Ano novo, tragédia velha.
por Redação do Greenpeace
Em decisão liminar, STF suspende a publicação
da nova “Lista Suja” do Trabalho Escravo, deixando trabalhadores e o mercado
vulneráveis a empresas infratoras.
A publicação da nova versão da “Lista Suja” do
Trabalho Escravo, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que deveria
acontecer no último dia 30, foi suspensa graças a uma ação movida pela
Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) junto ao Supremo
Tribunal Federal (STF). A decisão liminar foi expedida pelo ministro Ricardo
Lewandowski, em caráter emergencial, durante o recesso de Natal. Com isso,
empresas e instituições financeiras que utilizam a ferramenta para eliminar o
trabalho escravo de seus negócios ficam descobertas até que o STF julgue em
definitivo o processo.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade 5209 (Adin 5209) foi protocolada no STF em 22 de dezembro de 2014.
Mesmo com o recesso de Natal, em apenas cinco dias (27), o ministro Lewandowski
deferiu uma liminar determinando a suspensão da publicação do cadastro. Com a
decisão, as portarias interministeriais que regulamentam o processo de inclusão
dos nomes e de divulgação da lista, ficam suspensas. A decisão tem caráter
provisório e pode ser derrubada caso a decisão definitiva do STF seja
desfavorável à ação ou se a liminar for cassada até lá. O tribunal só retornará
do recesso em fevereiro.
“É inadimssível que no início de um novo ano
tenhamos que lidar com uma decisão que representa tudo que há de mais velho e
horrível na história do Brasil”, classifica Rômulo Batista, da campanha da
Amazônia do Greenpeace.
A última lista, publicada em julho de 2014,
continha 609 nomes de empresários flagrados com trabalhadores atuando em
condições análogas a da escravidão. Destes, 380 eram de estados da Amazônia
Legal, sendo que 10% foram multados por desmatamento ilegal nos últimos cinco
anos.
A nova lista, que deveria ter sido publicada no penúltimo dia de 2014,
traria quase 100 nomes adicionais, chegando perto de 700 empregadores que
utilizam mão de obra escrava ou análoga a escravidão, segundo apurou o site Repórter Brasil.
A suspensão aconteceu no mês em que a “lista
suja” recebeu um prêmio da Controladoria-Geral da União (CGU), na
categoria de boas práticas da transparência.
Em nota, a Abrainc informou que agiu contra a
inclusão de suas associadas na lista por considerar as portarias
inconstitucionais, assim com o processo de inclusão dos nomes.
Conceito de Trabalho Escravo na mira do
“progresso”
Decisões como esta do STF colocam o Brasil mais
próximo de seu passado sombrio do que de um futuro promissor. Um tempo em que
empresários que desmatavam, escravizavam e destruíam eram colocados em pé de
igualdade com empresas responsáveis e que respeitavam os direitos socioambientais
do País.
Mas a ofensiva contra a “lista suja” do trabalho
escravo não é exatamente uma novidade. Durante 2014 a chamada bancada ruralista
do Congresso trabalhou intensamente para tentar desconstruir os avanços
garantidos pela PEC do Trabalho Escravo, aprovada no ano passado – depois de 19
anos de debates. A emenda à Constituição possibilita o confisco de terras de
proprietários flagrados com trabalhadores atuando em condição análoga a
escravidão. Mas agora, em sua fase de regulamentação, representantes do agronegócio tentam enfraquecer a proposta.
O projeto de regulamentação apresentado pelo
senador Romero Jucá propõe a retirada dos termos “praticas humilhantes e
degradantes” do conceito oficial de trabalho escravo, além de tornar mais
difícil a inclusão de nomes de proprietários infratores na lista do MTE, que
só poderiam ser inseridos depois de esgotadas as possibilidades de apelação
judicial, o que pode levar até 20 anos no sistema judiciário brasileiro.
Atualmente, basta o empregador ter sido flagrado e autuado em uma operação de
fiscalização do MTE.
Mercado pode ser contaminado pelo
trabalho escravo durante suspensão
As empresas que assinaram o Compromisso Público da Pecuária e a Moratória da Soja utilizam a lista do MTE para manter o
trabalho escravo longe de suas cadeias produtivas, boicotando aqueles que
constam no documento. Da mesma maneira, mais de 400 companhias de diversos
setores utilizam a ferramenta para cumprir o Pacto Nacional pela Erradicação
do Trabalho Escravo.
Dos 609 nomes incluídos na última versão da
lista, a maioria (27%) está no Pará. O Pará foi o estado da Amazônia Legal que
mais desmatou em 2014. De acordo com o PRODES, foram perdidos 1.820 km2 de
florestas no ano passado no estado. Segundo o MTE, a atividade pecuária é
exercida por 40% dos empresários flagrados em todo o País, seguida da produção
florestal (25%) e da agricultura (16%).
Manter fora do mercado empresários que cometem
ilícitos sociais e ambientais deve ser uma prioridade do governo brasileiro.
Mas enquanto a publicação da nova lista encontra-se bloqueada pela justiça, o
mercado pode estar adquirindo, sem saber, produtos de empresas que mantém
trabalhadores em condições análogas a da escravidão.
“A suspensão da publicação da nova lista e a
retirada do site da lista antiga representam uma ameaça real às empresas e
pessoas que não adquirem produtos e serviços de quem se encontra no cadastro.
Por sorte, a última lista, que ficou disponível até 26 de dezembro, foi
amplamente divulgada e ainda pode ser consultada. Afinal, o Brasil ainda é um
País livre”, conclui Rômulo.
Confira a última lista, clicando aqui.
Fonte: Greenpeace
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