Brasil chega a Lima na contramão
dos esforços globais contra mudanças do clima.
por Bruno
Toledo, do Observatório do Clima
Fotos: Bruno Toledo/OC
Com emissões em alta, mesmo com baixo crescimento
econômico, Brasil começa a COP20 numa posição mais frágil que em outras
conferências do clima.
A capital do Peru será a capital global dos
esforços contra as mudança do clima pelas próximas duas semanas. Começou nesta
segunda a 20ª Conferência das Partes (COP 20) da Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança do Clima, em espaço montado no quartel general do Exército
peruano em Lima. Pelos próximos 14 dias, negociadores de mais de 190 países se
reunirão com a dura missão de desatar os nós que impedem o enfrentamento global
efetivo das mudanças climáticas.
O principal objetivo da COP 20, sem dúvidas, será
avançar na estrutura do futuro acordo climático internacional que sucederá o
Protocolo de Quioto a partir de 2021, mas que precisa ter seu texto finalizado
e aprovado pelos governos até a próxima Conferência do Clima, que acontece
daqui a 12 meses em Paris.
O cenário em Lima é favorável para esse avanço. Os
dois maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta, a China e os
Estados Unidos, apresentaram compromissos importantes rumo a uma redução
substancial de suas emissões nas próximas décadas. Mesmo que esses anúncios não
sejam tão ambiciosos como o necessário, eles são sinais importantes da
disposição desses países para enfrentar o desafio climático.
Outro motivo para otimismo é o avanço na
capitalização do Fundo Climático Verde (GFC, sigla em inglês), que conseguiu
angariar US$ 9,7 bilhões, graças às doações recentes de países como Espanha,
Estados Unidos e Reino Unido. O valor praticamente bate a meta prevista pela
UNFCCC para o final de 2014, e esses recursos serão importantes para financiar
ações urgentes em adaptação e mitigação das mudanças do clima em países em
desenvolvimento.
Por fim, o ímpeto dado pela Cúpula do Clima,
realizada em setembro passado em Nova York, criou um movimento importante para
a sociedade civil internacional pressionar os governos por ações climáticas
mais ambiciosas e efetivas. Mesmo que os resultados concretos da Cúpula tenham
sido mais simbólicos que práticos, o encontro de chefes de governo em Nova York
ajudou a colocar o tema climático novamente na agenda mainstream da política
internacional e incentivou a mobilização de milhões de pessoas pelo mundo.
Se o contexto global é favorável para avanços
práticos, o contexto brasileiro não poderia ser tão contrastante. Como o Observatório
do Clima apontou, a partir dos dados do Sistema de Estimativa de Emissões de
Gases do Efeito Estufa (SEEG), as emissões brasileiras aumentaram 7,8% em 2013,
mesmo com o baixo crescimento apresentado pelo país no ano passado (2,6%).
Entre 2012 e 2013, a Amazônia sofreu com o aumento
da taxa de desmatamento em 29%, que interrompeu uma sequência de quase uma
década de reduções significativas. No ano passado, as emissões associadas ao
desmatamento subiram 16%, de acordo com o Sistema de Estimativas de Emissões de
Gases do Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima. Mesmo com o anúncio
recente dos dados do PRODES, que apontam para uma redução de 18% na taxa entre
2013 e 2014, informações do DETER e do Imazon já apontam para uma retomada
acelerada do desmatamento nos últimos meses, o que pode colocar em risco a
pequena recuperação apontada pelo PRODES.
Além disso, quase 70% dos investimentos federais em
energia nos próximos anos estão direcionados para fontes fósseis em energia,
que vão inevitavelmente sujar nossa matriz energética.
Exemplo recente do retrocesso
disso foi o leilão de energia realizado na semana passada, que ressuscitou o
carvão mineral, incluindo na base da matriz energética.
Esse contexto doméstico fragiliza a posição
brasileira nas negociações climáticas, com reflexos imediatos no processo
diplomático atual. Por exemplo, o governo brasileiro cogita encaminhar suas
contribuições nacionalmente definidas, base para a conclusão dos futuros
compromissos do Brasil no novo acordo climático, apenas no final do primeiro
semestre de 2015, meses depois do deadline original recomendado por decisão da
COP 19, realizada em Varsóvia no ano passado. Ou seja, o Brasil está abrindo
mão da sua condição de liderança política em clima, esperando para ver o que
outros países farão para depois definir o que podemos fazer.
Enquanto o Brasil retrocede, as mudanças do clima
já fazem parte da realidade dos brasileiros, impondo custos altíssimos para o
país, devido ao clima extremo – particularmente nos últimos meses, com a
estiagem que aflige o Sudeste e a seca que atinge todo o semiárido do Nordeste
há alguns anos.
O Observatório do Clima espera que o Brasil assuma
uma posição condizente com aquilo que já apresentou em conferências passadas,
alinhada com aquilo que se espera do país nesse momento importantíssimo das
negociações climáticas. Somos um dos maiores emissores do planeta e temos
condição para avançar efetivamente em esforços mais substanciais de redução de
nossas emissões – por exemplo, reduzindo o desmatamento amazônico para zero,
ampliando os investimentos para agricultura de baixo carbono e revertendo a
queda da participação de fontes renováveis em nossa matriz energética, através
de investimentos maciços em renováveis modernas. Se colocarmos o avanço em
nossos esforços climáticos como estratégico para o Brasil, isso será positivo
para a competitividade de nossa indústria e para a geração de novos empregos em
setores importantes como energia solar, hoje estratégicos para países como
China e Estados Unidos.
Fonte: Observatório do Clima
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