A aids rouba os adolescentes na
África.
por Sam
Olukoya, da IPS
Na medida em que a aids se torna a principal causa
de morte entre adolescentes na África, é fundamental empoderar os jovens,
especialmente as meninas, para que possam ter opções que lhes salvem a vida.
Foto: Mercedes Sayagues.
Lagos, Nigéria, 2/12/2014 – Quando Shola tinha 13
anos, há dois, foi colocado para fora de sua casa em Abeokuta, sudoeste da
Nigéria, depois que sua família ficou sabendo que seu exame de HIV dera
positivo. Então vivia com seu pai, a mulher dele e seus sete filhos. “A
madrasta insistiu que Shola (nome fictício) tinha que ir embora porque poderia
infectar as outras crianças”, contou à IPS Tayo Akinpelu, diretor da Iniciativa
Salvadores do Futuro para a Juventude.
Akinpelu recorreu à mãe de Shola, que se casara
novamente. Mas esta se negou a ajudar, argumentando que o pai deveria se
responsabilizar pelo filho. “Shola se sentiu um pária”, contou. No final, seus
avós o receberam. O HIV, vírus causador da aids, destrói as famílias na Nigéria
e, em geral, na África, onde essa doença se tornou a principal causa de morte
entre os adolescentes.
“É totalmente inaceitável”, lamentou Craig McClure,
chefe do programa de HIV do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em
Nova York. “E mais, as mortes vinculadas à aids diminuem em todos as faixas
etárias, menos na adolescência”, advertiu. As mortes relacionadas com a doença
caíram 30% entre 2005 e 2012, mas aumentaram 50% entre os adolescentes, segundo
informe do Unicef.
Uma das razões da grande quantidade de mortes,
segundo Arjan de Wagt, chefe de HIV/aids do Unicef na cidade nigeriana de
Abuja, é que poucos adolescentes recebem tratamento com antirretrovirais. Dos
3,1 milhões de portadores de HIV na Nigéria, metade tem menos de 24 anos, mas
apenas dois em cada dez dos maiores de 15 anos e uma em cada dez com menos de
15 anos recebiam medicamentos em 2013, apontou à IPS.
A exclusão da família e da sociedade, como ocorreu
a Shola, ou o medo da rejeição faz com que esses jovens não recebam a ajuda
necessária. “Muitos adolescentes com HIV morrem em silêncio porque têm muita
vergonha para se apresentar e receber o tratamento”, contou à IPS a psicóloga
de adolescentes residente em Lagos, Blessing Uju. “A vergonha é ainda maior
entre as meninas. Na Nigéria, se a mulher é portadora do HIV, parece que é uma
trabalhadora sexual”, explicou.
Sally (nome fictício) não contou aos pais nem
irmãos que o exame de aids tinha dado positivo há quatro anos, quando tinha 19.
“Há muito estigma em nível familiar”, afirmou. E, apesar de consciente dos
perigos de não tomar a medicação regularmente, ela costumava não consumir
alguns comprimidos para que em sua casa ninguém a visse fazendo isso. “Os
jovens precisam de uma pessoa de confiança. Se não forem suficientemente
fortes, podem acabar tirando a própria vida”, ressaltou.
Os adolescentes precisam de ajuda para continuar
tomando os antirretrovirais, destacou Akinpelu. Os avós de Shola costumavam
preparar a primeira refeição do dia pela tarde, até que Akinpelu lhes explicou
que os comprimidos podem causar náuseas se consumidos de estômago vazio e que o
jovem precisaria de comida substancial mais cedo. O cansaço com o tratamento
afeta mais os adolescentes, explicou Uju. “Alguns dizem que preferem morrer a
consumir a medicação”, pontuou.
Dos 2,1 milhões de adolescentes com HIV que havia
no mundo em 2012 mais de 80% viviam na África subsaariana, segundo o Programa
Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids (Onusida). No Malawi, com 93 mil
adolescentes portadores de HIV, perdem a vida 6.900 por causas vinculadas à
aids. A grande mortalidade tem a ver com diagnósticos demorados e com o início
do tratamento muito tarde, explicou Judith Sherman, do Unicef em Lilongwe.
A política do Malawi é que se deve oferecer o exame
de HIV a todas as crianças atendidas em centros de saúde. “Mas, infelizmente,
não acontece de forma rotineira”, lamentou Sherman. A adesão dos adolescentes
aos antirretrovirais é mais baixa do que a dos adultos, acrescentou, dizendo
que isso ocorre “por várias razões, como fadiga pelo tratamento, depressão,
medo do estigma, negação e relações familiares instáveis”.
Os 165 mil adolescentes estimados como portadores
de HIV na Tanzânia sofrem dificuldades semelhantes às de seus pares na Nigéria
e em Malawi. Allison Jenkins, diretora de HIV/aids do Unicef na Tanzânia, disse
que os clubes são uma das formas efetivas de ajudar os adolescentes. “Os clubes
de jovens melhoram a adesão ao tratamento, especialmente entre os que
frequentam assiduamente”, afirmou à IPS.
É alarmante o perfil de gênero que a prevalência do
HIV tem, pois a taxa de infecção entre as adolescentes é considerada pela
Onusida como “inaceitavelmente alta”. A prevalência da doença nas jovens de 15
a 19 anos em Moçambique é de 7%, mais que o dobro dos homens da mesma idade.
Botsuana apresenta um cenário semelhante.
Lucy Attah, da organização Mulheres e Crianças que
Vivem com HIV e Aids, com sede em Lagos, atribui a situação à pobreza. “As
meninas se veem obrigadas a trocar sexo por dinheiro para se manterem. A
pressão para conseguir fundos é maior nas cidades, onde as jovens competem
pelos melhores telefones celulares ou roupas”, acrescentou.
As adolescentes se iniciam na atividade sexual, nas
drogas e no álcool, sentem-se invulneráveis E experimentam a pressão social e
econômica para se tornarem adultas. O HIV e a falta de serviços de saúde
especiais para jovens são as chaves do problema, diz o informe do Unicef.
“Temos que fazer mais e bem, nos concentrarmos na África subsaariana e nas
adolescentes, que é onde está a maior carga” da enfermidade, destacou McClure.
Curtas
Adolescentes com HIV na Tanzânia
É alarmante que a prevalência do HIV entre os
adolescentes de 15 a 19 anos da Tanzânia não tenha diminuído entre 2007 e 2012.
Cerca de 165 mil adolescentes são portadores do
vírus da aids, entre eles 97 mil meninas e 68 mil meninos. Alguns nasceram com
o HIV e outros o contraíram quando crianças ou na adolescência.
Para compreender melhor suas necessidades, a
Comissão da Tanzânia para a aids realizou um estudo entre adolescentes de 15 a
19 anos em sete regiões.
Algumas conclusões
– Quatro em cada dez eram sexualmente ativos, a
maioria com parceiro(a) regular.
– Pouco mais da metade declarou ter utilizado
camisinha em sua última relação sexual.
– Um terço afirmou ter sofrido violência sexual.
Poucos disseram ter falado do assunto com amigos ou familiares ou, inclusive,
denunciado o fato.
– Pouco mais de um terço conhecia os serviços de
planejamento familiar ou de proteção infantil.
O estudo pediu urgência na divulgação de informação
sobre os serviços de saúde reprodutiva e sexual e de proteção infantil entre as
adolescentes com HIV, para que possam tomar decisões seguras para suas vidas e
ter acesso a atenção e apoio. A prevalência nacional do HIV é 5%, segundo a
Onusida.
Dados básicos
Mortalidade adolescente devido à aids em 2013
África do Sul: 11 mil
Tanzânia: 10 mil
Etiópia: 7.900
Quênia: 7.800
Zimbábue: 6.500
Uganda: 6.300
Malawi: 5.600
Zâmbia: 4.400
Moçambique: 3.900
Ruanda: 1.200
Lesoto: 1.200
Fonte: Envolverde
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