Oakland, com sede na
Califórnia, Estados Unidos.
O UNODC ressalta a convivência entre as redes
transnacionais de crime organizado, as companhias madeireiras, funcionários
públicos e dirigentes políticos. Funcionários dos órgãos florestais nos países
em desenvolvimento carecem de recursos humanos e técnicos para supervisionar de
forma adequada as operações de extração de madeira e estão mal equipados para
lidar com as redes criminosas.
A lavagem de dinheiro que está associada à atividade
também é um problema, a polícia federal australiana estima que são lavados US$
170 milhões ao ano procedentes de atividades criminosas em Papua Nova Guiné,
por meio de bancos e investimentos imobiliários na Austrália. Este país aprovou
a Lei de Proibição de Corte Ilegal, mas não existe algo semelhante no principal
mercado: a China.
A organização Transparência Ilhas Salomão pontuou
que é preciso fortalecer a capacidade do governo para prestar contas e educar
as comunidades locais sobre seus direitos, a legislação e medidas que possam
ser tomadas em nível local. A desigualdade e o pouco desenvolvimento humano
entre as populações rurais pobres se arraigam pela incapacidade dos dois países
em canalizar fundos para construir infraestrutura, serviços básicos e
oportunidades econômicas mais equitativas.
Em Papua Nova Guiné, um dos países mais desiguais,
com Índice Gini de 50,9%, a pobreza aumentou de 37,5% em 1996, para 39,9% em
2009, segundo o Banco Mundial. Nas Ilhas Salomão a extração de madeira é uma
das principais fontes de renda há 20 anos, com participação no produto interno
bruto que chegou a 10% em 2011.
Mas o Fórum das Ilhas do Pacífico diz que “o
crescimento que depende dos recursos não chega aos mais favorecidos”, pois o
país está em 157º lugar, entre 187 países listados, por seu desenvolvimento
humano.
Fonte: Envolverde
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