Sem
cooperação não há desenvolvimento.
Jomo Kwame Sundaram. Foto: FAO
Por Jomo Kwame Sundaram*
Roma, Itália, 10/8/2015 – Há um amplo consenso de
que a Agenda de Ação de Adis Abeba significou uma grande decepção para as
nações em desenvolvimento, bem como para outros atores que esperavam contar com
os meios necessários para implantar as iniciativas de desenvolvimento nacionais
e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Fica claro que o Sul, que inclui os países menos
avançados, não deve esperar nenhum avanço sério no tocante ao compromisso, que
já tem quase meio século, de destinar 0,7% do produto interno bruto (PIB) dos
países mais ricos às nações em desenvolvimento.
E o pior é que as nações em desenvolvimento
tampouco devem esperar ter uma participação significativa nos debates
intergovernamentais para melhorar as capacidades tributárias globais e
nacionais.
A capital da Etiópia recebeu, entre 13 e 15 de
julho, a Terceira Conferência Internacional sobre o Financiamento para o
Desenvolvimento, que concluiu com a Agenda de Ação de Adis Abeba.
Embora os países da Organização para a Cooperação e
o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) tenham concordado em que, para que as
nações em desenvolvimento possam evitar depender da ajuda externa de longo
prazo, a única estratégia viável é com impostos, se negaram à iniciativa de
criar um órgão intergovernamental para a cooperação internacional em matéria
tributária sob os auspícios da Organização das Nações Unidas (ONU).
A capacidade de promover políticas de
desenvolvimento depende fundamentalmente da disponibilidade de espaço fiscal,
que depende principalmente da arrecadação interna, especialmente por meio de
impostos.
Entretanto, a arrecadação tributária na maioria das
nações em desenvolvimento de rendas baixa e média é pequena, representando
cerca de 15% e 19% do PIB, respectivamente, em comparação com 30% dos Estados
mais ricos.
O saber tributário majoritário se inclina pela
ampliação da base mesmo quando as capacidades tributárias são modestas.
Assim, os impostos indiretos tenderam a aumentar,
enquanto os diretos para corporações e pessoas se inclinaram à queda.
Supunha-se que este último seria bom para os investimentos e o crescimento, mas
a sustentação empírica dessa suposição é duvidosa.
De fato, na grande maioria dos países da África
subsaariana e da América Latina a relação entre impostos e PIB paralisou ou
diminuiu, bem como as tarifas alfandegárias e os direitos de importação, que
representavam a maior parte da arrecadação fiscal, caíram com a liberalização
comercial.
Lamentavelmente, outros impostos não cresceram de
modo a compensar a diminuição dos impostos comerciais.
Existe uma necessidade urgente de reverter essa
tendência, com maior compromisso para a geração de arrecadação a fim de
melhorar a proteção social, criar empregos e contribuir para a sustentada
recuperação econômica.
Não tem sentido as nações em desenvolvimento
simplesmente tratarem de imitar as economias ricas na geração de arrecadação.
Mesmo entre elas, não há um modelo único.
E, sem dúvida, não em todo o momento, pois os
sistemas tributários devem evoluir com as circunstâncias econômicas. Uma dúvida
fundamental é: quais impostos têm maiores probabilidades de cumprirem os
requisitos de capacidade de aplicação e estabilidade?
A proporção de arrecadação fiscal em relação ao PIB
pode aumentar das seguintes maneiras: ampliando a base tributária interna,
reduzindo a evasão e a fraude fiscal, e encontrando novos tributos
internacionais.
Não há razão para ser muito pessimista com relação
aos impostos diretos, pois em muitos países as reformas fiscais melhoraram
significativamente a contribuição destes para a arrecadação fiscal.
É, por certo, possível melhorar essa arrecadação
nas nações em desenvolvimento aumentando a proporção de impostos diretos para
os setores mais ricos cobrando sobre a renda mais progressista.
Mas deve haver maior esforço para garantir maior
respeito e melhorar a arrecadação dos impostos existentes.
A queda de arrecadação decorrente da globalização é
um assunto que deve ser atendido.
Há três razões para a perda de arrecadação: primeiro,
os movimentos de capitais aumentam as possibilidades de evasão fiscal pela
limitada capacidade das autoridades em supervisionar a arrecadação no
estrangeiro, a evasão é mais fácil porque alguns governos e algumas
instituições financeiras escondem de forma sistemática informação relevante.
Quando os dividendos, juros, direitos de autor e
honorários de gestão não são taxados no país onde são pagos, é mais fácil
passarem despercebidos ali onde estão os beneficiários.
Segundo, pode aumentar a escusa (não a evasão),
dadas as diferenças internacionais em matéria tributária pela escolha de regime
impositivo que o tratamento fiscal internacional da renda as empresas costuma
oferecer.
A transferência do preço de bens, serviços e
recursos entre as subsidiárias das companhias oferece oportunidades para
deslocar a arrecadação, a fim de minimizar as obrigações tributárias.
Terceiro, a competição internacional pelo
investimento direto estrangeiro levou os governos a reduzirem impostos e
aumentarem concessões. Assim, as taxações que podem impor estão limitadas pela
competição internacional.
Isso faz com que os governos sejam reticentes em
elevar os impostos, ou os benefícios impositivos e a arrecadação por juros,
temendo a fuga de capitais, embora seja sabido que as concessões impositivas
têm pouco efeito no desvio de investimentos internacionais, quanto menos
atraindo fluxos de capital. Por essa razão, as concessões são uma perda de
arrecadação desnecessária.
Os ministros de Finanças e as autoridades fiscais
das nações em desenvolvimento devem cooperar entre si e com suas contrapartes
nas economias da OCDE para aprenderem uns com os outros e fechar a lacunas
existentes pelo bem comum.
E, devido à enorme e crescente dívida pública que
acumulam os países, bem como às condições fiscais reais e imaginárias que
existem para uma sustentada recuperação da economia global, a cooperação é mais
urgente do que nunca.
* Jomo Kwame Sundaram é coordenador de
desenvolvimento econômico e social da Organização das Nações Unidas para a Alimentação
e a Agricultura (FAO).
Fonte: ENVOLVERDE
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