Filme alerta para os riscos de
exposição à radiação ionizante na inspeção de segurança.
A obra ‘Revista da
Morte’, produzida pelo Conselho Nacional de Técnicos em Radiologia
(CONTER), foi selecionada para a edição 2014 do International
Uranium Film Festival, a maior mostra de cinema do mundo sobre energia
nuclear. O anúncio oficial e lançamento da programação ocorre no próximo dia 30
de janeiro, no Rio de Janeiro.
A reportagem-documentário Revista da Morte
desenvolve uma tese premente sobre os efeitos biológicos da radiação ionizante
no organismo humano. Principalmente, sobre as crianças. No caso retratado pelo
filme, o uso de radiação ionizante na inspeção de segurança dos presídios de
Vila Velha e Viana, no Espírito Santo, pode ter causado 22 abortos em série.
Segundo a presidenta do CONTER Valdelice Teodoro,
a busca pelo menor custo e o descumprimento das normas de segurança está
fazendo vítimas no Brasil. “A comercialização e uso dos equipamentos emissores
de radiação ionizante no Brasil está longe do ideal, não há controle
efetivo por parte do governo e das autoridades responsáveis. Tanto nos
hospitais quanto nos portos, aeroportos e presídios, os trabalhadores,
pacientes e clientes são expostos à radiação sem o menor controle das doses
absorvidas”.
O Uranium Film Festival é a primeira mostra de
cinema no mundo dedicado a todas as questões da cadeia nuclear: da mineração de
urânio, e de outros minerais radioativos, bombas atômicas, usinas nucleares,
medicina nuclear ao lixo atômico. A diretora do evento, Márcia Gomes de Oliveira,
acredita que um evento deste gênero é a melhor maneira de levar filmes
‘nucleares’ ao grande público. “O horror das bombas atômicas e aqueles que
sofreram com elas, os acidentes nucleares, como Three Mile Island, Chernobyl e
Goiânia, nunca devem ser esquecidos – nem repetidos. Esse é o nosso espírito ao
iniciar a organização de cada festival”, conta.
“Por mais de seis décadas, vários
curtas-metragens e documentários sobre questões nucleares não podem ser
exibidos devido à pressão política. O International Uranium Film Festival, que
está atualmente na cidade, forneceu uma plataforma de exibição destes filmes
para o grande público”, escreveu o New Indian Express sobre a passagem do
festival na Índia em 2013.
Segundo o diretor do filme, o jornalista Laércio
Tomaz, o problema revelado na obra é sistemático e se repete em todo o país.
“Para entrar em operação, um serviço de inspeção e segurança que utiliza
radiação ionizante precisa ser aprovado pela Comissão Nacional de Energia
Nuclear (CNEN), a fim de garantir a segurança de quem for exposto. Entretanto,
em todos os presídios do Brasil, é possível encontrar essas máquinas
funcionando, sem autorização ou certificação de qualquer natureza. Enquanto
isso, as pessoas morrem por falta de informação”, lamenta.
Mas, qual o problema?
A tese de que a radiação ionizante de baixa
intensidade não é nociva à saúde humana já foi derrubada em diversos artigos
científicos de renome internacional. É consenso no meio acadêmico que a
exposição à radiação sem um rigoroso controle das doses absorvidas provoca
alterações do material genético das células e pode causar problemas de saúde,
como câncer, anemia, pneumonia, falência do sistema imunológico, problemas na
pele, entre outras doenças não menos graves, que podem induzir ao infarto ou
derrame.
Entre os grupos de risco, o principal é o das
gestantes. Uma grávida não pode ser exposta, principalmente, se estiver no
primeiro trimestre da gravidez, período em que o feto tem maior nível de
radiossensibilidade. Dependendo da exposição, a radiação pode perdurar em uma
contagem significativa, gerando risco de efeitos biológicos para a criança.
De acordo com a Portaria ANVISA n.º 453/98, os
limites pessoais determinados pela legislação são de 50 milisieverts (mSv) de
dose efetiva por ano, devendo possuir uma média de 20 mSv em 5 anos, além de
valores intermediários durante os meses, que traduzem níveis sujeitos à
investigação e/ou intervenção laboratorial (exames citogenéticos) e notificação
às autoridades reguladoras. Para monitorar essas doses, o profissional que lida
diretamente com o equipamento deve usar um dispositivo chamado dosímetro. Nos
aeroportos, os operadores de escâneres não fazem dosimetria ou uso de qualquer
outro Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Há riscos para qualquer indivíduo exposto
ocupacionalmente, mesmo que o equipamento produza baixas taxas de dose, em
função das características de ocorrência dos efeitos estocásticos.
“A radiossensibilidade celular está diretamente
relacionada com a taxa de reprodução do grupo celular. Quanto maior a taxa de
reprodução, maior a radiossensibilidade. Então as células da pele, tireóide,
gônadas e cristalino estão mais suscetíveis aos efeitos biológicos das
radiações ionizantes.
Portanto, devem estar protegidas no momento da exposição.
Contudo, atualmente, os operadores desses equipamentos na área de segurança
trabalham sem nenhum cuidado ou acompanhamento à saúde”, esclarece Valdelice
Teodoro. É recomendado que os operadores de escâneres façam exame de sangue com
contagem de plaquetas a cada seis meses e, ao sinal de queda, o profissional
seja afastado preventivamente até o reestabelecimento das taxas.
Quem faz o festival
O Festival Internacional de Filmes sobre Energia
Nuclear – Uranium Film Festival – é realizado pelo Arquivo Amarelo, uma
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público.
Amarelo é a cor do elemento radioativo urânio e a
cor do sinal de alerta. O projeto do Arquivo Amarelo é criar a primeira
cinemateca do Brasil e da América Latina sobre a temática nuclear e
disponibilizar os filmes principalmente para escolas e universidades.
Até o momento, a maioria dos documentários sobre
este assunto tem sido produzido por países não lusofônicos, geralmente em
inglês, alemão ou francês. Outro objetivo do projeto Arquivo Amarelo é traduzir
estes filmes para a língua portuguesa e, ao mesmo tempo, traduzir as produções
lusofônicas para outras línguas.
O Arquivo Amarelo é um projeto para a eternidade,
porque irá guardar o saber sobre os riscos radioativos para muitas gerações –
uma necessidade das sociedades que produzem diariamente lixo atômico, gerando
riscos para milhares de anos, como está muito bem demonstrado no filme “Into
Eternity” (2010), longa metragem dinamarquês, vencedor do 1º Festival
Internacional de Filmes sobre Energia Nuclear, em 2011.
Fonte: CONTER
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