quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Ciência avança sobre parte inexplorada dos oceanos.
por Diego Freire, para a Agência Fapesp
Compreender melhor os oceanos – que, apesar de cobrirem 70% da superfície do planeta, formam o ecossistema menos conhecido – é uma questão de sustentabilidade, afirmam cientistas. Foto: Alvaro E. Migotto/Cifonauta.

Agência Fapesp – Apesar de cobrir 70% da superfície do planeta, os oceanos são o ecossistema menos explorado da Terra. Para cientistas, a necessidade de compreender melhor os oceanos é uma questão de sustentabilidade.

“A exploração dos recursos marinhos aumenta cada vez mais, fazendo dos oceanos uma fonte que muitos julgam inesgotável para a satisfação de diversas demandas humanas. É preciso compreender melhor a complexidade da vida marinha para estabelecer uma relação sustentável com ela”, disse Rick Grosberg, diretor do Coastal and Marine Sciences Institute (CMSI) da University of California em Davis (UCD), à Agência FAPESP.

Esforços para avançar no conhecimento sobre a vida marinha, correntes oceânicas e suas relações com a vida em terra firme foram compartilhados por pesquisadores dos Estados Unidos e de instituições do Estado de São Paulo na FAPESP Week California, realizada de 17 a 20 de novembro nas cidades de Berkeley e Davis.

Grosberg falou sobre pesquisas com invertebrados marinhos, incluindo anêmonas, hidrozoários, ascídias e caracóis, e do uso de abordagens genômicas no estudo de suas populações. “Os trabalhos de meu grupo envolvem atividades de campo e de laboratório, com genética molecular, genética populacional e filogenia, além de uma quantidade ainda modesta de modelagem”, disse.

Entre esses trabalhos estão pesquisas em genética da conservação de invertebrados marinhos e crustáceos de piscinas vernais, conjuntos temporários de águas formados em determinadas épocas do ano, que servem de hábitat para plantas e animais. “Em menos de um século, a urbanização e a conversão agrícola destruíram 90% desses habitats”, disse.

Pesquisadores do laboratório de Grosberg iniciaram estudos genéticos para caracterizar os efeitos do hábitat na diversidade de espécies endêmicas – que ocorrem em apenas um ecossistema – de camarão girino. De acordo com o pesquisador, várias dessas espécies são agora protegidas pelo governo dos Estados Unidos em razão dos trabalhos do laboratório.

O objetivo agora é expandir o projeto para outras espécies simpátricas – variações genéticas de populações que habitam a mesma região geográfica, tornando-se espécies diferentes. “Também estamos examinando os efeitos das mudanças climáticas, da pesca excessiva, da poluição e da fragmentação de hábitat sobre a resiliência dos recifes de coral”, disse Grosberg.

Luciano Martins Verdade, professor do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo (Cena-USP) e membro da coordenação do Programa BIOTA-FAPESP, falou sobre a importância do monitoramento da biocomplexidade em todos os ecossistemas.

“Seja no meio aquático ou terrestre, precisamos de mecanismos de monitoramento que nos permitam tomar decisões de intervenção humana para corrigir problemas gerados por pressões – como, por exemplo, de pesca excessiva ou uso de produtos agroquímicos – que contaminam o meio, mas são necessários à atividade agrícola”, considerou.

Verdade destacou em sua palestra a necessidade de o processo produtivo levar em consideração a conservação da biodiversidade.

“Hoje, mais do que nunca, a paisagem em que a pesca ou a agricultura são feitas é a mesma ocupada pela diversidade biológica. O que se pretende é uma paisagem que seja de fato multifuncional, que tenha a missão de produção de espécies domesticadas, mas comporte também uma missão de conservação da diversidade biológica”, disse.

Correntes marítimas

Outro fator diretamente ligado à vida nos oceanos e fora deles, as correntes marítimas, foi abordado na FAPESP Week California por Edmo José Dias Campos, professor do Instituto Oceanográfico da USP.

Campos apresentou as atividades de pesquisa conduzidas no âmbito do Projeto Temático Impacto do Atlântico Sul na célula de circulação meridional e no clima, realizado com apoio da FAPESP e que integra o projeto internacional South Atlantic Meridional Overtuning Circulation (Samoc).

“Estamos atuando para entender o comportamento das regiões profundas do oceano em uma área onde não há observações anteriores”, destacou Campos. Segundo ele, as observações mais recentes surpreenderam pela intensidade das correntes do Atlântico Sul.

“Já temos um conjunto de correntes medidas a quatro mil metros de profundidade que estão mostrando variações de amplitude muito maiores do que o esperado. Também verificamos que a componente leste-oeste dessa corrente tem uma variabilidade muito grande, como se houvesse uma espécie de meandramento ou oscilação lateral, com amplitudes muito grandes. Precisamos revisitar os dados e analisá-los, mas tudo indica que se trata de um fenômeno inédito”, disse.

O conhecimento sobre o comportamento das correntes pode ajudar na compreensão das mudanças climáticas. “Se conseguirmos manter esse sistema de observação ao longo do tempo, vamos poder dizer se há alterações de mais longo período e considerar suas relações com o clima”, disse Campos.

Os trabalhos são realizados com o navio de pesquisa oceanográfica Alpha-Crucis, adquirido pela FAPESP no âmbito do projeto Incremento da capacidade de pesquisa em oceanografia no estado de São Paulo.


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